Por Cristina Fontenele

Uma situação inusitada ocorreu semana passada. Eu a conversar com uma colega na faculdade quando alguém me toca nas costas, desliza pelo meu braço e finaliza com um aconchego de mão com mão. Uma desconhecida me sorriu e eu sorri de volta. Foi automático.

Poderia ser mais um daqueles episódios no qual queremos nos lembrar do nome da pessoa (quase na ponta da língua) e fingimos conhecimento, evitando o nome do fulano para não passar vergonha. “Cara, você tá ótimo!”, “Rapaz, há quanto tempo?!”, “Menina, por onde você anda?”. Vocativos em boa hora.

Esse não era o caso. De costas eu poderia parecer com alguém do convívio dela. É, as costas enganam. A pessoa era uma ilustre desconhecida da minha rede de não conhecidos. Mas não houve falta de graça, apenas olhar com olhar e naturalidade. Leveza de quem aceita o improvável da vida, que vem com ônus e bônus. Às vezes mais bônus que ônus, quando simplesmente nos deixamos levar.

A mão da desconhecida me afagou com espírito brincalhão, simples, de quem não sente vergonha de se expor, de errar, de procurar um contato. Lembro dos casos em que alguém conhecido cruza nossa rotina e preferimos não dizer olá. Dá trabalho, pode nos atrapalhar, temos preguiça. Ela não. Passou, sorriu e foi, assim como passamos, sorrimos e nos (des)encontramos diariamente.

Um cumprimento nada custoso, mostrando que podemos estar abertos ao desconhecido, sem temer o ridículo, sem sermos tão escravos da lógica. E se todos os dias falássemos com algum “estranho”? Um bom dia solto no trânsito, um olá passando pela rua, um bem vindo ao imprevisível do dia.

O desconhecido nos sorri diariamente. Sintonizemos. Há mais espaço para esta poesia da vida, que ocorre quando damos chance ao acaso. Não aquele acaso que mexe com nossa segurança (desatenção em lugares perigosos). Aquele outro, o estado de alma sem pretensão, que admira o simples e ainda se surpreende com a delicadeza.

Era véspera do meu aniversário e o desconhecido veio a mim. Me presenteou com o calor humano, tão necessário e às vezes tão raro. Por um momento, saí do automático.

Cristina Fontenele escreve todo dia 5 e 20 de cada mês

Conheça a colunista

Jornalista em formação, publicitária, especialista em Marketing e escritora por paixão. Cristina Fontenele atua também como terapeuta renascedora no Clube do Renascimento de Fortaleza. Visite o blog A Fonte.

“Acredito que a Existência é sábia e está ao nosso favor. Desejo que o fluxo da vida continue me levando para as experiências de crescimento e de amor”.

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

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