Tudo o que sugere interesse das operadoras de plano de saúde e hospitais privados é mal visto pelo senso comum? Parece que sim. Quanto mais sofrido é pagar a conta, maior a resistência. Portanto, inflama mais na classe média. Isto acontece porque a relação entre clientes e empresas é mesmo um tanto doída. A necessidade de recorrer ao setor privado em serviço que se espera público gera esta rejeição. E aquilo que interessa aos profissionais de saúde comove os pacientes? Raramente.
Mas a despeito destas diferenças, há uma pauta comum a todos, da qual não se pode fugir. Operadoras, médicos e pacientes estão diante de avanços tecnológicos inexoráveis. Nenhum pode dar de ombros à tecnologia. O princípio a ser respeitado é o bom atendimento. Dele parte tudo o mais.
Contudo, o debate sobre a chamada telemedicina se sustenta em aparente distanciamento de sua razão de ser, a melhoria do atendimento de quem precisa de saúde. Leia mais aqui
A discussão se afasta dos pacientes e adentra no leito do corporativismo médico e da falta de empatia de parte das empresas do setor. Nem um e nem outro conseguiu ainda ser convincente. Os pacientes veem ambos com desconfiança.
Há cerca de um ano, o chairman de saúde da KPMG, em Londres, Mark Britnell, dizia ao O POVO onde moraram as resistências à tecnologia na saúde. Ele citou casos pelo mundo para responder.
“Em Israel, talvez 60% das consultas entre médicos e pacientes são feitas por celular. Em Singapura, eles introduziram para 45% dos pacientes carregam os seus próprios prontuários médicos nos seus celulares.
No Japão, eu vi robôs carregarem uma idosa de uma maca para outra. Eu estava com o ministro da saúde no Sri Lanka, onde uma companhia de telefonia tem contrato com um consumidor que paga para falar com médicos e enfermeiras”.
Segue: “A empresa trabalha com algoritmos voltados para a saúde, onde agora 70% de todos os contatos acontecem via telefone. O cenário que eu estou tentando desenhar é que se você não inovar, você vai morrer enquanto país.
O Brasil tem muita inovação. Mas o segundo ponto que quero falar é que em todo o mudo pessoas estão usando tecnologias digitais para melhorar a saúde por duas razões:
A OMS até o ano 2030, daqui a apenas 12 ou 13 anos, prevê que vão faltar 15 milhões de enfermeiros e médicos ao redor do mundo. Até nos países mais ricos não vão achar médicos suficientes. (…) Em segundo lugar, por causa da população envelhecendo. O Brasil ainda é um país jovem, mas vai envelhecer”.
No dizer de Britnell, a nova geração não é igual à velha. Ele costumava ir ao banco para ver o gerente. Agora fala com uma máquina de atendimento automático. “Se você quiser produtividade, se você quiser eficiência, se você quiser efetividade, você tem que mudar de canal”.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) autorizou a prática de telemedicina, mas mudou de ideia. Cedeu à pressão de conselhos regionais. Estes apontaram falta de clareza no texto e ameaça à relação médico-paciente. Tanto pode ter sido zelo, como pode ter sido simples corporativismo, o mais provável. O CFM mantém uma consulta aberta.
É saudável que haja ceticismo. Mas não quanto ao uso da tecnologia, e sim com relação à qualidade do serviço.
A relacao medico-paciente já conta hoje com severa participação da tecnologia, de forma que a distância de alguns centímetros e alguns milhares de quilômetros pode não ser determinante da qualidade dos serviços.