Se é verdade que a própria Yoko ajudou a alimentar o ódio dos órfãos do FabFour, também é verdade que ela não precisava do sobrenome Lennon para se firmar no mundo da arte. Filha de uma muito bem sucedida família japonesa, ela frequentou as melhores escolas do seu país, onde recebeu aulas de piano clássico e canto. Nas artes plásticas, é adepta das performances vanguardistas desde que veio morar em Nova York, no início da década de 1950. Amiga do compositor John Cage (1912 – 1992), que a levou a se aproximar do grupo Fluxos, ela bebeu nas melhores fontes da arte experimental.
Gravado em 2013 no lendário Eletric Lady Studio – criado por Jimi Hendrix e por onde passaram nomes como Patti Smith, Stevie Wonder e Paul McCartney –, o álbum traz 13 composições solitárias de Yoko Ono que passeiam por experiências eletrônicas, sons indies e baladas acústicas feitas ao piano. Mais uma vez, o acompanhamento coube à Plastic Ono Band, reformulada em 2009 por sugestão de Sean Lennon, filho de Yoko e John, e co-produtor do disco (junto com a mãe e Yuka Honda). A banda foi criada no fim da década de 1960 para acompanhar o casal Lennon no palco e já contou com gente ilustre como Eric Clapton, Billy Preston e Klaus Voorman. Hoje ela é formada por jovens músicos japoneses e traz no currículo colaborações com artistas como Paul Simon e Lady Gaga.
E, na verdade, o melhor de Take me to land of hell está na sonoridade costurada pela Plastic Ono Band. A faixa de abertura, por exemplo, começa com cantos de pássaros até partir para uma viagem esquizofrênica feita de batidas pesadas e loops. O funk suingado 7th floor tem clima anos 1980 com seus teclados vintage. Já Leaving Tim, com seu ar de comédia cinematográfica, só não parece deslocada por se tratar de um disco da Yoko Ono. Logo em sequência, ela passa para Shine, shine, um contagiante festival de improvisos, riffs e loucuras. Escolhida como primeiro single e com um clipe pronto, Bad dancer tem talento pop sem perder a estranheza. Já na faixa-título, Yoko parece encarnar uma bruxa diante do seu caldeirão enquanto entoa um canto de amor eterno. O piano martelado por Sean Lennon só aumenta o clima sinistro.
Tivesse sido feito por um artista jovem diante do seu computador, em qualquer país que pouca gente sabe onde fica, Take to land of hell seria celebrado como uma obra moderna e criativa. Logo, é preciso se despir de alguns preconceitos para entrar neste 15° álbum solo de Yoko Ono. Também é preciso estar disposto a encarar a criação pouco convencional de uma mulher que nunca pretendeu ser uma unanimidade. Ela só quer seguir sua vida criando coisas, independente de quem vá consumir. E já anunciou que não pensa em aposentadoria um minuto sequer.