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“Aí está uma voz dona das próprias ideias musicais, com pensamento musical todo seu e concepção bem definida. A impressão que deixa, ao final de uma primeira audição, é de que ela sabe exatamente o que quer fazer – e faz”. Com essas palavras, Joyce Moreno chancela o segundo disco da também compositora e cantora Lili Araújo. Carioca com experiência testada em festivais europeus, Lili está apresentando seu segundo trabalho, intitulado Casa Aberta (Delira Música). Trabalho maquinado a partir do melhor do bossa jazz (estilo luxuoso que hoje pertence ao mundo), Casa aberta chega cinco anos depois de Arribação, estreia feita a convite da gravadora austríaca Oficina Records. O disco apresenta os tons comedidamente agudos de Lili Araújo dedicado a 11 faixas que se dividem em composições próprias, inéditas de uma nova geração e uma pitada dos grandes mestres. Desse último grupo, ela resgata Não tem perdão, samba raro de Ivan Lins e Ronaldo Monteiro de Souza (daqueles que serviam para driblar a ditadura) lançado em 1973 por Leny Andrade no sensacional Alvoroço. Outra pérola perdida é Não tem nada não, de João Donato, Eumir Deodato e Marcos Valle, lançada por este último no disco Previsão do tempo (1973). Com seu balanço e suingue bem particulares, João Donato chega na faixa junto com seu piano mágico. Uma prova de que Casa Aberta é trabalho feito de muito boas intenções, pensado e cuidadosamente produzido (por Lili e Ana Crys Tavares) é que essas regravações descem igualmente suaves pelos ouvidos. Apesar da presença de cinco arranjadores (Lili entre eles), o disco é todo bem montado, digno de figurar entre os melhores do ano na categoria MPB. Como compositora, Lili Araújo ainda está na fase do “amor romântico”, mas faz isso com refino e cara própria. Seja sedutora, como em Vai saber ou em Casa aberta, ou mais dramática, como nas intimistas Pra se lembrar de mim e Sinceridade (com Alegre Corrêa), ela dá conta do recado com muita beleza no canto e nas palavras. Também da própria lavra, o samba Pode ir fecha o disco com alegria. O mesmo ela faz na abertura, com a sensacional Negro coração, de Alegre Corrêa e Raul Boeira, que versa com maestria sobre o balanço africano do samba da Bahia. Abrir e fechar sua casa com ginga, molejo e felicidade, mostra o quanto Lili Araújo fica satisfeita em receber seus ouvintes. Pois fique a vontade, para entrar, sentar e ouvir este belo trabalho. A casa é sua.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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