Manoel é um homem-passarinho, é um poeta-gatilho, é um texto-presente, é vida-pedaço. Natural de Cuiabá, Mato Grosso, ele deixou uma das mais sólidas obras de poesia que a literatura nacional possui. Os poemas produzidos pelo “passarinho” são simples, sem floreios, sem grandes impactos. E é justamente na simplicidade que Manoel de Barros faz sua morada e equilibra seu valor estético. A Companhia das Letras publicou uma edição de Memórias Inventadas, livro que reúne as “três infâncias” do escritor.

O poeta

O poeta queria fazer um livro para cada fase da vida: infância, juventude, velhice. Ao invés disso, entretanto, produziu três volumes reunindo todas as suas infâncias. Em vida, Manoel teve apenas infâncias – ele costumava dizer. Viveu cada aventura na escola, cada pedaço da natureza, cada composição cênica do Mato Grosso. Além da reunião dos três volumes, a edição da Companhia das Letras – integrante do selo Alfaguara – tem fotografias inéditas e respostas de algumas entrevistas dadas pelo poeta ainda em vida. De onde tiro o seguinte trecho:

“Só vou por caminhos ignorados. Nunca sei o que está no fim. A primeira frase sugere as outras. Vou indo cego. Só percebo o aroma das palavras. Chego ao fim do poema com surpresa. Sou comandado pelas palavras. Não conduzo nem a mim quanto mais aos leitores. Não tenho a sina de ensinar. Para mim poesia é manifestação errática”, disse o poeta em entrevista realizada em 2003, quando aconteceu o lançamento de Memórias Inventadas. A entrevista foi feita por Fabrício Carpinejar para o jornal Zero Hora.

Devo discordar um pouco. Quando leio Manoel de Barros, eu tenho a sensação de estar sendo conduzida através das diversas paisagens que formam uma infância – a dele, a minha, a dos meus amigos. Manoel tem uma obra inteira. Como alguém que já nasceu com a poesia, ele não faz esforço para que as palavras borbulhem. Elas parecem apenas estar lá: atentas, circulando o papel, formando imagens, cativando. Esse poder do menino-Manoel está totalmente descrito em Memórias Inventadas. É um ótimo livro para quem nunca teve contato com a obra e deseja começar. É também um livro necessário nas estantes dos leitores habituais de Manoel de Barros.

Entre os prêmios recebidos por ele estão o Jabuti (1990), o ABL de Literatura Infantojuvenil (2000), o Nestlé de Literatura Brasileira (2006), o Grande Prémio Sophia de Mello Breyner Andresen (2009) e o ABL de Poesia (2012). Claro, Manoel não era homem de ficar preso a esse tipo de honraria. Escrevia para viver, escrevia para fazer viver. E, como bem nos ensinou o poeta, não são essas honrarias que nós levamos da vida.

O livro – dividido em A Infância, A Segunda Infância e A Terceira Infância – é uma obra para ler de vários formas: de um golpe só, salteando textos, lendo cada bloco em um dia. Existem várias formas de compreender – e de sentir – as proposições de Manoel de Barros. Queria eu – e aqui registro um sonho distante – que o poeta natural de Cuiabá fosse mais lido nas escolas. As juventudes precisam de Manoel de Barros.

Manoel de Barros

Para quem quer conhecer mais sobre Manoel de Barros, eu sugiro também a leitura do texto escrito pelo poeta Talles Azigon – um dos maiores conhecedores da obra de Manoel. Clique aqui e leia!

Serviço
Memórias Inventadas
Manoel de Barros
Companhia das Letras
Quanto: R$ 39,90

About the Author

Isabel Costa

Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é essa pessoa que consegue deixar o ar ao redor pleno de uma segurança incomum, mesmo com tudo desmoronando, mesmo que dentro dela o quebra-cabeças e as planilhas nunca estejam se encaixando no que deveria estar. É repórter de cultura, formada em Letras pela UFC e possui especialização em Literatura e Semiótica pela Uece. Formadora de Língua Portuguesa da Secretaria da Educação, Cultura, Desporto e Juventude de Cascavel, Ceará.

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