O monge beneditino Guido D’Arezzo

Na Antiguidade, ouvir música era um ato presencial. Você estava ao lado de alguém batendo um tambor, tocando uma flauta de pan, uma lira ou algum instrumento de corda rudimentar. Em seguida vieram os saraus nas cortes e a música sacra que se iniciava com o cantochão nas igrejas, mas ainda assim era o caso de ouvir aquela performance única ao vivo e a cores. Então, como perpetuar a sua obra-prima que era acessível só àqueles sortudos que estavam presentes ali na hora da execução? Entra em campo a Notação Musical.

O primeiro fragmento de um melodia escrita foi achado na hoje Síria e data de 43.000 anos atrás. Foi um hino sumério escrito numa tábua de argila, “Hurrian hino n.6”. Mas a primeira composição a sobreviver inteira é uma canção grega do primeiro século antes de Cristo. “Seikilos Epitaph” foi achada numa lápide de mármore como uma homenagem a uma mulher falecida.

A notação musical primitiva se desenvolveu paralelamente no Oriente, império Bizantino e Grécia antiga. Mas só atingiu a maioridade com o monge beneditino Guido D’Arezzo que viveu entre 991 e 1033 e criou o sistema de Solmização baseado num hino de São João, usando o começo das sílabas pra chegar no nosso “Dó, ré, mi…”

Ut queant lax (Ut virou o Dó)

Resonare fibris

Mira gestorum

Famuli tuorum

Solve polluti

Labii reatum

Sancte Iohannes.

Esse sistema se desenvolveu exponencialmente no período barroco com compositores como Johann Sebastian Bach e Vivaldi, e até hoje é usado com algumas atualizações através dos períodos musicais. Quem domina a linguagem é capaz de reproduzir fielmente a intenção de quem compôs a música em questão.

Com a chegada da eletricidade na revolução industrial, Thomaz Edison inventou o fonógrafo que logo foi sucedido pelo gramofone, inventado em 1887 por Emile Berliner e que tinha a vantagem de ter as primeiras gravações em discos de cera.

Em 1948 foi gravado o primeiro disco de vinil que tinha capacidade de tocar mais tempo, por isso o nome Long Play que viraria o LP. A Columbia relançou nesse formato o disco The voice of Sinatra de 1946 e alguns títulos do catálogo de música clássica. Foi um sucesso estrondoso e aí começou a portabilidade da música, pois foram lançados mini vitrolas que pareciam uma pequena maleta e eram usadas em piquenique ou viagens.

Outros formatos também foram surgindo, a fita de rolo (que tem alta qualidade), a fita cassete (que sempre foi um transtorno por enrolar fácil e perder a qualidade rapidamente). Quem não lembra do toca-fita TKR cara preta para carro que sempre sujava o cabeçote e deixava o som abafado?

Com o barateamento dos chips de computador, surge em 1982 o Compact Disc (CD), prometendo som de alta fidelidade com zero ruído e a vantagem de não arranhar, como o LP, nem enroscar, como o cassete. Foi um sucesso e até pelo menor tamanho, fácil de carregar, o já conhecido Walkman, que fazia sucesso nas academias dos anos 1980, vira o Diskman (aparelho portátil com headphones ) e a música fica cada vez mais presente no cotidiano das pessoas.

Com a chegada da internet, dos CD Rom e dos computadores pessoais mais acessíveis, surge o formato que mudaria pra sempre a forma de ouvir e  comercializar música: o famigerado MP3, que foi padronizado em 1997 e com ele a febre da “baixaria”, compartilhamento (ou baixar) de arquivos por internet.

Surgem o Napster, Limewire e outros que tornam a música gratuita. Você podia baixar tudo, o que era bom para o consumidor, que jamais teria acesso a tanto disco, e ruim para os artistas, principalmente os compositores. Mais aí é assunto pra outra coluna…

Em 2001 Steve Jobs apresenta o IPod, o primeiro tocador de MP3 descomplicado, e com isso mudou a história da música de novo com o iTunes, loja virtual onde você comprava o seu MP3 e fazia a sua playlist (lista de músicas). Por volta de 2007, surgem os serviços de streaming (assinatura para ter acesso a conteúdo musical), como os já populares Deezer, Spotify e Apple Music dominando o mercado e trazendo pro seu, agora já popular, smartphone todo o conteúdo musical disponível das gravadoras que tiveram que embarcar nessa canoa.

Agora com seu celular de 256 Gb de memória, você vai ter música disponível que nem reencarnando 10 vezes você seria capaz de ouvir. Analisando os prós e contras de cada sistema, eu considero o LP ou vinil como o melhor formato quando se quer qualidade total sonora, aliado a conseguir ler as informações nas capas – o que no CD já era quase impossível. O contra é que dá trabalho, hoje é caro e requer uma manutenção e espaço pra guardar. O CD tem a vantagem de não ter chiado ser menor e fica em 2ª no quesito qualidade.

O Ipod – que está com os dias contados pois cada iPhone é um iPod – pra mim é bastante pratico e portátil, e você  pode colocar a sua coleção de MP3, copiar seus CDs pra ele etc… Agora, no quesito praticidade e disponibilidade, os serviços de streaming são imbatíveis e tem preço convidativo, apesar dos audiófilos torcerem o nariz alegando que o som é comprimido não tem tanta qualidade quanto o LP ou CD. Alguns serviços como o Tidal oferecem assinaturas premium com alta qualidade e conteúdos especiais pra essa turma mais exigente. O bom disso tudo é que a música continua sendo a arte mais acessível e portátil de todas.

Boa escuta então!

Mimi Rocha é músico e produtor. Ele escreve nesse espaço quinzenalmente

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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