Recentemente, o portal Comunique-se, em uma de suas matérias, abordou a possibilidade de que um texto, enviado aos veículos de comunicação como release, poderia ter a proteção de direitos autoriais. [Release, pronuncia-se “relíze”, é um informe ou texto de qualquer espécie enviado por assessorias de imprensa aos veículos de comunicação, esperando que seja publicado ou sirva como pauta.]

Ou seja, outro jornalista não poderia assiná-lo, tendo-se de publicá-lo com a autoria original. O descumprimento desse regra deixaria o infrator sujeito a processo por danos morais. Ressalve-se que nem todo release chega assinado às redações.

A matéria do Comunique-se cita o caso da assessora Claudia Yoscimoto, que trabalhava  para a Prefeitura de de Mogi das Cruzes (SP) – e acompanhou o prefeito a uma viagem ao Japão. Como parte de seu trabalho de assessoria ela produziu um texto sobre o assunto e enviou-o aos veículos de comunicação.

Um site reproduziu o texto na íntegra, retirando a assinatura dela e apondo de outro jornalista. O caso aconteceu em 2007, mas ela somente percebeu este ano, quando organizava um portfólio de suas atividades.

Nas redações

Todo mundo que já trabalhou em uma redação de jornal, rádio ou TV sabe que se dá os mais diferentes destinos para os releases. Alguns são usados como sugestão de pauta [o jornalista se interessa pelo assunto e vai, ele mesmo, levantar as informações]; outros são “refundidos” [reescritos para aparar-se os exageros, acrescentar alguma informação, ouvir o “outro lado”, etc.]; há os usados para pequenas notas e,  também, o que são reproduzidos na íntegra. Sem falar nos que são – a maioria – simplesmente jogados na lata de lixo ou na lixeira virtual.

A mais, eu desconheço caso – pelo menos nos jornais que leio – em que um release tenha sido publicado com a assinatura do assessor de imprensa que o produziu.

Ghost writer

A meu ver o trabalho de assessor de imprensa assemelha-se a de um “ghost writer” [escritor fantasma, em português], um sujeito que é pago para escrever algo que ele sabe que outro vai se apropriar. É o caso, por exemplo, daqueles que escrevem discursos [para políticos, empresários, etc.] ou de alguém que ouve o depoimento de uma pessoa, escreve-lhe uma biografia, que o dono [da vida] assina como se fosse uma autobiografia. [Se alguém quiser ler algo muito interessante sobre os “ghost writer” indico “Budapeste”, de Chico Buarque.]

O que eu quero dizer é o seguinte: o assessor de imprensa não pode se queixar quando seu texto é assinado por outra pessoas. Mas, ressalve-se: o jornalista sério, a não ser que façam um trabalho de apuração – usando do release apenas as informações para complementar seu texto -, recusa-se a assinar releases reproduzidos como matéria. [Ainda mais um trabalho bem particular, como parece ser aquele que a assessora Claudia Yoscimoto produziu.]

Mas, os que assinam um texto de assessoria, depõem contra a sua própria credibilidade e cometem infração ética, mas não um crime.

Assessorias

Está na essência das assessorias de imprensa produzir para que outros [os meios de comunicação] utilizem  o seu trabalho. Romper com essa lógica significa questionar o próprio papel das assessorias.

A recompensa  do assessor de imprensa é ver sua sugestão de pauta aceita ou seu texto publicado. Pois esse é um dos objetivos da sua profissão e o interesse de quem paga o salário do assessor ou contrata uma empresa de assessoria.

Eu imagino que, caso venha a se difundir essa idéia de que um texto de assessoria esteja protegido por direito autoral, as empresas que prestam esse tipo de trabalho terão dificuldade cada vez maiores em ver seu material aproveitado nas redações.

Mesmo os release não-assinados, alguém o escreveu. E, em última análise, seria “propriedade intelectual” da empresa que o produziu.

Exceção

A exceção ao que disse acima são artigos assinados por “mestres”, “doutores”, “economistas”, “especialistas” em qualquer coisa, cujos artigos são enviados pelas assessorias à mancheias. Hoje, o mais modesto professor ou “ista” em alguma coisa tem uma “assessoria” que entope a caixa-postal de qualquer jornalista com artigos  “brilhantes” de seus assessorados, que entendem de penico a bomba atômica. Esses, obviamente, não se vai tirar-lhes a assinatura e apor-se outra, pois não é a assessoria que assina o texto.