Não existe coisa mais chata que fã fervoroso de um artista ou banda. Geralmente consideram o seu ídolo um ser superior, dotado de super poderes e, no caso de ser uma banda, que tocam muito bem seus respectivos instrumentos.

São também ávidos colecionadores, e compram qualquer coisa relacionada – a décima reedição de um disco com uma mixagem que finalmente revela um piano desafinado que o produtor não deixou entrar na versão final, bootlegs (edições piratas) de um show quando a banda ou cantor não estavam num dia inspirado, mas alguém gravou numa fita cassete com o barulho da plateia e até de um avião passando na hora, a jaqueta que foi usada em um clipe e que custou milhões no Ebay… Enfim, é um mercado que as gravadoras e empresas correlatas exploram com muito sucesso comercial.

Eu comentei isso para falar do lançamento, agora em 9 de outubro, do Paranoid: Super Deluxe Edition, comemorativo dos 50 anos do segundo disco da banda Black Sabbath. O projeto inclui o álbum original, além de um raro quad mix de 1974, dois shows de 1970, em Montreux e Bruxelas, que foram gravados em vinil pela primeira vez. O conjunto de cinco LPs vem com um livro de capa dura, com extensas notas de apresentação, entrevistas com todos os quatro membros da banda, fotos raras e recordações, um pôster, além de uma réplica do livro vendido durante a turnê Paranoid.

Esse disco marca a entrada dos rapazes de Birmigham na Billboard, onde atingiram o quarto lugar por vários meses com a faixa título, consolidando o estilo que viria a ser o rock pesado no Brasil e heavy metal na gringa. O estilo tinha caráter inovador e se caracterizava por guitarras e baixos distorcidos, voz aguda, bateria visceral, andamentos (velocidade da música) de lento a moderado e letras com temáticas satânicas, de magia negra e ocultismo.

O disco Paranoid foi lançado em 1970 e traz três das músicas mais famosas do grupo: a faixa título, Iron Man e War Pigs. Na verdade o disco todo pode ser considerado um clássico do gênero. A faixa Planet Caravan, que tem uma pegada meio latina, foi regravada pela banda Pantera em 1994. Merecem destaque Fairies Wear Boots, com sua longa introdução e ótimas intervenções instrumentais de todos, especialmente do guitarrista Tony Iommi e do batera Bill Ward; Hand of Doom, que começa com um clima meio macabro do baixo de Geezer Butler, também letrista da banda, passa por várias partes diferentes e utiliza a dinâmica (mudança de volume na música), artifício quase inexistente no rock; a instrumental Rat Salad, mostra a técnica do baterista e pode ser colocada no mesmo nível de Moby Dick, do Led Zeppelin.

A mais fraca do disco é Electric Funeral, mas inaugura um clichê do gênero onde o cantor segue o riff (frase musical repetitiva) da guitarra e baixo.

Ainda sobre essa reedição, temos o álbum original, um segundo com uma quad mix (muito famoso nos anos 1970 entre audiófilos era um precursor do  Home theather). Os três últimos LPs da coleção trazem duas apresentações ao vivo em 1970. A primeira foi gravada em 31 de agosto em Montreux, na Suíça, pouco antes do lançamento do Paranoid. A banda apresenta novas músicas como Hand Of Doom e Iron Man, além de N.I.B. e Behind The Wall Of Sleep do álbum de estreia. O segundo show foi gravado depois, em Bruxelas, numa apresentação da banda na TV belga.

Conheci o Black Sabbath com 12 anos de idade e, juntando as economias com meu amigo Henrique Gurgel, fomos à loja Tok Discos do Centro e compramos a coleção inteira da banda, que na época ia até o disco Sabotage, de 1975O que a gente mais curtia na época era fazer medo aos amigos mais jovens colocando as músicas do Sabbath pra tocar e apagando a luz para criar um clima macabro que fazia os meninos correrem para suas casas e contar aos pais que depois os proibiam de andar com a gente.

Ontem vi um depoimento comovente do guitarrista Tony Iommi que, mesmo tendo as falanges dos dedos da mão decepadas numa máquina quando jovem, conseguiu com ajuda de dedeiras de couro se superar e criar um estilo até hoje imitado. Ele falava do guitar hero Eddie Van Halen outro gênio que perdeu uma batalha para um câncer nesta terça, 6, e que deixa um legião de fãs e seguidores. Mas isso é assunto para uma próxima coluna.

R.I.P. Eddie.

Mimi Rocha é músico e produtor. Ele escreve nesse espaço quinzenalmente

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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