Djavan Caetano Viana canta música brasileira com sotaque jazzístico, pegada soul e estilo clássico. Junte a isso uma admiração por Bossa Nova e música africana, e um disco de estreia – A voz, o violão e a música de Djavan (1976), reeditado recentemente – formado basicamente por sambas. Tanta versatilidade tem uma explicação: sua escola como cantor foi como crooner da banda de Osmar Milito. E era esse pianista paulista quem o desafiava a cantar dois tons acima. O esforço não era pequeno, mas ele abraçou a empreitada e acabou moldando uma das vozes mais personalizadas da música brasileira.

Pra mostrar que essa época de bailes deixou saudades, Djavan se voltou para ela no disco Ária (Biscoito Fino, 2010), seu primeiro trabalho exclusivamente como intérprete. Reunindo canções de Luiz Gonzaga e Cartola, o trabalho rendeu uma turnê que passou por Fortaleza no último sábado e deve virar DVD e CD ao vivo antes do fim do ano. Cercado pelos músicos Torcuato Mariano (guitarra), André Vasconcellos (baixo acústico) e Marcos Suzano (percussão), o alagoano apresenta versões contidas para Luz e Mistério (Beto Guedes/ Caetano Veloso), Valsa brasileira (Chico Buarque/ Edu Lobo) e Palco (Gilberto Gil), entre outras.

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“O Ária é um projeto antigo, pra eu mostrar minha ideia musical em função de outros autores. Pensei que fosse fácil fazer, já que eu não teria que compor. Mas não foi”, confessa o cantor por telefone. Sua dificuldade maior foi separar entre tantas lembranças as que melhor se encaixariam na sua voz. “É difícil extrair frescor de canções como Fly me to the moon (Bart Howard). Mas foi delicioso fazer esse disco”, completa.

Ainda assim o alagoano admite que não pretende voltar a fazer um trabalho apenas como intérprete. “Acho muito difícil. Principalmente agora, que eu já estou ansioso pra gravar um disco de inéditas”, o que ele adianta que acontecerá ainda em 2011. Para Djavan, compor é uma necessidade física e até acredita que lhe falta “uma manha” para se dedicar somente a interpretar. “Inéditas que é a minha onda”, confirma ele que, entre 19 discos de carreira, apenas um título é ao vivo (o álbum duplo de 1999). “O fãs até reclamaram quando eu fiz ao vivo. Por eles eu só faria autoral”, conta.

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Por isso mesmo, o show Ária também passeia por composições dos seus 35 anos de carreira. Entre elas, Transe, gravada em 1984 no álbum Lilás. Até então, Transe nunca havia sido cantada ao vivo pelo autor. “É uma música que eu já tentei colocar em vários shows, mas sempre sentia que ela não tava dentro”. Depois de muitas tentativas, ele conseguiu um “arranjo minimal” que encaixou no roteiro. “É uma música que tem um lúdico e um amor fantasioso que eu gosto muito. Mas, independente de ser boa, uma música pode funcionar ou não no show. Aqui ela não atrapalha o repertório”.

E é com o mesmo prazer de compor que ele gosta de ver outros intérpretes buscando novos caminhos entre suas canções. “É claro que musicalmente eu não gosto de tudo, mas gosto de ver minha obra sendo relida”, explica Djavan que em 1997 viu esta obra ser revisitada em três Songbooks produzidos por Almir Chediak. A coleção contou com grandes nomes, como Ed Motta, Gal Costa e Fátima Guedes. “Gostei muito da maneira densa do Chico Buarque cantando A Ilha”, destaca.

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Nessa dualidade entre o intérprete e o compositor Djavan, uma passagem é bem curiosa. Antes de lançar o primeiro disco, ele foi contratado pela Som Livre para cantar trilhas de novelas, mas não podia gravar suas composições por que eram consideradas “difíceis”. Essas primeiras gravações não entraram para a sua discografia oficial, mas acabaram reunidas numa coletânea pirata que anda rolando pela internet com o nome Primeiras gravações. “E o nome até que ficou legal”, brinca o cantor que ainda não conhecia este “lançamento”. “A gente ta vivendo um tempo em que você não tem controle. A internet é um veículo revolucionário, mas que te coloca numa insegurança total em relação a direitos”. Apesar da preocupação, ele avalia. “Menos mal que seja pirata. Pior se fosse de gravadora, sem minha autorização”.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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