Com o título “Para cooptar”, o jornal O Globo, edição desta quarta-feira [24/6/2009] ataca várias inciativas do governo federal na área da comunicação.
O problema não é o jornal fazer críticas – esse é um dos papéis fundamentais da imprensa – a questão é que o jornal carioca atira no que não quer ver e, obviamente, não haveria como acertar o alvo.
Primeiro, critica o fato de a Secretaria de Comunicação ter aumentado o número de veículos de comunicação que recebem verba publicitária. [Sem aumentar a despesa na mesma rubrica feita em governaos anteriores, o que o editorial não informa].
Escreve O Globo: “Os números provam o alcance da estratégia: a Secretaria de Comunicação distribuiu, no ano passado, propaganda oficial entre 5.297 veículos. Em 2003, foram 499. […] Não é ilegal, mas se trata de indiscutível desvio de verba pública para pequenas empresas de comunicação que tendem a ficar dependentes da propaganda oficial -, ao contrário da imprensa profissional de grandes centros”.
Ora, façam-me o favor, “desvio de verbas públicas”? Então, o dinheiro público só é bem gasto quando entra nos cofres dos jornais do Sul e Sudeste? O Globo e outros jornais dos “grandes centros” têm monopólio do profissionalismo e da ética? Seria risível, não fosse patético.
Depois critica o fato de Lula iniciar a produção de uma coluna para distribuí-la aos jornais, deste modo: “A coluna do presidente, oferecida a jornais populares, é outra evidência do projeto de cooptação de parte da mídia”.
Aqui, O Globo, simplesmente esconde a verdade de seus leitores. A coluna do presidente poderá ser publicada por qualquer jornal. Ela será distribuída primeiro para aqueles que se cadastrarem [qualquer impresso pode fazê-lo]. Depois, a publicacão se tornará livre, mesmo para os que não se cadastrarem.
Ataca também a concessão de uma retransmissora de TV e de uma rádio para um sindicato: “Assim como a montagem de uma rede sindical de comunicações no ABC paulista, sustentada por verbas publicitárias oficiais, visa também a influenciar eleitores”.
Nada fala o jornal sobre a concessão de TVs para confissões religiosas e nem para políticos, o que é proibido pela Constituição.
Depois, o editorial atropela a história: “Getúlio Vargas manejou recursos do Banco do Brasil com o mesmo objetivo. A História mostra que o desfecho é sempre uma conta com vários zeros endereçada ao Tesouro Nacional”.
O que Getúlio Vargas fez foi usar o Banco do Brasil para emprestar dinheiro ao jornalista Samuel Wainer, para que ele fundasse o jornal Última Hora, que era porta-voz do getulismo. Não há nada parecido com o que fez até agora o governo Lula.
Ainda, para não perder o costume, o jornal fluminense dá uma porradinha no blog da Petrobras. Mas aí é jogo perdido. A imprensa, cada vez mais, vai ter de se acostumar a ser interpelada.
No mais é o seguinte, se O Globo pretende que os leitores respeitem os seus editorais, vai ter de arranjar argumentos mais consistentes do que aqueles que só defendem seus próprios interesses.
Leia o editorial do O Globo na íntegra.
Para cooptar
O Globo – 24/06/2009
No primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, o pendor dirigista e intervencionista de grupos que o acompanham levou o governo a tentar uma operação legislativa para limitar o trabalho da imprensa.
Vem daí o projeto de lei de criação do Conselho Federal de Jornalismo, um organismo paraestatal destinado a tolher redações. A reação foi grande, o Congresso criticou, e Lula, com acerto, voltou atrás. É do mesmo período a tentativa de controle da produção audiovisual por meio da Ancinav, outra iniciativa frustrada deste grupo.
Não por coincidência, eram propostas ao estilo bolivariano, projeto autoritário de subjugação da sociedade, de inspiração cubana, exportado por Hugo Chávez para Equador, Bolívia, Paraguai e com influência até na Argentina. Não deu certo no Brasil porque suas instituições democráticas são das mais consolidadas na América Latina.
No segundo mandato, o governo Lula optou por uma estratégia mais sutil, da qual constam uma grande ampliação do leque dos beneficiários das verbas publicitárias do Executivo – a rigor, iniciada já no primeiro mandato -, e uma postura mais agressiva, exemplificada pelo blog da Petrobras, lançado em meio a discursos ornados por chavões, mas cujo objetivo era mesmo atemorizar a imprensa profissional.
Mas errou na dose ao quebrar a relação de sigilo entre repórter e fonte.
Teve de recuar.
Não há nada de ilegal no blog da empresa. Havia um retrocesso no terreno da ética, depois corrigido.
Também não parece existir ilegalidade na política de distribuição de verbas publicitárias, com prioridade para veículos da imprensa regional.
Os números provam o alcance da estratégia: a Secretaria de Comunicação distribuiu, no ano passado, propaganda oficial entre 5.297 veículos. Em 2003, foram 499.
Não é ilegal, mas se trata de indiscutível desvio de verba pública para pequenas empresas de comunicação que tendem a ficar dependentes da propaganda oficial -, ao contrário da imprensa profissional de grandes centros. A coluna do presidente, oferecida a jornais populares, é outra evidência do projeto de cooptação de parte da mídia.
Assim como a montagem de uma rede sindical de comunicações no ABC paulista, sustentada por verbas publicitárias oficiais, visa também a influenciar eleitores.
Não há justificativa técnica para a inserção de anúncios neste tipo de veículo.
Operações como essas são conhecidas.
Getúlio Vargas manejou recursos do Banco do Brasil com o mesmo objetivo. A História mostra que o desfecho é sempre uma conta com vários zeros endereçada ao Tesouro Nacional
caro bortolotti,
a grande imprensa, dentre os quais, o globo, folha, estadão, veja e congêneres, continuam dando, irresponsavelmente, tiros nos próprios pés. ideologizaram o discurso e se esqueceram do ofício . a crise é deles e não do jornalismo, creio eu.
é por essas e outras que suas tiragens estão em queda e que a blogosfera avança a passos largos.
desde há muito tempo desisti de assinaturas, voltei a frequentar bancas de revistas, o que é prazeroso, e passear na internet, o que é gratificante. estou bastante satisfeito.
abçs
Caro Plínio,
O texto do O Globo evidencia algo que considero preocupante: mesmo os grandes veículos, pelo menos alguns, possuem uma grande dependência de contratos com governos (federal, estadual, municipal, parlamentos, estatais etc.). Os pequenos então…
Ora, um veículo se torna tão mais independente quanto mais diversifica suas fontes. Mas parece que isso não acontece.
Para mim, governos não deveriam fazer anúncios pagos. Eles já possuem horários gratuitos e cobertura jornalística. Outra coisa: já imaginou se aqui no Ceará a verba publicitária fosse pulverizada?
Abração.
Caro Wanderley,
Concordo que os governos não deveriam fazer publicidade, com ressalvas:
1) Campanhas de interesse público (vacinação, prevenção de doenças, etc.) deveriam continuar permitidas;
2) Também seriam permitidas para empresas estatais que dependem do mercado, como Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica, etc.
Olha,
sinceramente, bater no e na Globo, no sentido figurado, bem claro, é quase uma obrigacao cívica de quem conhece minimamente este grupo de comunicacao. Mas eu vou me furtar dessa tarefa e falar de um outro país que conheco relativamente bem, a Alemanha.
A qualidade de vida deste país está intimamente ligada a uma imprensa relativamente honesta. As razoes pra esta honestidade sao varias mas um dos pilares eh a quantidade absurda de veículos de comunicacao existentes. Absurda pra nos, brasileiros.
Canais públicos de TV sao quatro. Jornais existem aos montes e toda pequena cidade conta com vários locais além dos medalhoes. A assinatura de um desses jornais medalhoes, portanto caros, custa 15 euros por mes pra um estudante. Na banca o jornal normal tb nao eh caro. Radios existem aos montes e muitas delas sao comunitarias. Nao eh nada incomum que as pessoas comparem informacoes em diferentes meios, o que leva ao criticismo saudavel.
Nao é de estranhar que nenhum desses canais detenha os numeros de audiencia q se observa no Brasil. Sendo os segmentos da sociedade diferentes, eles tem interesses diferentes, logo, leem veículos diferentes. Nada mais natural. Aih a concorrencia eleva o nível. Simples assim.
O Problema da globo, eh que eles tinham 85% de audiencia na epoca do regime militar. Detinham o monopólio da verdade de tal forma, que podiam noticiar as manifestacoes contra a ditadura como se fosse a comemoracao do aniversario de Sao Paulo. Ou mesmo editar um debate na eleicao presidencial de forma a favorecer seu candidadato como em 89, num caso raríssimo de apropriacao da História de um povo por interesses particulares.
Hj em dia, a internet vem quebrando as pernas desses caras. Daí a choradeira.