Fotos: Guilherme Silva

O Cineteatro São Luiz recebeu neste último domingo, 26, um espetáculo difícil de definir com palavras. O som era afinado, o local lindo, o público empolgado, músicas de sucesso… Posso tentar alguns termos técnicos, algumas frases de efeito, argumentos mais rebuscados e tentar simular um entendimento de técnica musical (que nem tenho) pra falar do que foi ver a banda A Cor do Som ao vivo.

Nada disso seria suficiente. O encontro daqueles cinco garotos que fizeram história na virada das 1970 para os 80 servia a outro propósito, que não só curtir um som bacana feito por uma turma de experientes instrumentistas. O que se viu ali era mágica pura, em seu estado bruto, um festival notas musicais que pareciam pular pela plateia como se tivessem vida própria. E talvez tivessem pulando mesmo, já que uma felicidade pareceu tomar conta da casa que ficou lotada para receber o quinteto que celebrava 40 anos de estrada.

Ary Dias fazendo seu ofício com vontade

Pra quem não conhece, a banda A Cor do Som nasceu de uma costela retirada do corpo dos Novos Baianos. Daquela célula mater, eles herdaram o clima solto, a vontade de soar brasileiros e felizes, e a virtuose moldada num som pop e solar. O instrumental coeso, que mistura uma infinidade de ritmos, ganhou ares radiofônicos sem deixar a peteca da qualidade cair. Sim, eles se tornaram radiofônicos, tocaram a exaustão sem se render às fórmulas mais fáceis. Não é errado dizer que o Roupa Nova é uma versão mais popular do A Cor do Som, desde que se reconheça que a lendária banda das trilhas de novela é formada por músicos competentes que têm um repertório bem mais ricos do que o que se conhece de AMs e FMs.

E foi nessa toada que o A Cor Do Som encantou uma plateia ao som de Menino Deus, Ticaricuriquêto, Semente do Amor, Abri a Porta e tantas outras. Armandinho, o frontleader, é um Jimi Hendrix misturado com Jacob do Bandolim, que foi do frevo ao Michael Jackson na sua guitarra baiana e não negou uma foto a quem pediu. Dadi, o Leãozinho do Caetano, é uma instituição da MPB, tão discreto quanto competente no baixo. Mu Carvalho mantém a mesma voz de garoto e parecia impressionado com a receptividade do público. Ary Dias deu show de percussão, teve seu momento solo e entregou à plateia o que ela queria. E Gustavo Schroeter segurou a bateria sem avisar se o que estava tocando era samba, rock ou sei lá o que. E nem precisava avisar nada já que todos estavam com ele para o que desse e viesse.

Dadi Carvalho num duelo amigável com Armandinho (de chapéu)

As músicas que tinham letra foram cantadas junto pela plateia sorridente e encantada. O que não tinha era acompanhado em palmas e olhares atentos. Uma característica muito particular do A Cor do Som é que, os mesmos caras que tocaram juntos no Festival de Jazz de Montreux quase 40 anos atrás ainda se mantém jovens, juntos, próximos, íntimos musicalmente. E isso faz toda a diferença num show sem afetações, estrelismos ou briga por espaço.

Quase no fim do show, Armandinho puxa uma homenagem para o letrista cearense Fausto Nilo, que tentava se manter discreto lá no fundo do teatro. Não conseguiu e teve que receber uma sonora e fervorosa salva de palmas do público que fez questão de dar as costas para a banda um instante e celebrar aquele ilustre convidado. Foi a deixa para entrar Zanzibar, um dos sucessos arrasa-quarteirão da banda.

Mú Carvalho nos teclados

Quase no fim do show, fui até o camarim tietar os caras. Não tenho esse costume (todos dizem isso), mas eles compuseram boa parte da trilha sonora da minha vida e eu jamais perderia essa chance. Puxar um papo de menos de cinco minutos com Dadi Carvalho foi algo indescritível e tive que dizer do quanto aquele reencontro foi especial. “Foi manero, né?”, respondeu simpático com uma gíria de quem não deixa o tempo passar. O próximo foi Mú, que saiu do palco com os olhos arregalados e tão empolgado quanto eu. “Posso tirar uma foto?”, pedi, acanhado, licença ao tecladista. “Lógico”, respondeu de boa. Um por um, uma alegria, uma simplicidade, uma simpatia e uma satisfação. De minha parte, a alegria em ter como ídolos caras como eles, competentes e respeitosos com tudo que rodeia a música. Sim, Dadi, foi muito manero.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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