No templo vivente da divindade – Maria -, Deus habitou não só por natureza, presença, essência, como no mundo; não só por graça, fé, esperança e caridade, como na Igreja; não só pela glória, pela visão e fruição do sumo Bem, como no Céu; mas também de modo corpóreo. Qual deve ser a capacidade do Templo que encerra em si aquele que os céus não podem conter! Nele foi oferecido o grande Sacrifício de valor infinito, como a majestade divina. Nele desce uma abundância de graça e de méritos, superiores ao infinito tesouro da Igreja militante e triunfante e do próprio paraíso. Na Igreja e no paraíso a glória e o mérito são finitos; em Maria, ao contrário, infinitos. Cristo nela encarnado é o Sol da justiça, do qual deriva toda a luz no céu e na terra; é o rio que brota da Fonte perene; Maria é o aqueduto que conduz a água.

São Lourenço de Brindisi

[São Lourenço de Brindisi. As grandezas de Maria. Citado em: Sgarbossa, Mario. Os santos e os beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente: com uma antologia de escritos espirituais. Tradução Armando Braio Ara. – São Paulo: Paulinas, 2003, p. 475.]

As pessoas que têm lido os textos postados no Sincronicidade sabem que habitualmente escrevo sobre a Virgem Maria apenas aos sábados. Como esse é o dia consagrado a Nossa Senhora, decidi que dedicaria este dia à postagem de textos exclusivamente sobre a Santa Mãe. Hoje, porém, abro uma exceção. O fato é que este texto tinha que ser postado hoje, 21 de março de 2012. Por motivos que não me proponho revelar aqui, eu não poderia adiar até sábado a sua publicação.

Há pouco tempo tive oportunidade de comentar neste blog os mistérios da devoção a Nossa Senhora. A minha convicção quanto à inefabilidade dessa devoção só tem aumentado. São fatos aparentemente tão simples e, ao mesmo tempo, de tal inefabilidade, os que acontecem a quem se entrega, de fato, a essa devoção, que fico muitas vezes sem saber o que dizer ou pensar sobre o assunto. É algo – não hesitaria nenhum momento em afirmá-lo -, que toca mesmo o inefável.

Curioso é como se dá o encadeamento de fatos e acontecimentos muitas vezes sem que o percebamos. Parece-me que o devoto de Nossa Senhora vai sendo conduzido parcialmente à revelia de si mesmo por meandros e veredas surpreendentes.

Digo parcialmente porque, em parte e em determinadas ocasiões, um esforço pessoal do devoto é demandado. É algo assim como se uma certa parcela de liberdade estivesse sempre à sua disposição, cabendo-lhe decidir quando duas ou mais opções se apresentam como possibilidades. É a velha história do livre-arbítrio.

Penso que, nessas ocasiões, Maria se faz especialmente presente e assiste com particular cuidado aos seus devotos.  É quando ela, parece-me, se faz mais próxima, postando-se invisível mas atuante, ao lado daquela criatura que, em seu extremo desamparo, limitação e falibilidade, demanda uma atenção maior para que não tropece e caia.

Ou seja: em que pese o livre-arbítrio, a liberdade para agir, há como que um sopro divino, um toque particular, uma suave brisa que sopra e murmura, levando o devoto a tomar a decisão que lhe é mais conveniente e necessária e, portanto, a mais correta naquela situação específica em que se encontra.

Ao escrever tais coisas, devo salientar que ninguém precisa reverenciar Nossa Senhora se não se sente à vontade para fazê-lo. Reputo essa uma questão de foro muito íntimo, uma decisão muito particular, que só diz respeito à própria pessoa. A ninguém deve ser dado o direito de fazer proselitismo nem tentar convencer quem quer que seja a adotar essa ou aquela postura. As escolhas religiosas de uma pessoa devem ser sempre condicionadas às suas idiossincrasias e motivações pessoais. É algo que somente a ela diz respeito e, portanto, ninguém tem o direito de interferir.

Escrevo sobre este tema apenas para enfatizar que, na perspectiva da religião que escolhi para mim, a devoção à Virgem Maria sobressai como uma das grandes benesses que ela me proporcionou, cujos frutos têm sido para mim de valor indizível e incalculável.

E eu tinha que dizer isso hoje.

About the Author

Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

View All Articles