PRE_ESTREIA-134Por Hertenha Glauce, atriz e diretora teatral

Quinta-feira, 19 de novembro de 2015, Cine Teatro São Luiz, em Fortaleza, Ceará. Um misto de ansiedade e de medo. Medo? Sim, medo. Já havia visto dois outros musicais dirigidos por João Fonseca: Gota D’água e Cazuza. Ambos no Rio de Janeiro. Gota D’água me arrebatou. Lindo. Vibrante. Envolvente. Cazuza, decepcionante. Pareceu-me feito às pressas, sem tempo de curtir, maturar. Problemas de dramaturgia e até erros históricos. Ou seriam “licenças poéticas”?! Bom, foi no embalo destes sentimentos que fui ao Cine Teatro.

Eu, fã inveterada de Cássia Eller e atenta a sua biografia e discografia, sentei e esperei. Começou. A banda toca, alguns atores vão cruzando o palco. Eis que surge no centro um pedestal, com um foco de luz e todo o resto do palco azul, (preciosismo do Maneco Quinderé (design de luz), que vacila muito com luzes óbvias e alguns clichês difíceis de engolir). Sigamos. Tudo preparado para entrada da Tacy/Cássia. Ela começa a cantar a capela Laterna dos Afogados (Herbert Vianna). Um susto! Cássia estava ali. Não! Infelizmente, não! Mas o que era aquilo, então? Tacy de Campos. Que grata surpresa! Arrepio. Olhos marejados. Uma necessidade de comentar: – Estás ouvindo isso?! Impressionante! Cássia devia ter dado consentimento, aprovado a garota. Um alívio. E, praticamente, o único.

O espetáculo não empolga. Não emociona e muito menos, arrebata. Deixa suspensa a emoção inicial, que não volta mais. Ralenta (fica sem ritmo) em vários momentos e muitos pontos importantes da carreira ficam en passant. Lamentável. A opção por tentar passar por todos os momentos, sacrificou alguns momentos cruciais, como por exemplo, a relação dela com o Nando Reis, que passou como um vulto. Nem deu tempo de curtir. Aí você vai me dizer: – Mas és muito exigente. Não dá para falar tudo em duas horas. É verdade! Por isso digo que querer falar de tudo, sacrificou o espetáculo.

Okay, o repertório é maravilhoso, mas a combinação banda e amplificação do elenco, nem tanto. Em muitos momentos sequer entendia-se o que era falado. Ficava sempre uma pergunta no ar: – O que foi que ele (a) disse?

Fiquei cismada: – E a dependência em cocaína foi censurada? Não entendi! Maconha pode, cocaína, não?! E a morte? Que morte? Na peça, ela não morre. Nem simbolicamente. Abro um parêntese para lembrar do Cazuza. Um dos únicos momentos, verdadeiramente, inteligentes. Fonseca transforma a máquina de datilografia, companheira de Cazuza, em caixão. Em cada ponta da mesinha da máquina, uma alça. Em cada alça, uma pessoa importante na vida de Cazuza. Brilhante! E a Cássia, não morre?

Depois de tantos pontos negativos, não sobra nenhum positivo? Sim, dois: 1. A costura com as letras das músicas que Cássia cantou, atemporalmente. Não importava quando e nem em que contexto Cássia cantou. Ali, elas ganhavam novos sentidos. Eram resignificadas. Dava sentido as cenas. Muito bom! 2. a Tacy! Ela salva! Ela “incorpora” a Cássia, não só cantando, mas falando, andando, sorrindo, gargalhando. Eu sorria ao vê-la e agradecia.

“Eu poderia ser um escritor da moda (,,,)
E não há nenhuma outra hipótese
Que eu não considere, mas
O que eu queria mesmo ser
É a Cássia Eller”

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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