Leo Jaime - siteOlhando de longe, o rock nacional dos anos 1980 pode ser dividido entre os artistas que tinham “atitude” e aqueles que queriam aproveitar o momento para surfar na onda da moda. No primeiro grupo, estavam as bandas ditas sérias, com instrumentistas competentes e letristas inspirados, sempre prontos para botar em melodias suas análises políticas e seus sentimentos juvenis. No segundo grupo estavam as bandas engraçadinhas, que emplacavam um ou dois hits e, apesar da boa vontade, não tinham estofo para manter uma carreira sólida por muito tempo.

Bem no meio dessas duas turmas, nasceu um ídolo improvável que ganhou as rádios com bom humor afiado e inteligência acima da média. Seu nome é Leonardo Jaime, mais conhecido pelo apelido de Leo. Garotão descolado e com cara de boa praça, o goiano era desses coadjuvantes que entrou para história por estar no lugar certo nas horas certas. Para citar um exemplo, foi ele o responsável pela entrada de Cazuza no Barão Vermelho, depois que recusou o convite por achar o som do quarteto muito sério. Outro exemplo, foi quando integrou o João Penca e Seus Miquinhos Amestrados, espécie de bandeirantes da cena roqueira nacional dos Anos 80 que chegou a dividir com Eduardo Dusek o clássico Cantando no banheiro (1983).

Este ano, quando completa 55 anos, Leo Jaime ganha uma homenagem à altura do seu papel na história da música e pode ter, enfim, o reconhecimento pelos seus bons préstimos à música nacional. Programado para chegar às lojas na primeira quinzena de maio, via Sony Music, o box Nada mudou reúne os cinco álbuns que Leo Jaime lançou entre 1983 e 1989. Em resumo, seu período mais fértil musicalmente, quando mantinha a pretensão de sex symbol hétero de uma geração.

Nada mudou começa com Phodas C, disco de transição entre a carreira solo e período anterior, ao lado do João Penca. Mesmo fora do grupo há cerca de um ano, Leo herdou parcerias com Leandro Verdeal, como a ótima baladinha melosa É, eu sei. Tem ainda uma alfinetada na Ditadura Militar, que ainda se equilibrava no poder, em Vota pra mim (“Eu vou dar para um oficial o direito de escolher com quem eu quero ou devo namorar”), e um alerta ao seu modo na “última moda que chegou de Nova York”, a AIDS.

Em seguida, espécie de clássico do goiano, Sessão da tarde (1985) é quase uma coletânea de hits com O pobre, A vida não presta e As sete vampiras. Outra espetada no governo veio com a genial Solange, paródia de So lonely (The Police) dedicada a Solange Hernandes, uma das tesouras mais afiadas da censura oficial. E para completar, um retorno aos tempos de rockabilly e grupos vocais dos anos 50 com . Excelente.

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Depois do sucesso comercial de Sessão da tarde, as coisas foram ficando mais difíceis para Leo Jaime, que queria manter o bom humor numa época em que a seriedade do rock brasiliense começava a querer ditar regras. Ainda assim, Vida difícil (1986) conseguiu emplacar Nada mudou e Mensagem de amor. Tem ainda o sentimento latente em Amor e a sacanagem absoluta em Cobra venenosa. Depois foi a vez de Direto do meu coração pro seu (1988), puxado pela versão sensualizada de Gatinha manhosa (Roberto/ Erasmo) e pelo estouro de Conquistador barato, trilha perfeita da novela Bambolê.

Uma joia esquecida de Direto do meu coração pro seu é Adoro, balada cínica no melhor estilo Leo Jaime que acabou entrando para a trilha de Bebê a bordo. No folhetim, o cantor fazia o papel do cômico Zezinho, um dos possíveis pais do tal bebê. Para fechar o pacote comemorativo, Avenida das desilusões (1989) veio na cola de outra trilha de novela, Bobagem, tema romântico de Top model. Fora essa, nem a releitura de Índios (Legião Urbana) fez o álbum decolar.

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Dos 1990 em diante, Leo Jaime ampliou seu leque de talentos e passou a se dedicar mais ao teatro e TV, mesmo mantendo algum trabalho na música. Lançando discos mais espaçados, ele, eventualmente, lembrava às novas gerações que foi um dos cantores mais carismáticos de sua geração. Ouvindo os discos do box Nada mudou, também é possível rir muito do que era possível fazer em tempos distantes do politicamente correto. Sem se levar muito a sério, Leo Jaime foi muito feliz ao fazer música para se divertir e divertir os outros.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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