Vanessa da Mata_1_Marcos Hermes_baixaDois anos depois de lançar Bicicletas, bolos e outras alegrias (2010), Vanessa da Mata começou a desenhar um novo disco e compor as primeiras ideias de música. O projeto teve que ser interrompido por conta do convite da Nívea para realizar alguns poucos shows cantando Tom Jobim (1927 – 1994). A homenagem tornou-se maior que o esperado e rendeu mais shows e um disco de estúdio, onde a cantora dava um banho pop e indie para joias da bossa nova, como Caminhos cruzados e Chovendo na roseira.

Encerrada a temporada no final de 2013, ela voltou aos rabiscos que vinha traçando e prosseguiu com o projeto de inéditas que tinha na cabeça. Inicialmente, Vanessa desconfiou da qualidade do material, mas foi convencida por Alexandre Kassin e Liminha, produtores que a acompanham desde a estreia, de que as novas composições estavam boas o suficiente para serem lançadas. Compôs mais algumas e estava pronto Segue o som, sétimo disco da mato-grossense lançado pela Sony Music.

Revelada no início na década passada junto com uma leva de cantoras de voz grave, Vanessa da Mata chamou a atenção pelo oposto. A voz aguda e a feminilidade latente tornaram-se marcas registradas que iam na contramão das suas colegas de geração. Esse toque feminino também é ressaltado em sua beleza arrepiante, reforçada pelos figurinos e penteado sempre crespo. Já a voz virou um tema em debate por conta das derrapagens que ficam evidentes nos shows.

Em Segue o som, a beleza da cantora está estampada no sorriso vermelho da capa, que, curiosamente, entra em conflito com as situações colocadas no disco. Violência, medo, injustiça e o distanciamento entra as pessoas são os assuntos abordados por Vanessa da Mata. Vale ressaltar que em alguns momentos a contundência parece se perder no meio do caminho. O reggae Toda humanidade veio de uma mulher, por exemplo, sugere uma bandeira feminista, mas encerra sem dizer muita coisa.

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Sem medo de parecer ingênuo, esse discurso politizado tenta ficar mais objetivo em faixas como Ninguém é igual a ninguém. “O mundo capital, o marketing da aparência superficial, a contramão do amor puro, o fast-fode o jato do alívio”, enumera a cantora como possíveis causas da falta de amor verdadeiro. Com toques de Bob Marley, o reggae Homem invisível no mundo invisível é ainda mais amarga. “Vejo o mundo inteiro numa espécie tosca de carrossel. Cada lugar um bicho, corrida maluca pra pagar o aluguel”, avalia.

As dificuldades da vida também servem de base para o sambajazz Rebola nêga, que tem um quê de Elza Soares. A faixa foi inspirada na manicure de Vanessa que tentou, sem sucesso, fazer uma cirurgia num hospital público para evitar filhos, já que sua renda dava, no máximo, para cuidar do primogênito. Até mesmo o amor, estampado em faixas como Não sei dizer adeus ou Desejos e medos, aparece sob tons soturnos e melancólicos. As exceções ficam para a releitura de Sunshine on my shoulders e Por onde ando tenho você, bem mais esperançosas.

Pela sonoridade, Segue o som parece ser feito de sobras de Sim (2007), ponto alto da carreira de Vanessa da Mata que lhe trouxe uma reaproximação com o reggae. Os altos e baixos do novo repertório acabam sendo salvos pelo esmero pop dos produtores e pela atuação de músicos como Marcelo Jeneci, Lincoln Olivetti e Fernando Catatau. Com eles, o disco ganha momentos gostosos, como Homem preto, feita em homenagem ao avô da artista. Sua primeira composição em inglês, My grandmother told me, também é sedutora com seu clima de The Platters. E assim segue com seu som, sua voz e sua beleza estonteante.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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