Vitória Maria, artesã, Alexandre Fernandes, DJ Piá, Aliny Dayani, articuladora comunitária, Matheus Oliveira, DJ Dom Gordão, Alécio Fernandes, educador. (Foto: Mateus Dantas / O POVO)

Renato Abê (renatoabe@opovo.com.br)*

Jovens das periferias da Capital se reúnem para reinventar a noção de “políticas públicas”. Mesmo sem apoio de instituições, eles vêm ampliando ações e já levaram experiência para o Rio de Janeiro

Na marra. Na poita. Na gambiarra. Na tora. “Mesmo sem recurso nenhum, a gente quis pensar um coletivo para atuar em rede com outros projetos do País. A gente faz tudo assim, quase à força, daí veio o nome: Natora”, explica Alécio Fernandes, o D’leste. Há seis meses, o educador de 23 anos vem se reunindo com outros jovens, que estão organizados a partir de duas palavras: vinculo e afeto. “Se tem essas duas coisas dentro do coletivo e com a comunidade, a gente consegue tudo”. Com 14 membros fixos e um grande número de parceiros, o coletivo realiza hoje, a partir das 18 horas, a terceira edição do Sarau Natorart, um palco aberto às diversas artes.

O evento acontece na Praça da Castanhola, situada no “Pirulito”, intercessão entre os bairros Pirambu e Carlito Pamplona. “Tinha uma demanda muito grande entre os jovens que era de ocupar os espaços. A gente viu esse espaço, que nem era uma praça ainda, estava toda acabada, com entulho em cima, e resolveu ocupar”, afirma D’leste, explicando que essa ação deu origem ao coletivo. Eles começaram a cuidar da praça, fizeram intervenção com grafite e iniciaram oficinas. “Com a revitalização da praça, a gente começou o lance de educação ambiental com as crianças daqui do Pirulito e não parou mais”, conta. E assim o coletivo começou a crescer e aparecer. Eles realizam ações como o Cine Natora, com exibições gratuitas de filmes em espaços alternativos, e o baile da Castanhola, festa com rap, trap e vários outros estilos ocupando a praça.

Tem ainda o Natora Champions League, torneio de “travinha”, que reúne crianças e jovens em torno do futebol e o Leste Limpa, com ações de limpeza na praia. Já o Sarau Natorart é o carro-chefe das ações. “Eu sabia que várias pessoas escreviam poesias no bairro e ninguém nunca lançava. A gente veio com o sarau e começou a descobrir os talentos que tem aqui”, aponta Matheus Oliveira, o poeta e rapper Don Gordão, de 18 anos.

“O que a gente faz é política pública. Tanto pra dar voz como também como uma forma de resistência muito grande”, é direta a artesã Vitória Maria, 18. Apesar do pouco tempo de atuação, ela celebra as vitórias do grupo, que acaba de voltar do Rio de Janeiro, onde foi realizado o intercâmbio Periferia e o Escambau. Eles se juntaram com os coletivos Aqui Tem Sinal de Vida, da Barra do Ceará, e Servilost, do Serviluz, e conseguiram por meio de financiamento coletivo viajar para o Sudeste. “A gente foi para para pegar experiências coma galera das comunidades do Alemão e da Rocinha”, conta.

“O Natora quer essa ligação por rede não só no Estado, mas no País. A ideia é mostrar cultura, arte e fortalecer ainda mais o movimento”, firma Alexandre Fernandes, o DJ Piá, destacando que o foco é fazer um mapeamento local de grupos com trabalho semelhante na Capital. Essa experiência no Rio vai dar origem a um documentário, que será lançado em julho.

Cultura de paz
“A gente trabalha a potência das comunidades integradas, até mesmo por conta dessa série de divisões de conflitos territoriais. Aqui é cultura de paz através do encontro. A gente está pensando a segurança pública de outra forma, não a segurança armada”, aponta Alécio. Sobre a falta de amparo de órgãos públicos, ele completa: “Se a gente tivesse um apoio maior, poderia fazer um trabalho muito melhor”, conta, dizendo que já entrou em contato com diferentes órgãos da Prefeitura e do Governo do Estado e que estão esperando respostas. Para conseguir dinheiro, o coletivo vende camisetas, copos e chaveiros personalizados.

Produtora do Natora, Aliny Dayane, 19, define o trabalho do grupo: “A nossa essência é mostrar a arte de cada um. É mostrar que a comunidade tem brilho, tem luz e que tem que se espalhar por todo o País”.

Serviço
III Sarau Natorart
Quando: hoje, das 18h às 21h30min
Onde: Praça da Castanhola (rua Cruzeiro do Sul, sem número, Carlito Pamplona)
Programação gratuita

*Renato Abê é jornalista e dramaturgo. Pós-graduado em Direção Teatral na Casa das Artes das Laranjeiras, no Rio de Janeiro. É graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo na Universidade Federal do Ceará. Formado como ator no Curso de Iniciação Teatral Acontece (Cita). Hoje – além de ser repórter no Vida&Arte, suplemento de cultura do jornal O Povo – ministra o módulo de montagem da 27ª turma do Cita e cumpre o Percurso de Artes Cênicas 2017 do Porto Iracema das Artes.

About the Author

Isabel Costa

Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é essa pessoa que consegue deixar o ar ao redor pleno de uma segurança incomum, mesmo com tudo desmoronando, mesmo que dentro dela o quebra-cabeças e as planilhas nunca estejam se encaixando no que deveria estar. É repórter de cultura, formada em Letras pela UFC e possui especialização em Literatura e Semiótica pela Uece. Formadora de Língua Portuguesa da Secretaria da Educação, Cultura, Desporto e Juventude de Cascavel, Ceará.

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