fabianacozzacantosagradoO dia 2 de abril de 2013 marcou os 30 anos da morte de Clara Nunes. O que falar desta mineira guerreira que encarnou como poucas as esperanças de uma nação sufocada por intransigências? No meio de tantos impostos, repressões e aperreios, ver seu sorriso na TV ou nas capas de LP era um alento, um anestésico. E com sua morte, foi embora parte dessa alegria. Entre as homenagens feitas a essa sambista de sorriso puro, uma chegou a mim há bem pouco tempo e merece ser ressaltada. Canto sagrado traz 21 faixas gravadas por Clara Nunes na voz poderosa de Fabiana Cozza. Paulistana de máximo bom gosto, a intérprete aposta em arranjos, interpretações e figurinos simples para deixar que as músicas falem por si. O acerto acontece na mesma proporção da saudade das interpretações originais.

Isso por que ninguém cantava o repertório de Clara como Clara. E aqui eu não falo somente de técnica vocal ou timbre. Elis Regina, Beth Carvalho, Gal Costa e tantas outras cantoras tinham voz igualmente bela. Mas ninguém tinha a felicidade de Clara Nunes. Bingo!! Eis seu grande trunfo e isso ninguém copia. Assim sendo, se for por possível ouvir Feira de mangaio, Ijexá e Tristeza e pé no chão sem comparações, é também possível perceber a ótima cantora/sambista que é Fabiana Cozza. Seu único pecado está em não permitir que um trabalho independente, como é este Canto sagrado, fuja de determinadas formatações da indústria musical moderna. Por exemplo, como seria melhor ela cercada bem próxima dos seus músicos, como uma autêntica roda de samba. A distância dá aquele ar de diva, já tão repetido em tantos DVDs.

Canto sagrado traz juntos o CD e o DVD, o que é ótimo. Neste segundo, se encontra o pulo do gato do projeto. Sem uma grande produção, Fabiana Cozza foi até a cidade natal de Clara, a interiorana Caetanópolis, em busca de algo mais – a alma de Clara, talvez. E o melhor é que ela acha. Conversando com pessoas que conheceram de perto a intérprete de Portela na avenida, ela traz a público histórias que estavam guardadas no interior mineiro. Há ainda outros depoimentos feitos por Elza Soares, Adelzon Alves e Wilson Moreira. Tudo para mostrar que, sim, o canto de Clara Nunes ainda é sagrado.

Veja as faixas de Canto sagrado:

1. Senhora das Candeias
2. Tristeza pé no chão
3. Guerreira
4. Minha missão
5. Deixa clarear
6. Linha do mar
7. O mar serenou
8. Meu sapato já furou
9. Bafo de boca
10. Novo amor
11. Lama
12. Pau de arara
13. Feira de mangaio
14. Congada
15. Ijexá
16. A deusa dos Orixás
17. Canto das três raças
18. Candongueiro
19. Portela na avenida
20. Conto de areia
21. Juízo final

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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