Leci Brandão faz show nesta quinta, 8, no Cineteatro São Luiz (Foto: Carlos Torres/ Divulgação)

Leci Brandão representa o Brasil de muitas formas, até no sobrenome de batismo – “da Silva”. Mulher negra, carioca de Madureira, ela vem de origem humilde e atravessou muitos mares até de formar em Direito. Entre as aulas e o trabalho para se sustentar, ela compunha, participava de programas de TV e festivais, cantava onde podia e buscou uma vaga na ala de compositores da Mangueira. Eram 40 homens pra dizer sim ou não para seu trabalho, mas ela entrou – a primeira mulher a conquistar esse espaço. Sabendo bem que sua história era a história de muitos, ela levou para a música relatos de violência, preconceito, racismo e mensagens de força para superar isso tudo.

Essa vida de luta é o que Leci Brandão mostra nesta quinta-feira, 8, no Cineteatro São Luiz. Em única apresentação, ela canta sucessos de mais de 40 anos de música. “Há muitos anos não canto no Ceará. Canto em Alagoas, Pernambuco, Rio Grande do Norte, mas aqui não tive muita oportunidade”, comenta a cantora e compositora, adiantando que fará um show “normal”. “Não é nenhum show diferente, não tem nada demais. Gosto de cantar músicas que me fazem bem. Claro que vou mais para o lado do samba, mas quem é do samba canta toda música que gosta”, completa.

Há 12 anos, Leci divide o trabalho de compositora com a agenda na Assembleia Legislativa de São Paulo. Convidada para se filiar ao Partido Comunista do Brasil, ela foi eleita em 2022 para o quarto mandato como deputada federal. “Meu gabinete chama-se ‘Quilombo da Diversidade’ e nossa agenda é muito intensa. São Paulo é uma cidade que tem muita gente reacionária, soberba, que não enxerga o pobre da maneira que deveria enxergar. Gente que tem raiva de pobre, LGBTs, comunistas, de todas as pessoas que querem um pouco mais de liberdade”, critica a parlamentar.

Embora o trabalho como deputada tenha vindo de um convite, ela lembra que sua relação com a política vem de muito tempo. “Começou uma pressão grande dos sindicatos, do movimento negro, por que eu fiz muito show em campanha de demarcação de terras indígenas, Movimento sem Terra. Já cantei por muitas lutas. Eu canto pro Lula desde que ele ainda tinha barba e cabelo preto”, brinca ela que vê na função de parlamentar uma continuidade do que já fazia na música. “A arte foi responsável pelas pessoas me conhecerem, por que da arte eu fiz minha política, sempre. Eu usei a arte pra levar assuntos que não eram aceitos. Fiquei cinco anos sem gravar por isso”.

E ela não faz pouco do que construiu: “Eu acho que sou uma pessoa necessária para a população preta por que eu levo assuntos que nunca se falaram lá dentro. Nossos projetos são todos voltados pra população preta”. E segue com um retrato do mundo que encontrou na Alesp: “O povo dificilmente tem um assento na assembleia por que é muito difícil se eleger. Nas assembleias, é todo mundo de nome, dono de cidade. É o capitão, o coronel, gente que tem suas terras, muito dinheiro e consegue construir um patrimônio politico. É difícil pro cidadão ter uma oportunidade num legislativo ou num judiciário. É muito difícil encontrar um negro lá”, aponta.

E assim, ela faz na política uma trajetória semelhante à do samba. “O samba pra mim é resistência. Por que o samba, com tudo que enfrentou, de ser proibido de cantar na rua, foi se impondo”. Leci Brandão fez o mesmo e buscou muitas formas de manter a si e à sua obra vivas, atravessando turbulências, sejam a falta de contrato com gravadoras, seja a pandemia do covid-19. “Eu tô viva, sobrevivi a todo esse momento ruim de pandemia. Muita gente se foi, muita gente ficou esquecida, muita gente ficou com sequela. Eu fiquei dois anos sem cantar, longe do plenário, mas estou voltando aos poucos. Claro que as notas estão mais baixas, não dá mais pra cantar daquele jeito (agudo). Também não estou sambando como antes. Com a pandemia estou mais enferrujada. Mas estou firme e não penso em parar, não”, adianta.

Assim como ela não pretende parar, sua luta segue viva e com esperança renovada para 2023. “Até por causa das eleições, eu tenho certeza de que as coisas vão mudar pra melhor. Eu tenho esperança, nunca desisti. O Brasil precisa mudar pra que a gente volte a ser feliz”, e segue. “Eu tô adorando a Copa do Mundo, mas não por que sou fã de futebol, do (técnico da Seleção Brasileira) Tite, do time. É por que chegou o momento em que a gente voltou a ser feliz, voltou a se abraçar. E voltou a usar verde e amarelo por causa do Brasil, e não por causa de política”.

Leci Brandão no São Luiz
Quando: quinta, 8, às 19 horas
Onde: Cineteatro São Luiz (Rua Major Facundo, 500 – Centro)
Quanto: R$60 (inteira), R$30 (meia) e R$32 (comerciários Sesc). Ingressos à venda pelo Sympla e no local

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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