Por Sara Síntique*
A poeta cearense Sara Síntique escreve poemas quinzenalmente para o Leituras da Bel. ENesta terça-feira, 5 de setembro, ela publica “vazio, amor”, “natimorto, amor” e “sede, amor”. Leia abaixo:
vazio, amor
nos dias em que a palavra não vem
e não há coisa grandiosa
nenhuma outra invenção – mesmo o sol
que traga ao coração aquela certeza
de se saber algo além da carne
um vestígio
alguma coisa ínfima
um pequeno susto
um fiapo
tampouco
nada
***
natimorto, amor
eu queria escrever um poema
antes que tu me falasses
da solidão das capitais
do futuro par de amantes
desfeito com um abraço vago
dos passos ao largo da rua
os corpos em oposição
eu queria escrever um poema
quando guardei a caneta para
atender tua ligação e depois
enquanto lias a Canção de Ginsberg
eu me confundia toda sobre
o que teria sido melhor
(talvez fosse mesmo a oposição)
um poema que desse conta de teus olhos
em ou uma duas linhas uma palavra sucinta
incendiada – como tu e esses teus olhos
que me atravessam mesmo que estejas
somente a voz ao telefone
mas agora
uma tristeza absurda invade
e tu me dizes continua
teu café esfria
escreve isto que estavas a escrever
depois pedes desculpas
pela interrupção da vida
(não há o que o perdoar)
e silenciamos.
***
sede, amor
alguma existência
perpasse a garganta
*Sara Síntique é poeta, atriz, performer, mediadora de leituras e educadora. Mestra em Literatura Comparada pela Universidade Federal do Ceará (UFC), onde também se graduou em Letras Português – Francês. Nasceu em Iguatu (CE), em 1990, e reside em Fortaleza desde 2001. Autora do livro de poesia Corpo Nulo (Editora Substânsia, 2015).
Escreve poemas quinzenalmente para o blog Leituras da Bel.