Meu artigo publicado na edição de hoje (3/10/2010) do O POVO.
O efeito Marina
Plínio Bortolotti
Em agosto de 2009, quando Marina Silva anunciava a sua saída do PT para concorrer à Presidência pelo PV, escrevi um post em meu blog dizendo que ela – diferentemente de Ciro Gomes, também pretendente, à época – é que poderia causar estragos à candidatura de Dilma Rousseff (PT), a escolhida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Dizia que ela seria um “osso duro de roer”, tanto pela sua trajetória pessoal, como pela leva de petistas desencantados com Lula que ela poderia atrair (tem gente sempre em busca de um herói). Um leitor deixou então um comentário perguntando se eu estava dando uma de “irmã Jurema” (conhecida “vidente” de Fortaleza). Respondi-lhe não se tratar de adivinhação, mas de análise.
Marina começou com 9% da preferência do eleitor, obtendo mais de 19% dos votos. A performance da candidata verde foi jogando água fria na fervura na qual Lula pretendias cozinhar as eleições, transformando-as em plebiscito comparativo com os oitos anos de governo de seu antecessor Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Obviamente, os petistas prefeririam liquidar a fatura no primeiro turno. Mas, talvez, o pior pesadelo seria enfrentar a própria Marina, de quem ainda não se sabe que candidato apoiará – ou se vai dar o seu apoio a um deles – talvez prefira não declarar o voto, deixando de oferecer um indicativo aos seus seguidores.
Mas, se a tática lulista de transformar as eleições em um plebiscito não funcionou plenamente no primeiro turno, agora ele terá condições de testá-la em sua plenitude. Se o PSDB topar o jogo, escalando FHC de atacante, o negócio poderá ficar animado.
O que parece certo é que a “inteligêcia coletiva” do eleitorado, ao tempo em que dá a Lula índices inéditos de aprovação, vem se recusando a lhe entregar um cheque em branco, tendo imposto a ele – e agora à sua candidata – o desconforto de enfrentar um segundo turno.
“Estamos atentos” parece querer dizer o eleitor. Será isso um avanço na consciência política?
(Escrevi o texto com 98% dos votos apurados. No blog dou indicação dos posts a que me referi neste artigo.)
Os posts que citei no artigo
• Marina Silva é quem poderá provocar abalo na candidatura de Dilma Rousseff
• Marina Silva, uma floresta no meio do caminho
Plínio,
Acho que precisamos avaliar se os votos conferidos à Marina foram movidos pelo que ela representa ou pelo criação feita e promovida pela mídia opositora ao governo.
Serra é o favorito por si mesmo, Dilma chega com a sombra de Lula e isso já foi suficiente para lhe render mais votos do que para Serra, conhecido do eleitorado há mais de 25 anos. Marina foi insulflada nas últimas semanas com um adesismo oportunista da mídia e de formadores de opinião.
Juntando isso e outros fatores, temos o 2º turno e o temor (falo por mim, agora) de que a baixaria midiática ocupe a cena. Aliás, a roube e a entregue a Serra.
Serra não tem o que dar. Face aos resultados para o senado e câmara, um governo tucano vai à bancarrota – e nós com ele.
A dúvida que paira é se Dilma saberá conduzir este país fora da sombra de Lula.
Feliz cada novo dia…
Caro Leonardo,
Não acredito que a “mídia” tenha tanto poder assim.
[Envio-lhe abaixo um texto, do professor Vladimir Safatle, que faz uma análise do programa do PV e dos rumos que pode tomar o partido no Brasil.]
Abraço,
Plínio
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MARINA SILVA EM WALL STREET
Vladimir Safatle
[Folha de S. Paulo, 4/10/2010]
“Wall Street” é, entre outras coisas, o nome do novo filme do cineasta norte-americano Oliver Stone. Ele conta a história da crise financeira de 2008 tendo como personagem central um jovem especulador financeiro que parece ter algo semelhante ao que um dia se chamou pudor.
Sua grande preocupação é capitalizar uma empresa, que visa produzir energia ecologicamente limpa, dirigida por um professor de cabelos brancos e ar sábio. O jovem especulador é, muitas vezes, visto pelos seus pares como idealista. No entanto, ele sabe melhor que ninguém que, depois do estouro da bolha financeira, os mercados irão em direção à bolha verde. Mais do que idealista, ele sabe, antes dos outros, para onde o dinheiro corre. Enfim, seu pudor não precisa entrar em contradição com sua ganância.
Neste sentido, “Wall Street” foi feliz em descrever esta nova rearticulação entre agenda ecológica e mundo financeiro. Ela talvez nos explique um fenômeno político mundial que apareceu com toda força no Brasil: a transformação dos partidos verdes em novos partidos de centro e o abandono de suas antigas pautas de esquerda.
A tendência já tinha sido ditada na Europa. Hoje, o partido verde alemão prefere aliar-se aos conservadores da CDU (União Democrata-Cristã) do que fazer triangulações de esquerda com os sociais-democratas (SPD) e a esquerda (Die Linke). Quando estiveram no governo de Schroeder, eles abandonaram de bom grado a bandeira pacifista a fim de mandar tropas para o Afeganistão. Com o mesmo bom grado, eles ajudaram a desmontar o Estado do bem-estar social com leis de flexibilização do trabalho (como o pacote chamado de Hartz IV). Daniel Cohn-Bendit, um dos líderes do partido verde francês, fez de tudo para viabilizar uma aliança com os centristas do Modem. Algo que soaria melhor para seus novos eleitores que frequentam as praças financeiras mundiais.
No Brasil, vimos a candidatura de Marina Silva impor-se como terceira via na política. Ela foi capaz de pegar um partido composto por personalidades do calibre de Zequinha Sarney e fazer acreditar que, com eles, um novo modo de fazer política está em vias de aparecer. Cobrando os outros candidatos por não ter um programa, ela conseguiu esconder que, de todos, seu programa era o economicamente mais liberal. O que não devia nos surpreender. Afinal, os verdes conservaram o que talvez havia de pior em maio de 68: um antiestatismo muitas vezes simplista enunciado em nome da crença na espontaneidade da sociedade civil.
Não é de se estranhar que este libertarianismo encontre, 40 anos depois, o liberalismo puro e duro. De fato, a ocupação do centro pelos verdes tem tudo para ficar. Ela vem a calhar para um eleitorado que um dia votou na esquerda, mas que gostaria de um discurso mais “moderno”. Um discurso menos centrado em conflitos de classe, problemas de redistribuição, precarização do trabalho e mais centrado em “nova aliança”, “visão integrada” e outros termos que parecem saídos de um manual de administrador de empresas zen. Alguns anos serão necessários para que a nova aliança se mostre como mais uma bolha.
VLADIMIR SAFATLE é professor no departamento de filosofia da USP.
Alguém sabe informar uma, repito, uma proposta da sra Marina para situações concretas como: controle da inflação; câmbio; pré-sal, habitação; superavit primário…qual a política econômica dessa sra? Em que difere do que está posto? Respondo: em nuances. Nuances tão tênues quanto uma pétala de rosa daquelas bem ao gosto das propagandas da natura.
A única coisa parecida com proposta apresentada por ela foi o aumento do investimento em educação para 10% do PIB. Mesmo assim, não disse como. De onde vai tirar o dinheiro. No mais, ficou como na canção: “o azul jezebel no céu de calcutá. Feliz constelação…”.
Sabe, fosse séria mesmo, essa senhora teria saído do PT para o Psol. Não para um partido de aluguel, um partido desideologisado, uma sombra do que foi o PV. Não há um partido verde. Ela sim tem militância reconhecida nessa área. E só.
Outra coisa: onda verde uma pinóia. O discurso verde atingiu em cheio os anseios da pequena burguesia urbana. Aquela que quer a máquina funcionando, sem injustiças, sem corrupção, mas não sai da sua zona de conforto nem mete a mão na graxa para fazê-la funcionar.
O que houve foi o não-comparecimento do eleitor em números acima dos previstos. A tal onda verde não de 1,5 ponto percentual acima do previsto nas últimas pesquisas.
Do azul da estrela!
José de Arimatéia
Plínio,
É isso: Marina, em seu discurso e propostas atraiu um empresariado interessado em que seu capitalismo fosse tingindo de verde.
Não é um discurso de massa, para pessoas que não tem qualificação para o mercado e carecem de auxílio do estado, muito menos para aquelas que vivem na falta de saneamento básico e à mercê de um sistema de saúde público limitado e precário.
Um discurso para a compreensão de uma geração mais jovem, assediada por temas como sustentabilidade e aquecimento global.
Ao lado disso, parte relevante daqueles com viés moralista migraram para Marina ao serem contaminados por boatos a respeito da postura moral de Dilma.
E nesse tocante a mídia não hesitou em fomentar, Plínio.
Pondere sobre o destaque que Marina ganhou nas últimas três semanas anteriores às eleições – somente ela poderia tirar votos de Dilma. Foi o que aconteceu.
Feliz cada novo dia…