Djavan reúne Zeca Pagodinho, Milton Nascimento e filhos em novo disco

Em 1982, Djavan incluiu no léxico nacional o verbo “caetanear”, que, seguindo pistas deixadas na faixa “Sina”, significa deixar tudo melhor, mais bonito, musical. O homenageado, Caetano Veloso, ficou emocionado e regravou a faixa no mesmo ano, substituindo o verbo por “djavanear”. Na época, o baiano já tinha gravado disco de bossa nova e atravessado o tropicalismo, uma temporada em Londres, experiências acústicas e chegava a uma época pop, feliz e radiofônica.

“Caetanear” talvez significasse todo esse percurso musical baseado em explorar os ritmos do mundo e filtrá-los por um olhar brasileiro. “Djavanear” se baseia nesse mesmo princípio, mas o alagoano é mais fiel ao seu modo de fazer música. Funk, jazz, pop e samba é onde estão as raízes de Djavan, dono de umas das fórmulas de composição mais bem-sucedidas da MPB. Esse modo de fazer música segue presente em D, 21º disco de inéditas em 46 anos de carreira.

Seguindo o modelo pessoal e metódico, o álbum é dirigido, produzido, tocado e arranjado por Djavan. Habituado a lançar discos a cada dois ou três anos no máximo, esse levou quatro para ficar pronto, mas com uma pandemia no meio, o que altera a percepção desse tempo. “Isso é uma coisa quase biológica. Componho quando preciso, e preciso, invariavelmente, no período de dois a três anos. Antes era de dois em dois anos rigorosamente. Preciso compor pra me manter saudável”, explica ele.

Por telefone, ele conta que costuma fazer esse exercício de uma vez. “Sento e faço um disco inteiro. Não tenho grandes dificuldades em compor, difícil é começar. Mas, quando me disponho a compor e trabalhar, entro numa reclusão forte. Para entrar numa introspecção, para buscar as coisas onde elas estão. É um movimento inerente ao trabalho”, descreve o músico de 73 anos, que começou a criar as canções de D em junho de 2021 e encerrou no começo deste ano.

O resultado dessa imersão são 12 canções que trazem tudo aquilo que o fã de Djavan espera. São baladas de amor, sons funkeados, composições de alma pop e radiofônica, um toque de brasilidade aqui, uma influência jazz ali e a voz inconfundível, que se mantém firme. “Ainda não precisei ajustar para tons mais baixos. Faço exercícios para manter essa voz. Parar de fumar, por exemplo, foi uma decisão”, conta Djavan, que  reuniu músicos com quem já trabalha há um tempo para acompanhá-lo no novo repertório. Gente como Carlos Bala (bateria), Paulo Calasans (teclado), Marcelo Mariano (baixo) e Marcelo Martins (sopros).

Entre as novidades de D, tem a primeira parceria de Djavan com Zeca Pagodinho. Como esperado do parceiro, Eh! Eh! é um samba guiado pelo violão do alagoano e com versos como “Assim está meu coração, atolado em lodo e lama, soterrado nesse drama, mas respirando a esperança”. Outra presença é Milton Nascimento, que canta na faixa Beleza destruída, que lamenta o descaso com a natureza. Milton é um velho conhecido de Djavan e foi uma de suas inspirações no início da carreira como crooner. No entanto, essa é a primeira vez que eles se encontram numa canção.

Além da questão do meio ambiente, Djavan critica os tempos de polarização, discordâncias e desmandos em Cabeça Vazia. “Quero demonstrar o quanto existem pessoas comandadas por pessoas vazias, sem lógica. De certo modo, é uma canção política”, explica ele, que também celebra sua ancestralidade musical — “negra, moura e brasileira” — em Sevilhando.

Soando mais sorridente do que em discos anteriores, Djavan convidou a família para cantar e tocar Iluminado, em clima quase informal. “Fiz um tema falando de otimismo, felicidade, e quis fazer isso com a minha família”, conta sobre a faixa que encerra o disco. E só o disco, porque é muito provável que daqui a dois ou três anos Djavan volte com novas canções. Encerrar a carreira é algo que não está nos seus planos. “Não, não pretendo parar não. Me mantenho com o mesmo objetivo”.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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