Em sua crônica de hoje, publicada quinzenalmente no O POVO, a escritora Ana Miranda manifesta-se contra a construção do estaleiro no Titanzinho, no bairro do Serviluz.
Ela inicia mostrando-se favorável a várias iniciativas do governo do Estado para depois expor as razões de sua contrariedade em relação ao estaleiro:
«Basta um passeio pela orla de Santos, ou de Vitória, para constatarmos a destruição de uma possibilidade racional, humana, o desprezo pelo que vale e significa a paisagem na alma de uma cidade. Não apenas a paisagem, mas o preço da degradação urbana que se forma em torno dessas indústrias. Coisas do passado. Nenhuma administração pode se permitir mais esses equívocos. Basta passear pela orla do Rio, pela Barra, pela Lagoa, para ver o oposto, calçadas, jardins, playgrounds, bosques, quiosques, ciclovias… Barcelona, Londres, Paris, Sidney, Manaus, Belém, Boa Vista… O estaleiro na orla urbana renega o próprio aquário construído para a ocupação de área nobre, em favor da cidade e da população, do mesmo modo como foi feito o belíssimo Dragão do Mar, que, sozinho, numa ilha entre abandonos, perde sua simbologia e força. O grande símbolo dessa ocupação das áreas nobres pelo interesse elevado, pela população, é uma guinada contra a utilização desses espaços como zona de deleite subalterno ou de violência consentida. A cidade, como diz Lucio Costa, é um ato deliberado de posse, de um gesto desbravador. O que se poderia esperar era o contrário, a retirada do porto de Mucuripe para local mais adequado, com todos os seus guindastes, contêineres, caminhões, óleo e fumaça, e que a orla prosseguisse em sua função. Ali a aptidão é, juntamente com o Titanzinho, ser uma área de beleza e valores naturais, como é o aterro do Flamengo no Rio, artisticamente arborizada, com quadras para atividades esportivas, de brincadeiras infantis, celeiro de tartarugas e golfinhos, praia para pescaria e surfe, calçadas para passeios, lazer e reconforto para os moradores de Serviluz, escolas esportivas, o que está ditado pela sua ocupação espontânea.»
A sensibilidade da escritora não lhe embota os motivos materiais. Pelo contrário o seu texto é a mistura de argumentos racionais [áreas industriais dentro da cidade tendem a degradar seu entorno] e de emoção: “Todo esse esforço, pago pela população e empreendido pelo poder público, deve tornar Fortaleza uma cidade moderna e corajosa, não mais uma capital de província, nem uma serva do interesse econômico, mas a tradução da ideia de prestígio e dignidade, associada à noção de coisa pública, acompanhando as preocupações do nosso tempo e as necessidades e sonhos de nosso povo.”
Vamos ver o que diz o engenheiro Cid Gomes.
Grande Plínio, parabéns pela maneira de como você está abordado e tecendo informações para este sensível tema que envolve a pólis. Não poder ser um decisão cartesiana- Quem é contra x Quem é a favor … paralelas de soma ZERO e que nada contribue para a construção da cidade dos nossos sonhos… A sensibilidade e a habilidade sua e da brilhante escritora Ana Miranda nos deixa feliz … Uma uma outra polis, uma cidade de gente, para os cidadãos e cidadãs é possível … Avante nesta significativa contribuição para o debate, sem circo …
Sobre as divergências entre governos e a noção de poder, escolhi essas reflexões de Humberto Maturana em que ele diz que “Os encontros de pessoas com diferentes ideologias se transformam em lutas eternas ou se resolvem pela negação total de um ou de outro. Os desacordos ideológicos nunca geram conversações para dizer algo novo, somente são ocasiões nas quais se busca obrigar o outro a entregar sua obediência ou sua negação total…não existe poder. E enquanto pensamos que tudo o que está em jogo é uma luta pelo poder a única coisa que vamos criar são dinânamicas tirânicas,vamos passar de uma pequena tirania para outra pequena tirania. Não vamos fazer um conviver democrático, porque não vamos poder conversar no respeito mútuo, na realização de um projeto. A democracia é uma obra de arte, do conversar, do equivocar-se e do ser capaz de refletir sobre o que se fez de modo que se possa corrigir” Que tal Ché?