Vem do final dos anos 1960 uma turma de músicos que importou para o Brasil o suingue que fazia a cabeça dos negros americanos. O que lá estava não mãos de gente como James Brown, Stevie Wonder e Curtis Mayfield, aqui passou a ser cuidado por gente como Tim Maia, Cassiano, Carlos Dafé e outros. Com o talento nacional de misturar influências e criar algo novo, a black music verde e amarela foi mudando o balanço e atraindo mais gente.

O show que a Caixa Cultural apresenta neste fim de semana faz um passeio por essa história que começa com a luta pelo fim da segregação racial. Ao longo de três noites, o projeto Somos Soul traz a Fortaleza quatro nomes dessa cena: hoje, Lady Zu e Gerson King Combo; amanhã, 25, Negra Li; e domingo, 26, Wilson Simoninha. Cada um deles tem uma história de ritmo bem marcado e balanço irresistível.

A amizade de Lady Zu e King Combo vem de algumas décadas, quando era ele era contratado da Polygram e ouvia as fitas dos aspirantes a artistas da black music. “Fui o primeiro a ouvir as fitas dela, por que o produtor Pedrinho da Luz ficou em dúvida se deveria contratá-la”, lembra o carioca de 73 anos, que logo gostou da voz da paulistana que iria fazer história com o hit A noite vai Chegar. “Pensava que era um mulherão tipo Ivete Sangalo, mas era baixinha”, brinca.

Referência obrigatória do soul nacional há mais de 40 anos, Gerson já foi o rei dos bailes, passou por um longo período de ostracismo – quando se aposentou como funcionário da prefeitura do Rio de Janeiro – e voltou aos palcos com uma forcinha dada pela atriz Regina Casé, que o convidou para participar do programa Muvuca. “O pessoal do rap diz que eu sou um precursor, um ícone. Com eles, eu peguei essa carona, me identifiquei com o contato que tive com essa turma”, comemora ele que também já fez parte dos Fevers e Renato e Seus Blue Caps.

Irmão de Getúlio Côrtes (autor de Negro Gato), Gerson aproveitou e redescoberta e hoje voltou a fazer o que mais gosta: é uma média de cinco shows por mês. Se recuperando de uma internação por diabetes, ele conta que saiu do hospital para atender ao convite de Fortaleza. “Fazer show é minha vida, quando eu chego é pra quebrar”, promete o músico, apesar de uma série de recomendações médicas.

Além da amizade com Lady Zu, outro ícone nacional que fez parte da carreira de King Combo foi Wilson Simonal. “O Gerson tem tudo a ver com minha família. Foi da banda do Simonal e representa muito bem aquela cena da Black Rio, Tony Tornado”, avalia Simoninha, que mistura no show de Fortaleza canções próprias com artistas que são referências atemporais para a música negra mundial, como Stevie Wonder e Marvin Gaye.

Para o cantor e compositor de 52 anos, a geração de músicos da qual King Combo e seu pai integrou precisa ser vista como algo que vai além da black music criada nos EUA. “É uma referência super importante, criada a partir dos anos 60, que é muito híbrido das várias representações da música negra brasileira e americana”, explica ele que até se incomoda de usar o termo em inglês. “Não é a black americana, é outra coisa. Não é a black americana, é outra coisa. Tem algo que não é o samba brasileiro nem o americano. Tem o sambarock. A gente criou uma coisa que é uma terceira via e eu sou um filho dessa mistura”.

Serviço:
Somos Soul
Quando: Lady Zu e Gerson King Combo hoje, 24, às 20h; Negra Li amanhã, 25, às 20h; Simoninha domingo, 26, às 19h
Onde: Caixa Cultural (Av. Pessoa Anta, 287 – Praia de Iracema)
Quanto: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia)
Telefone: 3453 2770

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

View All Articles