Portanto, não temos vida  simbólica, mas temos necessidade premente dela. Somente a vida simbólica pode expressar a necessidade da alma – a necessidade diária da alma, bem entendido. E pelo fato de as pessoas não terem isso, não conseguem sair dessa roda viva, dessa vida assustadora, maçante e banal onde são “nada mais do que”. No rito estão próximas de Deus; são até mesmo divinas.  (…) A vida é racional demais, não há existência simbólica em que sou outra coisa, em que desempenho um papel, o meu papel, como um ator no drama divino da vida.

Carl Gustav Jung

[Jung, C. G. A vida simbólica: escritos diversos. Tradução de Araceli Elman, Edgar Orth; revisão literária de Lúcia Mathilde Endlich Orth; revisão técnica de Jette Bonaventura. – Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. – (Obras completas de C. G. Jung; v. 18/1) III. A vida simbólica, p. 273.]

Jung foi um dos estudiosos do psiquismo humano que mais enfatizou a importância do símbolo para o desenvolvimento psicológico. Segundo a premissa defendida pelo psiquiatra suíço, à nossa vivência interior correspondem símbolos que podem nos dar pistas e, mais que isso, nos orientar em nossa jornada rumo ao autodesenvolvimento, que ele chamou de processo de individuação.

Tais símbolos aparecem em diversas criações da cultura, mas têm seu lugar privilegiado nas religiões e nos mitos. Aliás, é bom que se diga, ambos estão intrinsecamente ligados, uma vez que não há religião sem mito. Mesmo no caso das religiões que lograram um alto grau de racionalidade e que reivindicam para si bases históricas, como é o caso do cristianismo, ainda assim o mito está mais presente do que se poderia supor em uma análise superficial.

Há uma antiga máxima latina que expressa muito bem o que pensa Jung: Habentibus symbolum facilis est transitus, ou seja, para os que possuem o símbolo a travessia é fácil. O que isso significa? Significa que à medida que imergimos em nossas vivências psíquicas e nos aproximamos dos símbolos que norteiam as nossas experiências, se torna não apenas mais fácil seguir o nosso itinerário, mas, ao mesmo tempo, nossa vida se torna mais rica e mais emocionante, pois ganha um colorido diferente.

É preciso, no entanto, que ao atinarmos com tais símbolos, não nos contentemos apenas em descobri-los, mas que nos apropriemos deles, os façamos nossos, passemos, portanto, a habitá-los mesmo. Quando atingimos esse patamar da experiência,  em que de fato habitamos os símbolos que são como que os marcos da estrada por onde seguimos, observa-se que há um incremento de situações  e acontecimentos em que, a todo momento, eles se manifestam. É como se os símbolos fossem setas  que nos indicam o itinerário e balizam nossas experiências, auxiliando-nos, ao mesmo tempo, a não nos desviarmos da trajetória que é exclusivamente nossa e que determina a singularidade de cada um de nós.

Uma das formas mais convincentes da manifestação do símbolo na vida de uma pessoa são as sincronicidades. Quem se exercita no conhecimento dos símbolos e na percepção das sincronicidades, está de posse de um bom mapa para prosseguir com uma certa segurança em sua peregrinação pelas estradas da vida. 

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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