As plataformas de streaming Spotify e Deezer lançaram esta semana o ranking das músicas, discos e artistas mais ouvidos em 2020. As listas são praticamente iguais, dando o pódio de artista mais ouvida no Brasil a Marília Mendonça, cantora ligada ao universo sertanejo. Henrique e Juliano, o cantor Gusttavo Lima, e a dupla Zé Neto e Cristiano ocupam, em ordem, os segundos, terceiros e quartos lugares nas duas listas.

Os Barões da Pisadinha, Jorge e Mateus, Anitta e Matheus e Kauan também comparecem entre os 10 mais ouvidos das duas plataformas, mas em posições diferentes. Sobram como novidade Wesley Safadão (8º) e Dilsinho (10º) presentes apenas no Deezer, e Alok (9º) e Maiara e Maraísa (10º), presentes só no Spotify. A lista de músicas e discos mais ouvidos do ano são trabalhos desses mesmos nomes, salvo algumas exceções que orbitam o mesmo universo musical dos 10 primeiros lugares.

Se antes as listas das mais tocadas geravam polêmica e não deveriam guiar por si só o gosto de ninguém, agora não é diferente. O que as listas divulgadas esta semana revelam de fato é o sucesso de uma estratégia bem sucedida de marketing que inclui altíssimos investimentos. Por exemplo, todos os artistas que estão presentes nas duas listas possuem milhões de seguidores nas redes sociais e trabalham muito bem seus conteúdos nesses espaços. A proximidade entre artista e público trazida por esses conteúdos não tem preço, mas tem excelentes retornos. E, como sabemos, seguidores não surgem do nada: impulsionando inteligentemente, o retorno é garantido.

Dá uma vontade danada de levantar uma questão de gosto a partir dos mais ouvidos do Spotify e do Deezer, mas essa seria uma verdadeira bobagem. A música pop, seja ela sertaneja, eletrônica ou funk, serve para isso: para atrair grandes públicos. Sua mensagem é simples, não tem arrodeios e a identificação é imediata. Mas essa história tem um outro lado: esse sucesso é efêmero, tem vida curta. É natureza dos artistas ligados aos estilos mais populares que tenham um sucesso imenso, atraiam muitos olhares, ganhem muito dinheiro, e depois passem a requentar esse momento de glória. O mercado não espera que eles se reinventem, tentem coisas novas ou se desafiem. A regra é repetir a fórmula até que ela se desgaste e uma nova moda venha. E ela acaba vindo, de um jeito ou de outro.

As próprias plataformas digitais ajudam a formatar essas listas. O forte desses artistas celebrados entre os mais ouvidos são os singles, ou seja um música lançada independente de um disco inteiro, de um conceito, unidade ou coerência. Ela chega e, se faz sucesso, será tocada à exaustão. Se não, não tem problema, logo virá outra e aquela anterior fica ali encostada pra quem quiser dar atenção. Não há intensão de planejar uma carreira a partir de ideias, mas de gráficos que, quando não apontam pra cima, precisam de uma injeção de ânimo (“feats”, falsas polêmicas, notícias banais, revelações pouco reveladoras, etc.).

Todas as épocas tiveram seus hábitos, suas listas, seus sucessos, seus erros e seus acertos. Se é um absurdo não ter nem um nome ligado ao rock ou à MPB nessas listas? De forma nenhuma. É previsível. O grande mercado nacional da música trabalha de forma predatória: só interessa o que rende bons números; e o que não rende que lute por si. Desde que o antigo modelo das gravadoras afundou, assumiu-se um novo onde impera o retorno imediato e a imediata reposição de peças. Nada de planejar uma carreira a longo prazo. Não é à toa que os mesmos nomes das duas listas estão diuturnamente nos programas de maior audiência na TV, e ali estarão enquanto garantirem audiência. Nem um dia a mais…

E, como dito antes, existe muito investimento por trás desses artistas. E o retorno que eles precisam dar a esse investimento não é da ordem do artístico, do poético, do musical. É, sim, do numérico, do cifrão. Não é por acaso que uma comitiva de sertanejos foi levar pessoalmente ao presidente Jair Bolsonaro um pauta comum dessa parcela da classe: o fim da meia entrada. “Não pode o Estado brasileiro intervir na economia e tomar 50% da receita de alguns setores sem compensação. Nós precisamos corrigir essa injustiça histórica”, defendeu Doreni Caramori, representante da Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), que acompanhou a comitiva que incluía algumas das estrelas em anos passados nas principais plataformas de streaming. A preocupação ali não era com o público, a plateia, mas com o investidor.

Fato é que são apenas listas. Elas não apontam o que é bom, o que é ruim, nem servem por si só para definir “a que ponto chegamos”. Chegamos, na verdade, no mesmo ponto de sempre: muito espaço para quem tem muito espaço, pouco espaço para quem tem pouco espaço e quase ninguém disposto a apostar na inversão dessa lógica. Mas há esperança: nos mesmos aplicativos que divulgaram essas listas (e nos outros também) você ouvir Stevie Wonder, Caetano Veloso, Glen Miller, Beethoven, BTS, Leci Brandão, Péricles, Luiz Melodia, Chitãozinho e Chororó, Laura Pausini, Gipsy Kings, Yo-Yo Ma, Romero Lubambo…

Deezer

Artistas mais ouvidos
1. Marília Mendonça
2. Henrique e Juliano
3. Gusttavo Lima
4. Zé Neto e Cristiano
5. Os Barões da Pisadinha
6. Anitta
7. Jorge e Mateus
8. Wesley Safadão
9. Matheus e Kauan
10. Dilsinho

Músicas mais ouvidas
1. Liberdade Provisória, Henrique e Juliano
2. Dance Monkey, Tones and I
3. Graveto, Marília Mendonça
4. A Gente Fez Amor, Gusttavo Lima
5. S de Saudade, Luíza & Maurílio, Zé Neto & Cristiano
6. Com Ou Sem Mim, Gustavo Mioto
7. Cheirosa, Jorge e Mateus
8. Don’t Start Now, Dua Lipa
9. Barzinho Aleatório, Zé Neto e Cristiano
10. Sentadão, Pedro Sampaio

Álbuns mais ouvidos
1. O Embaixador in Cariri (Ao Vivo), Gusttavo Lima
2. Todos Os Cantos, Vol. 1 (Ao Vivo), Marília Mendonça
3. Por Mais Beijos Ao Vivo (ao Vivo), Zé Neto & Cristiano
4. Churrasquinho do Menos É Mais (Ao Vivo), Grupo Menos É Mais
5. 10 Anos Na Praia, Matheus & Kauan
6. Tem Moda Pra Tudo, Matheus & Kauan
7. Batom de Ouro, Os Barões Da Pisadinha
8. O Embaixador (ao Vivo), Gusttavo Lima
9. Agora Eu Pego Mesmo, Os Barões Da Pisadinha
10. Chão de Estrelas, Ferrugem

Spotify
Artistas mais ouvidos
1. Marília Mendonça
2. Henrique & Juliano
3. Gusttavo Lima
4. Zé Neto & Cristiano
5. Jorge & Mateus
6. Os Barões Da Pisadinha
7. Anitta
8. Matheus & Kauan
9. Alok
10. Maiara & Maraisa

Músicas mais ouvidas
1. Liberdade Provisória, Henrique & Juliano
2. A Gente Fez Amor (Ao Vivo), Gusttavo Lima
3. Graveto (Ao Vivo), Marília Mendonça
4. Volta por Baixo (Ao Vivo), Henrique & Juliano
5. S de Saudade, Luíza & Maurílio, Zé Neto & Cristiano
6. Litrão (Ao Vivo), Matheus & Kauan
7. Barzinho Aleatório (Ao Vivo), Zé Neto & Cristiano
8. Don’t Start Now, Dua Lipa
9. Cheirosa (Ao Vivo), Jorge & Mateus
10. Sentadão, Felipe Original, JS o Mão de Ouro, Pedro Sampaio

Álbuns mais ouvidos
1. O Embaixador in Cariri (Ao Vivo), Gusttavo Lima
2. Por Mais Beijos Ao Vivo (ao Vivo), Zé Neto & Cristiano
3. 10 Anos Na Praia, Matheus & Kauan
4. Future Nostalgia, Dua Lipa
5. Todos Os Cantos, Vol. 1 (Ao Vivo), Marília Mendonça
6. Agora Eu Pego Mesmo, Os Barões Da Pisadinha
7. Batom de Ouro, Os Barões Da Pisadinha
8. Melim, Melim
9. Viva (Ao Vivo), Luan Santana
10. Celebridade, Orochi

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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