Por João Gabriel tréz (joaogabriel@opovo.com.br)

A primeira faixa de Recomeçar, disco solo de estreia de Tim Bernardes, vocalista da banda paulistana O Terno, dá o tom do novo trabalho. Instrumental, a música Abertura (Recomeçar) não apenas carrega arranjos e melodias que serão ouvidas ao longo do CD, mas dá partida à emoção da obra. Meditando sobre relacionamentos e identidade de forma pessoal, o cantor oferece ao ouvinte contato e identificação com reflexões íntimas. Esse lado confessional faz de ouvir Tim Bernardes ser como ouvir a um amigo.

Filho de Maurício Pereira (da banda Os Mulheres Negras), Tim, com 26 anos, está na música desde o berço. “Cresci nesse ambiente, entrei em aulas de música bem pequeno. Fui tocando e com uns 15 anos decidi que queria seguir profissionalmente, que queria fazer faculdade de música”, remonta. A banda O Terno, dividida com Biel Basile e Guilherme D’Almeida, foi criada em 2009. Em 8 anos, o grupo se estabeleceu na cena nacional, com três discos lançados e participações em festivais como Lollapalooza e Primavera Sound. “O primeiro disco d’O Terno saiu em 2012 e, de lá pra cá, foi meio isso: me descobrir como compositor, explorar, experimentar coisas com a banda, sozinho. Agora é esse CD solo”, resume, modesto, a trajetória.

O projeto do disco, conta Tim, não é novo. “Acontecia paralelamente na minha cabeça, desde o início. De vez em quando escrevia uma música que não fazia sentido ser de banda”, relembra. “Fui escrevendo e pensando: ‘isso é outro projeto’. Estava focado na banda, ia colocando as músicas no baú e esperando chegar a hora”. Este momento veio após o lançamento do terceiro disco do O Terno, Melhor do Que Parece, de 2016. “O trabalho abriu a cabeça da banda para novos caminhos, tenta outra sonoridade. Quando montamos o repertório dele e olhei meu repertório paralelo, vi que meu disco tava pronto. Eu ainda só não tinha tido segurança (de lançar)”, confessa. “Desde a primeira composição do Recomeçar, era um tipo de música que eu queria fazer pra mim, sem pensar se mostraria pros outros. Demorei para fazer o disco porque (nele) estou mais exposto, mesmo. Tinha tanto um lado de ‘isso é bem direto, vou me expor tanto assim?’ quanto ‘isso é muito simples, não vou estar sendo genérico?’”, divide as inseguranças.

Enquanto as músicas de Melhor do Que Parece podem soar mais esperançosas, Recomeçar parece ser mais conformado, consciente. Se em Volta, d’O Terno, Tim canta “Volta logo, volta logo, volta”, em Ela Não Vai Mais Voltar, do disco solo, o título revela o iminente fim. Seria o eu-lírico do novo trabalho uma variação madura daquele da banda? “É doido, já fiz esse tipo de interpretação na minha cabeça também, mas escrevi muitas músicas (de Recomeçar) antes. Ele tem a ver com ciclo, se encaixa narrativamente tanto antes quanto depois do eu-lírico do Melhor do Que Parece”, arrisca. “O legal de compor são as possibilidades, cada pessoa cria uma narrativa. É algo que eu deixo assim para cada um encaixar na própria vida. As músicas conseguem virar trilha sonora”.

No disco, Tim foi produtor, diretor musical, tocou a maioria dos instrumentos e ainda compôs os arranjos sinfônicos. Junto das letras confessionais, Recomeçar é marcado por piano, violão e instrumentos clássicos. “Queria que a sonoridade fosse como as letras: minimalista, mas com um tom emocional, grandioso. Como se fossem canções cruas, mas com uma orquestra intensificando os sentimentos”, explica. “Na banda a gente gosta de variar os climas. Para o (disco) solo, pensei o contrário. Escolhi todas as músicas que eram parecidas, queria que as pessoas achassem que o disco é uma música gigante, de 45 minutos. Quem entrar nele vai entrar na experiência do álbum. O ouvinte está convidado”, propõe.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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