Eduardo Siqueira (eduardosiqueira@opovo.com.br)

Quem nunca foi à Ponte Metálica aos sábados para curtir o pôr-do-sol com uma turma de amigos inseparáveis ao som de Legião Urbana acústico? Quase 20 anos após a morte do vocalista da banda, Renato Russo, o ritual ainda existe e as canções que embalaram o rock dos anos de 1980 continuam marcando a história de muitas pessoas. A gente ainda se pergunta: como um pensador como o Renato consegue até hoje manter uma grande legião de fãs?

O filme Somos Tão Jovens, bastante esperado pelo público e que está em cartaz no circuito nacional desde o começo de maio, pode até decepcionar ao não responder a pergunta feita no parágrafo anterior. O diretor Antônio Carlos da Fontoura até que poderia contar como Renato Manfredini Júnior conseguiu chegar ao patamar de estrela maior do rock nacional, mas preferiu puxar para primeiro plano como nasceram os grandes sucessos do Legião Urbana.

Um dos pontos marcantes da cinebiografia é relação ora de amizade ora de ódio entre Renato (Thiago Mendonça) e Aninha (Laila Zaid). Podendo este fato ser configurado como o que dá o tom do filme, o que nos dá protagonistas e um enredo, e também o que proporciona uma das cenas mais emocionantes.

O longa começa quando o futuro músico é acamado por conta de uma doença degenerativa. A partir daí, inicia o surgimento de um poeta. Seguindo uma linearidade cronológica, sem flashbacks ou rodeios, Renato, após a sua recuperação, imerge no movimento punk dos anos 1970 em Brasília, o reduto da política, em plena Ditadura Militar. Nessa fase, que acontece antes e durante a formação da banda Aborto Elétrico, vemos um artista indignado com a politica do país, com os próprios pais, com o “sistema”. É durante esse momento de consternação que o público conhece como foi o processo de composição de grandes sucessos como Que País é Este?, Música Urbana e Geração Coca-Cola, que às vezes se dava em companhia dos amigos ou Renato apenas as criava e depois reproduzia.

Após o Aborto ser “abortado”, com o diz Renato em uma das cenas, o músico então imerge na busca de si e se intitula como “O Trovador Solitário”. Durante esse período holístico nasceram os hits Eduardo e Mônica – criado em homenagem a um casal de amigos – e Faroeste Caboclo, que surge após uma visita de Renato à Taguatinga, uma das cidades-personagem da canção.

Do “Trovador Solitário” para o “Legião” foi um pulo. Nesse intervalo, o rock brasiliense é apresentado de maneira bem pontual. Dinho Ouro Preto aparece tomando as rédeas do Capital Inicial em seus momentos de berço. Além de Dinho, quem dá as caras é Herbert Vianna, do Paralamas do Sucesso, que junto com seu irmão Hermano Vianna dá total suporte à carreira de Renato.  Os jovens de hoje ou até mesmo os não tão jovens não conhecem o Herbert dos anos 70, mas é perceptível o quão caricato ficou a interpretação do jovem Edu Moraes.

Depois desse pulo, eis que a cinebiografia de Renato Russo é finalizada. Em pouco mais de uma hora e meia de filme, Somos Tao Jovens passou por uma fase bastante movimentada na vida de Renato Russo, que vai desde a sua descoberta como músico até o fechamento de um contrato de show no Circo Voador, no Rio de Janeiro.

Thiago Mendonça até que não faz feio. Embora a sua voz não tenha ficado tão parecida com a de Renato – e isso é bastante claro quando Tempo Perdido é tocada logo no início do filme -, o ator conseguiu reproduzir fielmente traços característicos do cantor, como os gestos com as mãos quando canta, a mania de ficar ajeitando os óculos e até o jeito romanceado de falar.

Somos Tão Jovens é um filme bonito de se ver, emocionante, que faz você cantar desde o início – com Tempo Perdido – até o final – com Será. O longa não conta desde o nascimento do até a alavancada na carreira, como Breno Silveira fez com a dupla sertaneja Zezé Di Camargo e Luciano em Dois Filhos de Francisco, ou a complicada relação familiar também apresentada por Breno em Gonzaga – De Pai Para Filho, apenas relata de maneira bem rápida a formação de um músico e a criação de seu sucessos. Portanto, não vá ao cinema procurando saber mais do que já sabe, contente-se apenas em cantar junto com os outros que estiveram com você na sala – e isso é inevitável!

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

View All Articles