E é fugir do comum o que mais o carioca se esforça para fazer em seu primeiro registro visual ao vivo. Apesar do modelo de DVD ao vivo já estar para lá de cansado, Macalé tem peso histórico para fazer qualquer trabalho com seu nome algo de muita relevância. Assim, ele se reveza entre números solo, rocks da banda Let’s Play That e participações especiais que adornam o trabalho gravado no Theatro São Pedro de Porto Alegre, em 30 de abril de 2014. A propósito, foi nesse mesmo palco que ele se apresentou pela primeiro fora do Rio de Janeiro, como integrante do espetáculo Opinião. Isso há exatos 50 anos.
Como a presença de convidados é quase obrigatória em projetos do gênero, a primeira a subir no palco é Thaís Gulin. Com suas belas pernas à mostra, a sra. Buarque de Hollanda começa os trabalhos com o blues Hotel das estrelas. O rosto apático e os movimentos presos, fazem a intérprete soar como não mais que um cover mal-acabado de Gal Costa. Melhor ela se sai em Revendo amigos, mas também fica devendo.
O onipresente Zeca Baleiro vem em seguida para reprisar sua mistura de Vapor barato com À flor da pele, quase 20 anos depois de chamar atenção no Acústico MTV de Gal Costa. Somente com os violões, ele e Jards levam esse clássico absoluto dos porra-loucas para um ambiente doméstico, frágil e cheio de improvisos. Depois, eles relembram o hilário dueto de Na subida do morro, do essencial Moreira da Silva, lançado em 2001 no álbum Macalé Canta Moreira. A pisada na bola fica com uma releitura suingada e fora do tom de Mal secreto, também com o maranhense nos vocais.
Encerrando a lista de convidados, Luiz Melodia parece não cansar de deixar claro que é o melhor intérprete vivo do Brasil. Maduro e personalíssimo, o Negro Gato enche de brilho o samba-canção Decisão, o reggae Negra melodia e o rock Farrapo humano. Nesta última, Jards se limita a assistir a performance do amigo maldito.
Quando está sozinho no palco, Macalé aproveita para contar histórias, como a que fez Gothan City ir parar no Festival Internacional da Canção de 1969. Como se quisesse parecer um velho mestre do blues, algo entre Muddy Waters e Arrigo Barnabé, ele interpreta a canção de forma triste e pede vaias à plateia, para relembrar o resultado do tal festival. Em resposta, ele ainda joga bananas para o público. Por falar em tristonha, a inacreditavelmente bela A dona do castelo chega ao fundo da sua melancolia numa leitura de voz (trôpega), piano e trompete.
O encerramento de Jards Macalé ao vivo se dá com Canalha, de Walter Franco. Furioso e performático, Macalé parece aproveitar a chance para devolver todas as críticas e todo o desprezo que boa parte do País dedicou à sua obra. Obra essa, que está sempre pronta para ser redescoberta. Genial, no mínimo.