Uma noite refrescante. Ouvir o escritor gaúcho, Fabricio Carpinejar, conversar sobre como ser “feliz por pouco e transbordando por muito, como ser feliz criativamente”, nos lembra do tempo para o afeto, do abraço sentido, do contato honesto com o outro.

Carpinejar, que uniu os sobrenomes da mãe (Carpi) e do pai (Nejar) para se fazer inteiro, para aproximar os pais em seu imaginário afetivo, diz que só foi ser poeta para buscar o pai. “A poesia é uma longa carta que eu escrevi para ele”.

Ele bem alerta, “a gente só se resolve quando fica em paz com os pais”. O escritor das palavras descreve os impasses do coração e adverte que o grande problema da felicidade é que a gente sempre acha que o outro pode ser melhor do que ele realmente é. “A gente cobra do outro uma perfeição”, quando nós mesmos estamos longe disso.

A felicidade passa, portanto, pela paz com o passado, com nossas raízes, nossa história. Se olharmos bem, dá até para perceber pedacinhos de nós fincados no corpo dos sete anos, no muro da nossa casa da adolescência, nas conversas das madrugadas com amigos, nas memórias com o “ex”. Ficamos por lá?

Para ser feliz criativamente, anuncia o poeta, é preciso sair de si, do egocentrismo e observar o outro. Alimentar a curiosidade e se reinventar a cada dia em novas linguagens.

Em tempos virtuais, Carpinejar contesta a criatividade desperdiçada ao se odiar tanto o outro, “criamos todo tipo de insulto, mas no elogiar somos reticentes. Para destruir alguém usamos todas nossas reservas ideológicas”. Porém, nossa real dificuldade está em encarar os próprios defeitos, na tentativa de esconder nosso monstro interior.

“O quanto nós fazemos no dia somente para provocar?”, questiona. E o pensamento vaga por aquelas pequenas discordâncias diárias, que nem sempre deixamos passar pela irresistível vontade de ter razão, em tudo. Mas a felicidade não mora na razão. E sabiamente o poeta recorda, “com o tempo eu percebi o que é ter razão se tu pode ter amor.”

O homem que escreve para destruir janelas, de fala emotiva, ora aos gritos, ora baixinho, comove. Sensibiliza pelas frases simples, qual conselho de amigos, mas firmes como os relâmpagos rasgando o céu. Ele nos convida a falar com o coração, pois sinceridade não é reproduzir o que vem à cabeça, mas conciliar os dois tempos – o da fala e o do coração – porque o outro pode não estar preparado para ouvir o que você tem a dizer.

A fala Carpinejar nos leva a parar, a sentir, a recuperar a felicidade pelas coisas simples, a não dar nada por garantido, mas a aproveitar o tempo presente para dizer o quanto amamos. “Porque o mais difícil na vida não é se reinventar, é se assumir.”

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

View All Articles