Poderia falar sobre escrever cartas apaixonadas, poemas, mensagens, ou sobre o medo de se declarar para a outra pessoa. Quem sabe seja melhor recuar, já que pode não haver correspondência do outro lado. Não. Talvez valha a pena arriscar, a espera dói mais do que permanecer na dúvida. De repente, tudo vai ficando em segundo plano, enquanto ouço um refrão na timeline do facebook. “Ninguém vai poder querer nos dizer como amar”.

Eu, que só conhecia Johnny Hooker de nome, fiquei absorta em “Flutua”. A música foi apresentada durante o programa de entrevistas do jornalista Pedro Bial. Flutuei em pensamentos. Ouvi duas, três, quatro vezes. Ouvirei mais. A melodia lembra estranhamente tempos que não vivi, sentimentos de uma revolução, toques de nostalgia. Entre as belas frases, importa tanto o fato de “ninguém vai poder querer nos dizer como amar”.

Eu não sei o que é certo para você, o que te faz feliz, tampouco você sabe sobre mim. Mas por que insistimos em conselhos que não foram pedidos? Quantas vezes ao dia, poderíamos recolher nossa fala, nosso “eu acho”, “você deveria”, “ele tem que”, e permitir a curiosidade de assistir ao capítulo seguinte de uma vida sem roteiros. “Meu amor, seja feliz”, como dizem muitos vídeos por aí. Seja feliz, que o outro também será, tateando os caminhos dele.

Ouvindo “Flutua”, algumas cenas acabam surgindo na mente. Vejo pessoas gritando sobre o que é certo, errado, esperado, adequado, ado, ado, ado. Observo dedos de desconhecidos apontando “verdades” entre si. É uma passeata? Um protesto? Não sei ao certo, mas parecem imagens cotidianas das vidas cruzadas. A razão parece virar abelha, ora zunindo no ouvido de um, ora no ouvido de outro. Na algazarra, todos querendo ter razão, dizer como amar, mas amar da maneira “certa”, porque deve existir “a fórmula do amor”, como queria Léo Jaime.

Mas “Um novo tempo há de vencer para que a gente possa florescer, e a gente possa amar sem temer.”, alerta Hooker. Que novo tempo é esse? Eu me questiono. Parece algo ainda tão distante, quando nos perdermos em traçar uma linha reta para a vida do outro, embora a nossa seja cheia de abismos e colinas. Quando o amor, algo tão genuíno e transformador, murcha em formas de papel untadas com sangue e óleo. Amar sem temer ainda flutua, às vezes, não raro, evapora.

Por que nos incomodamos tanto com a parede do vizinho, seus brindes e dedicatórias, se podemos ser felizes com a diversidade de uma pontuação sem vírgulas? Algo estremece por dentro quando vejo o outro esbravejar certezas de Deus. Um Deus que não é meu, não é seu, é de todos. Eu permaneço sem entender o mal que há em ver o outro ser feliz, amar do próprio jeito.

Um novo tempo há de vencer, Hooker. Creio que sim. Quando? Espero que não demore. Há pressa em ser feliz. Há urgência em amar. Precisamos. O mundo pede. Os seres, também.

Por hoje, fico o tempo do meu dia pensando sobre minha forma de amar sem medo, desajeitada. Às vezes, esqueço o quanto o outro está ali por escolha e o quanto não sou imortal, apesar de o amor ainda ser.

 

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

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