…no momento em que se toma consciência de uma escolha a ser feita a escolha já está feita – num sentido ou no outro.

Simone Weil

[Weil, Simone. A gravidade e a graça. Tradução Paulo Neves. – São Paulo: Martins Fontes, 1993, p. 54. (Coleção tópicos)]

Faz tempo que planejo me iniciar na vida e obra de Simone Weil. Meu interesse em conhecê-la foi despertado desde que vi pela primeira vez um livro de sua autoria. O título do livro, A Gravidade e a Graça, foi suficiente para provocar em mim o desejo de adquiri-lo. Que título! Ali estavam condensadas duas possibilidades antitéticas e que, de antemão, já me faziam antever o desafio de uma escolha: viver sob a perspectiva do espírito de gravidade ou sob a perspectiva da graça. Embora não soubesse se havia alguma relação entre o espírito de gravidade, de que fala Nietzsche, e a gravidade a que se refere Simone Weil, a associação foi imediata.

É claro que adquiri o livro. Entretanto, não o li. Há duas semanas, limpando a estante, resolvi retirá-lo e deixar ao lado do birô, planejando iniciar sua leitura. Hoje, ao pegá-lo, vi na primeira página a notação da data em que fora comprado por mim: 22 de junho de 1994.

É curioso pensar como um livro cujo título tanto me atraiu e tanta curiosidade me despertou, ficou tanto tempo na estante sem que eu me dispusesse a iniciar sua leitura. Isso, na verdade, tem me acontecido muitas vezes. Adquirir um livro não é garantia de que eu inicie imediatamente sua leitura. Isso, aliás, seria impossível, uma vez que adquiro mais livros do que o tempo de que disponho para a leitura. O importante, porém, é que, uma vez adquirido, o livro está lá, na prateleira, disponível tão logo sua leitura se revele oportuna.

Pois bem, creio que, finalmente, tenha chegado o momento de me iniciar na leitura de algumas obras de Simone Weil. Parece que foi uma boa escolha – me é lícito usar aqui a palavra escolha? – me iniciar por A Gravidade e a Graça. Esta manhã, ao pegá-lo para iniciar a leitura, abri-o aleatoriamente. Vi que abrira na página 54, onde está escrito:

Virgens loucas. – Isso significa que no momento em que se toma consciência de uma escolha a ser feita a escolha já está feita – num sentido ou no outro. Bem mais verdadeiro do que a alegoria de Hércules entre o vício e a virtude.

Quando a natureza, no homem, estando cortada de todo impulso carnal e privada de toda luz sobrenatural, executa ações conformes ao que a luz sobrenatural determinaria se estivesse presente, temos a plenitude da pureza. É o ponto central da paixão.

A justa relação com Deus é, na contemplação, o amor, e na ação, a escravidão. Não confundir. Agir como escravo contemplando o amor…

O título dessa parte do livro é A necessidade e a obediência. O primeiro parágrafo me fez refletir muito sobre a questão das escolhas que fazemos a todo momento, pois a vida é feita de escolhas. A grande sacada de Simone Weil, ao tratar da questão, foi afirmar que a própria consciência de que se tem a possibilidade de escolha ante determinada situação, fato ou seja o que for, já é, em si, uma escolha.

A premissa poderia também levar a outro raciocínio: antes mesmo de tomarmos uma decisão consciente quanto à escolha, talvez num nível mais profundo, eu diria, inconsciente, ela já tenha sido feita, restando-nos apenas explicitá-la.

Não me resta dúvida: a Virgem Vermelha tem muito a me ensinar. Já antevejo neste itinerário pelos meandros de sua vida – e que vida! – e obra, uma fascinante aventura que promete muitas descobertas e reveladores insights.

About the Author

Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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