Thiago Pethit (Foto: Gianfranco Briceño)

Thiago Pethit está saindo das “férias forçadas” que estabeleceu em 2016, após a turnê do álbum Rock’n’Roll Sugar Darling (2014), e começando a desenhar o que poderá se tornar seu próximo álbum de estúdio. Depois de três discos lançados – Berlim, Texas (2010); Estrela Decadente (2012) – o artista precisava se reconectar consigo mesmo para se inspirar novamente.

Em 2017, cumpriu agenda de shows em tributo à estadunidense Patti Smith e, neste ano, revisita a própria carreira no espetáculo Som & Imagem (que passou por Fortaleza em setembro último), pautado nas referências audiovisuais que nortearam sua carreira.

A união entre performance, estética e a ousadia de quem não se contentava com as regras do mercado brasileiro para a música independente ajudam a formar um artista que escancarou as portas da música queer, hoje repleta de representantes, de Pabllo Vittar a Liniker.

Em entrevista exclusiva ao Blog, Pethit relembra o Brasil “completamente diferente” de 2008, quando começou sua carreira musical. Ele fala sobre o País pós-junho de 2013, a interferência das reviravoltas políticas e a necessidade de se redescobrir antes de um novo mergulho na arte.

Fora da Ordem entrevista Thiago Pethit

10 anos de carreira

“Mudou tudo (nesse período). Eu digo que tenho oito anos oficialmente, embora sejam 10 contando com o EP (Em Outro Lugar, 2008). Ainda tô guardando esses dois anos pra ter um tempo e ter meu show de carreira de 10 anos. Não foi só eu que mudei. O mundo mudou, o Brasil mudou. Imagina, o Brasil de 2008 e o de 2018 são países completamente diferentes. O que se pensa, o que se entende. O que se consome de música, aonde se apresenta música. Tudo mudou. Em 2008 a gente nem ia sonhar com a existência da Pabllo Vittar, a gente tava muito longe disso. Como artista, me entendo de um jeito completamente diferente. Meus desejos foram mudando. Cada disco foi incorporando mudanças pessoais, pontos de vistas”.

Política na arte

“Não é preciso ser um artista ativista político para que isso influencie o trabalho porque a política influencia a vida de todo mundo. Meu aluguel é pago de acordo com o que tá acontecendo na política, meu cachê é pago de acordo com o que tá acontecendo na política. Eu vou fazer música de acordo com o que está acontecendo. Mesmo que eu não queira pensar sobre isso, tudo é sobre isso”.

Influência das reviravoltas políticas

“De 2013 até o impeachment, a gente ficou vivendo um looping que parecia não ter fim do que foi junho de 2013. Parecia que nada novo apareceu. Primeiro foi um “Fora Dilma” que virou “Fora Temer”, que virou uma coisa sem fim. Agora, com as eleições, a gente tá começando a enxergar um cenário que eu me coloco mais criativamente em um lugar. Começo a enxergar coisas que até então eu não conseguia porque tava muito difícil enxergar o que a gente tava vivendo”.

Eleições 2018

“Essas eleições me parecem a coisa mais absurda da história do mundo. Criativamente, chegou um momento de muita ebulição também. Sobretudo porque existem muitas adversidades pra quem é artista no momento. Adversidades são componentes fortes pra você reagir e se inspirar. Se você é um artista, mulher, negro, gay, se você não é apenas um homem braco intelectual… Se parece que os seus direitos vão desaparecer, acho que é preciso se colocar em um lugar inspirado em se defender e de conseguir existir”.

Álbum novo

“Estou começando a pensar. Em 2016 encerrei a turnê do disco (Rock’n’Roll Sugar Darling) e me dei uma espécie de pausa forçada, pra ter tempo, repensar tudo, pra me inspirar novamente pra viver minha vida um pouco, ter uma casa, enfim. Essas coisas tão básicas humanas que quando você é um artista independente essa parte da vida fica relegada a quando dá. Você tá sempre pegando um voo às 6 da manhã, você não cria laços. Tem todo esse corre que é muito pesado e que criativamente me deixou muito estafado. Em 2016, não sabia mais nem se queria continuar sendo artista”.

“Até agosto do ano passado, eu não sentia nenhuma necessidade de fazer música. Era como se eu realmente tivesse perdido o interesse. Um belo dia apareceu. Peguei o violão e começaram a aparecer um monte de canções. Eu tô começando a pensar o que são essas canções, se elas fazem parte de um disco, e pensar o que seria essa volta do Thiago em 2019”.

Da MPB ao rock

“Sinto que estou sempre buscando um lugar meu. Um lugar no mundo, no mercado, no coração do público. Um lugar que eu possa dizer: este lugar é meu! Uma coisa que sempre me incomodou muito é que no Brasil a gente tem um mercado de música independente que é muito pequeno e a não diferenciação entre artistas é um negocio que sempre me incomodou demais. Sinto que tem essa coisa dos gêneros e subgêneros. Nessa coisa de querer sempre buscar um lugar para mim, senti que era muito importante fazer o jogo dos gêneros musicais e usá-lo ao meu favor”.

Sexualidade e gênero

“E em 2014 eu vinha de uma afirmação muito grande. A gente falava muito pouco ainda de questões de gênero e sexuais. Existiam muito poucos artistas que estavam trazendo as questões sexuais, homossexuais, trans. Nem a Pabllo Vittar existia em 2014 enquanto fenômeno”.

Rock’n’Roll Sugar Darling

“Eu sempre gostei muito de estar em um lugar como se eu tivesse sempre pronto para estar atacado. Eu gosto de me colocar nessa situação porque acho corajosa. Então, se em 2014 eu queria ter essas questões de gênero e dizer: “Eu sou um bicha louca”; eu não ia falar isso para as bichas. Eu queria falar no ambiente hétero branco que se tornou o rock and roll. Era muito importante estar nesse lugar, na frente de batalha, pronto pra levar umas cacetadas. Acho muito cômodo estar num ambiente onde você só ganha aplauso. Sinto que é um lugar de pouca ousadia quando você sabe que vai ganhar aplausos, então minha coisa com o rock foi isso. E eu queria entrar nas listas de rock and roll, entre todas as bandas hétero e brancas. Me interessava naquele momento isso, me parecia mais corajoso. Mais ousado”.

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

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