Por Flávio Queiroz, sociológo, professor da UVA, autor da dissertação “Secos & Molhados: Transgressão, contravenção” e da tese “Ney Matogrosso: sentimento contramão. Transgressão e autonomia artística”
O referido grupo formado por João Ricardo (violões de 6/12 cordas, harmônica de boca e vocal), Ney Matogrosso (vocal), Gerson Conrad (violões de 6/12 cordas e vocal) e Marcelo Frias (bateria e percussão), começou seu percurso artístico com uma temporada em São Paulo no Teatro Ruth Escobar, depois seguiu para o Rio de Janeiro, onde se apresentou no Teatro Teresa Raquel, encerrando sua temporada na cidade com o show no estádio coberto do Maracanãzinho. No exterior, apresentou-se na cidade do México, tendo grande repercussão em outros países. Em agosto de 1974, foi lançado o segundo LP e logo após seu lançamento em circuito nacional se desfaz, com a saída do vocalista Ney Matogrosso, atitude posteriormente seguida por Gerson Conrad.
O grupo acontece dentro de um contexto político adverso, onde predominava uma ditadura militar em nosso país, estávamos no Governo de Emílio Garrastazu Médici. Os militares exerciam não só uma censura política, bem como uma censura de caráter eminentemente moral e o conjunto representava naquele momento um atentado a moral e aos bons costumes da época. Um homem seminu, com o rosto pintado, rebolando e cantando fino, era demais para os militares e moralistas de plantão.
O referido grupo, como nos sugere Aldous Huxley em sua obra The Doors of Perception (As portas da percepção), ajudou a abrir as nossas tão duras e rígidas portas da percepção, a fazer uma revolução individual, era como se passassem a mensagem: façam também vocês, nós estamos fazendo a nossa parte, sejam livres. Assim como nos disse o próprio vocalista do grupo Ney Matogrosso ao referir-se a sua atuação dentro do conjunto, em entrevista concedida ao Fantástico em 2003 pela Rede Globo de Televisão: “eu acho que, na verdade, nós ajudamos a clarear, a ‘desencaretar’ o Brasil”.
No entanto, passado esses 40 anos, os fãs e admiradores do conjunto ainda perguntam: “que fim levaram todas as flores”? Gerson me respondeu que certamente foram parar no jardim do Ney. João Ricardo afirmou que estão em seus jardins lindas belas e perfumadas. Saber onde elas estão não é tarefa nossa, mas sejam onde elas estiverem, continuam a romperem tabus e a inspirar novos talentos, pois a obra do grupo é atemporal, foi, é e será sempre vanguarda. Esse foi o seu maior legado: o legado da imortalidade da arte, do fazer artístico, da transgressão, da contravenção.