Por Vitória Régia*

Ilustração de Glauco Sobreira para o texto de Vitória Régia

“Por algum motivo fui parida incólume, entre escorpiões e chuva.”
Adélia Prado

A visão do amor só provo líquida

Ave escarlate quando pousa
No verso da mensagem
Com relicário no pescoço
De rosários de verbos
Uma conveniência dos milagres
No antebraço que ampara
A perpetuidade de primaveras
Eu resguardo, quem sabe
O ditame que serra
As gengivas amarelas
De leopardos saciados
Nas cordas de aço
O fado profetiza a comunhão
De quem corre ventos e velas
A pele quente, maresia, solidão
A mão escorrendo no peito
Aguarda boa ocasião – nem sempre ao alcance
E nem sempre compreendendo
Vibram, colorem
No crepúsculo de aparências
Os olhos lunares, toca, mulher – de seda
Pela brancura dos ossos esquecidos
A vaidade dos quereres
Na terra é sempre tempo de morrer ou florir
Os espelhos da alma e os caminhos para o céu
Céu da boca é para a língua
E o colo fértil de sereia jura o mínimo
É doce sobre o véu de Maia
Marulhosa a toca de dentro, para quem vaguear intento
Pífanos e guerras – para ninguém – predileções e esquecimentos
Cavalgo por anseios
Estão sempre impenetráveis
Quando costuro salmos na espera
Ostra – mulher, una canción de ninar
Tateando altares
Versando brancas éguas
Que movem–se no espectro
Do teto de gérberas
E bebem águas verdes
Brandas ou violentas
Se encontram no braço do rio
Mas na voz não se entrelaçam as linhas do poema
Silenciosa, uma sacerdote do embrião
Promove um roteiro de aromas
Seu próprio alvo espia o ventre
As tripas e os olhos
Pulsando nas carótidas
Desperta e ferina
Na chave de íris
A visão do amor
Só provo líquida.

***

Vitória Régia
é escritora e autora de Náutico (Editora Patuá)

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Colaboradores LDB

Colaboradores do Blog Leituras da Bel. Grupo formado por professores, escritores, poetas e estudiosos da literatura.

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