de-palma-posterAmado, odiado. Esquecido, inesquecível. Diretor de blockbuster, cineasta independente. Ninguém abarca tanto as contradições da Hollywood de 1960 contra a Hollywood de hoje como Brian Russell De Palma. Gênio, com um apuro visual que bebe direto da fonte de Alfred Hitchcock, De Palma é um dos expoentes da geração que dominou Hollywood em sua década mais criativa (1970). Ele, Steven Spielberg, Francis Ford Coppola, Martin Scorsese e George Lucas têm até uma famosa foto para ilustrar a amizade. “De Palma”, de Noah Baumbach, lança luz sobre aquele que melhor viveu os dilemas de uma vida dedicada à arte.

A responsabilidade de retratar a trajetória do gênio por trás de “Trágica Obsessão” (1976), “Carrie, A Estranha” (1976), “Vestida para Matar” (1980), “Scarface” (1983) e “Os Intocáveis” (1987) recaiu sob os ombros de Noah Baumbach (ao lado de Jake Paltrow), de “A Lula e a Baleia” (2005) e “Frances Ha” (2012). Apesar da carreira sólida, Baumbach sempre foi mais conhecido pela densidade pessoal dos roteiros do que pela acuidade visual. Para imprimir De Palma, essa inventividade narrativa acaba fazendo falta.

O que, de fato, Baumbach fez, é uma longa entrevista ilustrada. A intenção, bem sucedida, é se dobrar sobre a obra de De Palma. No entanto, a repetição da mesma imagem de um veterano diretor que resolveu fugir de Hollywood para manter a cabeça criativa sentado na mesma cadeira, citando repetidos nomes, soa cansada. Não importa o quanto seja fascinante ver o autor rever pontos de tensão em produções geniais fracassadas ou fórmulas de sucesso de suas obras-primas. O envelope precisa convencer também.

O lado bom é que a obra de De Palma fala por si só. É delicioso ver a confusão do diretor ao falar do legado hip-hop de “Scarface”. Existe ainda uma satisfação mórbida em ver o desdém com que De Palma vê os tropeços de seus sucessores em adaptar “Carrie, A Estranha”. E parte o coração vê-lo lamentar o fracasso de “O Pagamento Final” ou “Missão: Marte” (2000). Dá para ver ali um punhado de sentimentos genuínos, expressos de uma forma única que só um artista de verdade consegue exalar.

O ritmo disso tudo, no entanto, parece esparsado. Chato, até. Existe ali uma brilhante oportunidade de esmiuçar a série de fatores que fez com que Coppola, De Palma, Scorsese e Spielberg pudessem impor um pensamento criativo dentro da lógica industrial da Hollywood de 50 anos atrás, mas a opção é por uma, digamos, não inflexão. A voz é sempre a de De Palma. O aprofundamento desse cenário fica para a próxima vez.

Existe uma força inerente na obra, entrevista no brilho no olhar do biografado. O impulso estético e a inventividade de De Palma ganham a reverência que mereceram e o documentário ainda pode apresentar um dos diretores mais singulares do cinema norte-americano para uma nova geração. Só que tudo parece aquém. O visual do longa, aquém da genialidade de De Palma. O filme, em si, aquém da filmografia de Baumbach. É mais um quase Brian De Palma, um quase Noah Baumbach. O que já é mais do que pode ser dito sobre a maioria dos filmes norte-americanos.

Ficha técnica
De Palma
(EUA, 2015), de Noah Baumbach. Documentário. 110 minutos. Com Brian De Palma.

About the Author

André Bloc

Redator de Primeira Página do O POVO, repórter do Vida&Arte por seis anos, membro da Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine).

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