“O nosso penúltimo show antes da paradinha foi aí. Era um momento que eu sabia que não ia continuar na banda. Foi um show muito especial”. Assim Toni Garrido começa nossa conversa por telefone. Animado, ele falou (e muito) sobre o retorno a Fortaleza e ao microfone de uma das bandas de reggae mais populares do Brasil. Depois de 14 anos como vocalista do Cidade Negra, ele se afastou por três anos por conta de divergências internas e foi substituído por Alexandre Massau (ex-Berimbrown).

As brigas quase encerraram definitivamente a carreira do Cidade Negra e ainda levaram embora o guitarrista Da Gama. Mas, bastou um telefonema para acertar os ponteiros e Toni reassumir seu posto ao lado dos amigos Bino Farias (baixo) e Lazão (bateria). Juntos, eles gravaram canções inesquecíveis para os fãs do Cidade Negra, como A sombra da maldade, Pensamento e Sábado à noite. Todas vão estar presentes no show de hoje, além de algumas inéditas que já estão sendo gravadas. “Estou chegando no estúdio agora pra começar a gravação. Deseje-nos sorte”. Pedido atendido, boa sorte ao Cidade Negra em mais esta etapa.

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O POVO – Como está sendo esse seu retorno ao Cidade Negra?

Toni Garrido – Retorno dos que nunca foram. Bem… Foram. No fundo, nunca se desvinculou. Fizemos tudo pra respeitar a distância e assumir uma parada. Precisava disso. O Cidade é ma banda que sempre trabalhou com a energia equilibrada, falando em superação, positividade, harmonia, amor, respeito. E tudo era vivenciado no curso das coisas. Seria desonesto, num momento onde as coisas não estavam boas, continuar falando nisso. Se tivesse tido um pouco mais de tempo e paciência, talvez tivesse resolvido isso (de outra forma).

O POVO – Mas quais os motivos que o levaram a sair da banda?

Toni Garrido – Tinha uma convivência muito legal, mas tinha dois pontos que ninguém chegava a um resultado: férias e trabalhos solos. Eu tava há 15 anos na banda sem férias e tinha duas filhas. Quando chegou a essa discussão, eu falei “então ta. eu vou parar seis meses”. E a banda não parou.

O POVO – Vocês passaram esse tempo todo sem se falar e acertaram as diferenças num telefonema. Como foi essa conversa?

Toni Garrido – Foi um bate-papo que não teve durante três anos. É assim, afasta, pára, pensa e vai de novo. Uma conversa de superação, de reconciliação, entendimento, perdão, elasticidade, permeabilidade. Com esses anos todos falando sobre isso (nas músicas), tinha que aplicar também. São conceitos claros. As coisas não partiram de pessoas falando que iria voltar. Tem uma história muito forte, uma coisa muito importante. É muito injusto não fechar uma estrada que a gente começou a abrir. O Cidade abriu espaço para muitas bandas brasileiras reggae, como o Natiruts, Planta e Raiz, que hoje estão abrindo caminhos pra outros.

O POVO – Nesse tempo afastado, você lançou um disco solo. Como foi essa experiência?

Toni Garrido – É uma experiência que vale, como a de muitos que ainda virão. Não sei quantos virão, mas com certeza tem experiências que não podem ser passadas em banda. Cada um tem uma noção de que existe vida na banda e em outros lugares. Hoje há uma compreensão sobre isso. Mas, a banda é o principal projeto de cada um. Agora é reorganizar e vir com tudo pra cima. A ideia é isso mesmo. A gente querendo, vai pra cima mesmo. Parece estranho falando assim, mas é uma questão de auto-estímulo, auto-confiança. É sério mesmo.

O OPOVO – Seu trabalho no Cidade Negra é voltado para o Reggae, mas seu disco solo tem uma pegada mais black. Queria que você falasse sobre os sons que o inspiram como cantor?

Toni Garrido – Fui criado numa área que não é rica na cidade (Belford Roxo), que é comum ser tratada como periferia. Nessa periferia sempre se ouviu muita black music. Se ouvia rock, ouvia o (rock) que tinha um pouco de black muisc. Ouvia-se também os pretos do Brasil, como Gilberto Gil, Djavan, Jorge Ben, Copa 5. Tinha também Stevie Wonder, Little Richard e as bandas dos anos 1970. Também se ouvia muito Roberto Carlos e era legal que no domingo, como todos em casa, ouvia-se tudo ao mesmo tempo.

O POVO – Teve mais algum som importante pra sua formação?

Toni Garrido – Com 7 ou 8 anos, fui morar em outra cidade com a família Garrido (o nome de batismo de Toni é Antônio Bento da Silva Filho), e meu irmão estava ouvindo Led Zeppelin, Cream, Novos Baianos, essas coisas da psicodelia. E os meus pais, 50 anos mais velhos, era a MPB que estava surgindo na época, como Clara Nunes, Chico, Caetano e Martinho da Vila. Esse é um mosaico do que eu ouvi. Depois entrou o rock nacional e eu disse “é isso que eu quero pra mim”.

O POVO – Você levou sua ligação com a soul music para o Cidade e isso marcou também uma guinada da banda para um som mais pop. Isso foi combinado ou foi acontecendo?

Toni Garrido – A banda só teve um vocalista que queria isso. A banda escolheu o seu cantor e queria esse caminho. O Rãs Bernardo (primeiro vocalista do Cidade Negra) era muito específico. A característica dele era essa. Mas o soul é o elemento principal do reggae. Quando fui chamado pra cantar no Cidade ainda pensei se iria ou não. Mas, depois, vi que todos os cantores reggae tinham uma característica soul, de alma. O soul é a mãe do reagge.

O POVO – O Cidade vai voltar a Fortaleza sem o guitarrista Da Gama. Foi uma decisão dele não voltar?

Toni Garrido – Peraí! Vamos organizar. O Da Gama faz parte de uma formação passada do Cidade, assim como o Bernardo saiu da banda, como o Alexandre (Massau, que assumiu o lugar de Toni) saiu. Cada um teve um processo particular. Depois que eu saí o Da Gama continuou, depois saiu. A história dele é essa. As pessoas perguntam, mas as voltas não são compulsórias. Não tenho nenhum poder pra falar sobre isso. Ele não se convidou, nem foi convidado a voltar.

O POVO – Quem fica no lugar dele nesse show de Fortaleza?

Toni Garrido – Ficamos com os mesmos músicos contratados que nos acompanham há bastante tempo. O Alex meireles (tecladista) e o Sérgio Yazbek (guitarra). Nada impede que ele (Da Gama) volte. Eu criei minha volta. Tava fora da banda e sem contato verbal ou visual com nenhum deles. Mas, cada história é uma história.

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O POVO – E como está a gravação do disco novo? O que você já pode adiantar?

Toni Garrido – As gravações vão começar hoje. Estamos aqui pra fazer umas 13 ou 14 músicas. O nome ainda nem tem, só uma série de sugestões. Em 20 dias, já esperamos ter. Nesse show de Fortaleza, já vamos apresentar coisas novas.

O POVO – O disco vai só com inéditas, ou vão colocar algo de outros compositores, como costumam fazer?

Toni Garrido – Como intérprete, tem tanta coisa boa pra cantar. Tanto que já gravamos um disco só de intérprete (Diversão, 2007). Nesse novo, nós queremos colocar uma versão de O Pequeno Burguês, do Martinho da Vila, e uma que eu gosto que é When love comes knocking (at your door), que não lembro de quem é (The Monkees). Essa música é incrível e todo mundo adorou.

O POVO – Você também construiu uma carreira como ator no cinema e na TV. Como foi essa experiência? Pretende fazer outros trabalhos como ator?

Toni Garrido – Ia fazer uma novela, mas não vou por conta da banda. Eu estava no elenco de Amor e Revolução (novela do SBT que estreou na última segunda-feira), do Thiago Santiago, mas tive que deixar. Até por que o disco vai ser na Som Livre (gravadora ligada ao grupo Globo). Mas to escalado pro filme Rota Comando, do Elias Júnior, sobre o ROTA (tropa da polícia militar) de São Paulo. Tem também um programa de TV, se eu conseguir.

O POVO – O que o público pode esperar do show deste sábado?

Toni Garrido – Um grande encontro com a cidade. Somos uma banda que tem muita noção de quem é o público. A gente faz show pra quem ta lá.Vamos fazer a festa e esperando que a galera tenha receptividade pras músicas novas.

Discografia completa do Cidade Negra:

> Com Ras Bernardo:

– Lute Para Viver (1991)

– Negro no Poder (1991)

> Com Toni Garrido:

– Sobre Todas as Forças (1994)

– O Erê (1996)

– Quanto Mais Curtido Melhor (1998)

– Hits & Dubs (1999)

– Enquanto o Mundo Gira (2000)

– Acústico MTV (2002)

– Perto de Deus (2005)

– Direto – Ao Vivo (2006)

– Diversão (2007)

> Com Alexandre Massau:

– Que Assim Seja (2010)

> DVDs (todos com Toni)

– Acústico MTV (2002)

– Direto – Ao Vivo (2006)

– Diversão (2007)

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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