Em 2017, Maria Rita observou que tinha muito o que comemorar. Estava completando quatro décadas de vida (em 9 de setembro). Completou ainda 10 anos do disco Samba Meu, quando deu uma guinada na carreira em direção ao pandeiro e tamborim, e foi muito bem recebida pelo público. Agora em 2018, ela ainda celebra 15 anos de carreira na música. Pra comemorar isso tudo, montou um show para ser lançado em DVD, projeto que acabou sendo abortado por conta de problemas técnicos.

“Foi um baque mergulhar num projeto de meses e não dar em lugar nenhum. Esse processo começou em abril, maio do ano passado. Quando decidi não lançar, foi um luto. Depois de um tempo, achei que tinha que pular esse capítulo e superar”, conta, por telefone, a cantora que lança agora o fruto dessa superação. Amor e Música tem produção da própria Maria Rita dividida com Pretinho da Serrinha. Entre as 12 faixas, composições inéditas do sogro Moraes Moreira, do marido Davi Moraes e do parceiro de longa data Marcelo. Tem ainda inédita do baiano Batatinha e uma homenagem a Arlindo Cruz, primeiro incentivador dela nessa imersão no samba.

E não tem mistério no samba de Maria Rita. “Quando a batucada incendeia. A melodia envolve a alma. Seduz e acalma. É luz que clareia”, confirma a cantora que, sem deixar de lado a sofisticação de um arranjo bem feito, vem desde Samba Meu (2007) fazendo samba pra cantar junto, dançar e tomar cerveja. Desde o toque de uma caixa de fósforo até as rimas fáceis de acompanhar, ela faz questão de deixar claro que hoje se sente em casa nesse departamento. “O Samba Meu tinha uma função dificílima, quase ingrata, de mostrar que minha relação com o samba não era um amor de verão. Vinha de um entendimento de uma cultura. Tinha essa necessidade de mostrar que estava entrando no samba ‘deles’. Não era trazer o samba deles para a Maria Rita. Já o Coração a Batucar (2014) chega calcado numa sonoridade ousada, com guitarra, baixo elétrico, algo muito usado nos anos 1970. Agora eu queria uma sonoridade mais orgânica, por isso trouxe o elemento do sopro”, traça passo a passo a intérprete que, no meio do caminho, lançou também um registro ao vivo gravado na Lapa, tradicional reduto do samba carioca.

E se Amor e Música traz um novo mergulho no samba, ele também busca apresentar um novo entendimento de Maria Rita com a música. Feliz ao se ver cercada de batuques e cavaquinhos, ela está longe da estética “MPB clássica” que marcou seus primeiros discos. “Não tenho birra com a MPB. É o samba que chegou de outra forma. Passa por um entendimento meu enquanto cantora. Sempre tive o discurso de ser operária da música. Sempre servi à música enquanto canção, enquanto entidade. No correr da turnê Redescobrir, eu vim a entender que a música também tem que me servir. No samba eu percebo isso. Nas letras, na melodia, no desafio de ser um ritmo alegre cantando as mazelas, é quando me sinto uma cantora maior, me sinto mais relevante”.

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E nessa troca entre cantora e música, Maria Rita ficou feliz de ver a recepção que o público teve com o nome do seu novo disco. “Quando o nome do disco foi divulgado, recebi uma avalanche de pessoas falando que o mundo precisa é de mais amor e mais música. Acabei captando uma mensagem nacional”, lembra ela concordando com as mensagens. Mesmo sem apontar culpados e inocentes, Maria Rita acredita que Amor e Música acabou contribuindo com sua mensagem política. “Como não? Ele fala de esperança, união, amor, de fé. Os tempos estão estranhos. Está muito difícil ter esperança. É uma humilhação a cada dia. Eu tenho a sensação de estar cantando pra mim mesma. Sem perceber, eu acabei cantando coisas que eu precisava ouvir. Coisas que precisava botar pra fora”.

Receita de samba:
Quando decidiu cair no samba, Maria Rita captou o que havia de relevante em sua época e montou a própria batucada. Veja alguns desses elementos:

Roberta Sá – A potiguar surgiu na época em que o ritmo voltava a atrair a juventude. A cena de músicos e intérpretes foi renovada também por nomes como Teresa Cristina e Casuarina. Maria Rita se inseriu nesse cenário e o mercado gostou principalmente porque eram artistas que atraiam diferentes gerações.

Arlindo Cruz – elite do Cacique de Ramos, ex-Fundo de Quintal, Arlindo sabe como poucos de sua geração variar da erudição de Cartola à malandragem de Zeca Pagodinho. Maria Rita viu a versatilidade do carioca e pescou seis faixas dele para Samba Meu.

Mart’nália – Filha do mestre Martinho da Vila, Mart’nália faz samba pop e sofisticado. Atenta aos detalhes sonoros, sabe soar comportada em estúdio e brejeira no palco. O samba de Maria Rita segue na mesma linha, do popular com erudição. Tradicional na embalagem, mas moderno na intenção.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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