michael-jacksonCarlos Drummond de Andrade certa vez disse que somente Vinicius de Moraes viveu como poeta. Parafraseando o autor mineiro, pode se dizer que somente Michael Jackson viveu como popstar. Como se passasse as 24 horas do dia com uma câmera apontada para si, o “rei do pop” (título auto imposto e divulgado com uma milionária campanha publicitária) transformou sua vida e sua morte num imenso espetáculo. Cada aparição, disco ou escândalo era seguido por uma corte midiática que ele fazia questão de alimentar. Vivendo entre o sonho e a realidade, seu show não se resumia aos palcos.

Passados quase cinco anos de sua morte, em 25 de junho de 2009, muitos tentaram ocupar o posto de Michael Jackson na música pop, mas não conseguiram. A curiosidade em torno de todos os detalhes da vida do autor de Thriller é tanta que a Forbes o apontou como a personalidade falecida mais lucrativa de 2013. Nada menos que US$ 160 milhões em produtos envolvendo seu nome somente no ano passado. É provável que esse posto permaneça em 2014, quando chega às lojas o disco Xscape, segunda compilação de sobras de Michael.

O primeiro disco póstumo de Jackson foi lançado com pouco mais de um ano de sua morte. Finalizado às pressas, Michael foi um fracasso de vendas e gerou mais uma polêmica, dessa vez sobre se seria mesmo a sua voz naquelas 10 faixas. Xscape foge dos problemas e traz de volta o melhor do compositor em diversas épocas. Com apenas oito faixas na versão simples, o disco teve produção executiva do premiado L.A. Reid (Justin Bieber, Rihanna, OutKast) e contribuições de gente como Timbaland e Rodney Jerkins.

Uma das faixas de Xscape é a funkeada Slave to the rhythm, que ganhou destaque por conta da apresentação no Billboard Music Awards, realizado no último domingo (18) em Las Vegas. O responsável pela performance foi o próprio Michael Jackson, que surgiu no palco através de um holograma. De cabelos longos e jaqueta dourada, a imagem do artista se misturou aos outros bailarinos para realizar a coreografia, que incluiu o inesquecível moowalk. Como em tantas outras vezes, Michael foi aplaudido de pé.

Um dos artistas sempre apontado como sucessor de Michael Jackson, Justin Timberlake participa em Love never felt so good, parceria com Paul Anka composta pouco depois do lançamento do disco Thriller. Com sabor de Embalos de sábado à noite, a faixa seduz o ouvinte de cara. O clima retrô dos violinos e vocais relembram os melhores momentos dançantes de Michael, como em Rock with you e Baby be mine. O mesmo acontece em Loving you, balada cheia de suingue que lembra Marvin Gaye.

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Eterna pedra no sapato de Michael Jackson, as denúncias de pedofilia também entram em Xscape. Sobra do disco History (1995), em Do you know where your children are?, ele fala sobre uma garota abusada na infância que se prostitui nas ruas de Los Angeles. “Você sabe onde estão suas crianças agora?”, pergunta o artista em uma das melhores performances vocais do disco, cheia de agressividade e urgência. Outra curiosidade é A place with no name, versão bem particular de A horse with no name, sucesso da banda britânica America.

Um dos principais acertos de Xscape está na edição deluxe, que traz as versões originais das oito faixas. Sem o molho dos produtores, é possível conhecer de perto o pensamento musical de Jackson, que tinha por hábito se debruçar durante horas sobre cada faixa. Infelizmente, foi justamente esse perfeccionismo que fez sua carreira discográfica ser tão errática. Depois do estouro de Thriller, a grande missão do astro passou a ser superar o próprio sucesso. Além de nunca ter conseguido (e nem chegado perto), seus discos foram ficando cada vez mais fracos, com pontuais acertos aqui e acolá. A reabertura do seu baú de inéditas deixa claro que, apesar dos tropeços, Michael nunca perdeu a boa veia de compositor que sempre estava à frente do seu tempo.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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