“Chorei por ter despedaçado as flores que estão no canteiro. Os pulsos, os punhos cortados, o resto do meu corpo inteiro”. Quando lançaram, em 1989, o hit Flores, os Titãs eram oito, viviam o boom roqueiro dos anos 1980 e estavam satisfeitos lançando seguidos discos de sucesso. Décadas depois, o rock já não vive um bom momento comercial e os três membros da formação original que resistem à frente da banda paulistana se veem obrigados a buscar novos rumos para seu trabalho em grupo.

É no meio desse cenário que surgiu 12 Flores Amarelas, a primeira ópera-rock do Brasil com pretensão de atingir o mainstream – sim, outras bandas reivindicaram a primazia nesta seara, mas passaram batidas pelo grande público. Com Sérgio Britto, Tony Bellotto e Branco Mello à frente, o trabalho foi lançado em streaming, CD, DVD e, em breve, virá em LP. No palco, o trabalho estreou no semestre passado fazendo uma mistura de teatro e show com músicas inéditas feitas exclusivamente para o projeto.

“Depois do Nheengatu (2014), a gente conversou sobre o que poderia fazer e pensamos em uma ópera-rock. Não tem nenhuma banda brasileira que tivesse feito. No meio da turnê, começamos a planejar por que é um projeto que exige uma história, exige compor músicas do zero pra isso. Achamos que seria estimulante”, conta o vocalista e baixista Branco Mello, que partiu atrás de outras pessoas que pudessem somar ao projeto. Aí chegaram o escritor Marcelo Rubens Paiva, que assina o texto, Hugo Possolo e Otávio Juliano, que assinam a direção geral.

No palco, além da banda (que conta com o guitarrista Beto Lee e com o baterista Mario Fabre), três cantoras encarnam as protagonistas Maria A, Maria B e Maria C. “A Yás Werneck é carioca, veio de um rap mais melódico, com uma voz linda. A Cyntia Mendes é de Rondônia e tem uma banda de rock em São Paulo. E a Corina Sabbas é de Brasília, vem de musicais, é cantora e atriz”, elenca Branco. A seleção das cantoras-atrizes foi feita a partir da opinião de amigos e filhos dos Titãs. Em seguida, eles montaram uns testes pra ver quem melhor se adequava ao trabalho. “Elas não se conheciam e a gente não as conhecia, mas foi super legal. Elas trouxeram as ideias, opiniões, a vivência delas. Aí começamos a fazer mudanças, adaptações no roteiro a partir do que elas diziam também”, completa.

A opinião feminina foi importante no trabalho que fala sobre um trio de jovens amigas que usam um aplicativo de celular, o Facilitador, para encontrarem uma festa bacana pra ir. Durante a noite, no entanto, elas são agredidas sexualmente e passam a ter que lidar com culpa, rejeição, gravidez, desejo de vingança e outras situações. Os Titãs fizeram 25 músicas para 12 Flores Amarelas, que conta ainda com narrações feitas por Rita Lee.

Antes de virar um espetáculo completo, três faixas do 15º disco de estúdio dos Titãs foram apresentadas para o público durante o Rock In Rio 2017, curiosamente na mesma noite em que se apresentou o The Who, banda conhecida pelas lendárias óperas-rock Tommy e Quadrophenia. “Na minha memória afetiva, o Tommy foi muito marcante por que tem o disco, o filme. É uma coisa histórica, tenho um carinho. Mas o Pink Floyd (The Wall) foi mais forte pra mim. A gente estava levemente inspirado, mas acaba que a gente fez uma coisa muito diferente. A gente já estreou em cena. Antes de fazer o disco, começou o palco”, explica Branco Mello contando que, agora, a banda estuda como vai ser a turnê do novo disco. “No DVD, é um espetáculo fechado em si, foi gravado num teatro em Curitiba. Pra ele viajar, tem algumas particularidades como cenários, atores. Estamos planejando a turnê pra março ou abril”, adianta.

Uma opinião particular sobre 12 Flores Amarelas:
Existe alguma ousadia em lançar uma ópera-rock numa época de playlists e singles avulsos. Mas se provocar para o novo é algo que sempre esteve na mira dos Titãs. Para driblar a formação enxuta (difícil resistirem a mais uma despedida), eles buscaram reforços que lhe dessem segurança na empreitada. Ainda assim, o resultado parece ser mais forte como ideia do que como produto. 12 Flores Amarelas toca em assuntos relevantes, mas soam pouco impactantes. Sem o peso esporrento de Cabeça Dinossauro (ou mesmo Nheengatu), a banda poderia ter ousado mais na concepção sonora de um trabalho que é mais um capítulo na história do outrora octeto. Entre as 25 músicas inéditas do trabalho, você vai ouvir um Titãs se esforçando para soar diferente, mas sem deixar de ser os Titãs de sempre. Tanto que a maior parte do disco pode ser ouvido fora do conceito ópera sem muito prejuízo. Uma balada de violões, como Nossa Bela Vida, ou a tristeza de Eu Sou Maria fogem um pouco a essa regra e justificam o projeto que, com duas doses a mais de ousadia, colocaria a banda de volta no seu lugar de vanguardista.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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