Barbossa (Geoffrey Rush) amarra Sparrow (Johnny Depp) no mastro central de um navio pela ducentésima vez

Um herói virtuoso em busca de redenção familiar. Uma mocinha valente com muito a provar. Um pirata indolente como centro de ação, alívio cômico e aspecto aleatório da trama. Navegadores mortos, destinados a se vingar do genialmente estúpido capitão Jack Sparrow (Johnny Depp). Quem já assistiu ao divertidíssimo “Piratas do Caribe: A Maldição do Pérola Negra” (2003), de Gore Verbinski, deve ter adivinhado facilmente que essa é a sinopse do filme que iniciou a bilionária franquia da Disney. Bom, não estaria errados – mas também nem tão certos. O resumo é de “Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar”, de Joachim Rønning, Espen Sandberg, só que, bem… O filme não aposta em nada lá muito original.

Jack Sparrow está lá, mais desgastado do que nunca. Outrora o mais carismático ator de Hollywood, hoje Johnny Depp visivelmente carrega o peso de uma vida pessoal conturbada. O capitão era o aspecto de leveza, a graça que transformava a franquia de derivativo em original. Agora, ele é um recurso cansado, pesado. Custa a se acreditar que essa é apenas o quinto longa da franquia, tamanho o esgotamento que ela enfrenta. Dessa vez, os mocinhos da vez são o inexpressivo Henry Turner (Brenton Thwaites), filho do protagonista original, Will (Orlando Bloom) e a misteriosa Carina Smyth (Kaya Scodelario). A dinâmica é aquela já conhecida, estabelecida por Will e Elizabeth Swann (Keira Knightley) nos três primeiros longas da série. Kaya até imprime alguma força e os aspectos científicos da personagem são interessantes. O problema é que isso não encaixa na atmosfera de galhofa da franquia.

Quando esse belo sorriso é o principal acerto de um filme, fiquem preocupados

Essa dinâmica, aliás, foi buscada até no quarto filme da franquia, o chatíssimo “Navegando em Águas Misteriosas” (2011), de Rob Marshall. “A Vingança de Salazar”, inclusive, só soa bom em comparação ao antecessor, que nem mesmo consegue ser divertido. A nova obra é eficiente em alguns pontos, principalmente ao reinventar cenas de ação caóticas e absurdas. Destaque para a sequência da guilhotina, que remonta aos melhores momentos da franquia. O outro acerto é o design de produção, principalmente no tocante à construção visual dos personagens “mortos”. E, bem, não dá para errar com um Javier Bardem de vilão fantasma.

Só que é tudo tão derivativo. A gente já viu o capitão Hector Barbossa (Geoffrey Rush) em versão fantasmagórica perseguindo Jack Sparrow e mirando uma vingança. O pirata bufão sendo abandonado por sua tripulação? Visto. Ele dormindo com a esposa de um oficial que quer matá-lo? Já teve. Um navio fantasma de design incrível dominando os “sete mares”? Repetido. Um romance insosso no centro da trama? Já estava lá. Nada, nada mesmo, é novo. Tudo parece apenas cumprir o papel de ampliar o espectro mitológico da franquia para poder criar um novo cenário no parque de diversões. Vale lembrar que os filmes surgiram inspirados no parque temático da Disneylândia.

A moda agora é, é rejuvenescer atores famosos

No misto de sobrenatural com um fiapo de roteiro, “Piratas do Caribe” fez bilhões. Apesar de pouco original, a franquia era autêntica. Abraçava o absurdo e investia em um ritmo frenético e ação caótica. Só que agora se resume a insistir sempre nos mesmos elementos. Casal romântico insosso, pirata bêbado, relíquia mitológica, tripulação desprovida de inteligência, mortos-vivos vingativos. O que “A Vingança de Salazar” falha em entender é que a verdadeira morta-viva é a franquia, que se arrasta com efeito quase nulo desde 2007.

(andrebloc@opovo.com.br)

Cotação: nota 3/8

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André Bloc

Redator de Primeira Página do O POVO, repórter do Vida&Arte por seis anos, membro da Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine).

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