Meu artigo semanal, publicado no O POVO na edição desta quinta-feira [29/7/2010], com ilustração de Hélio Rôla, exclusiva para os leitores do blog.
A nova velha polícia
Plínio Bortolotti
Um rapaz de 14 anos é assassinado em ação criminosa da Polícia Militar. O motivo do crime: ele estava na garupa de uma motocicleta carregando uma suspeita caixa de ferramentas. Levou um tiro na cabeça, disparado por um funcionário público, pago para proteger a população. A desculpa: o pai do menino, que pilotava a moto, não teria atendido a ordem de parar da “autoridade”.
A abordagem desastrada não foi da “velha” polícia, mas ação da “polícia comunitária”, a “polícia cidadã”: a Ronda do Quarteirão. O que nasceu para ser o “exemplo” de uma “nova” polícia gangrena-se rapidamente. Não é o “velho” contaminando o “novo”, mas o velho que subsiste no “novo”. Para esse tipo de polícia, todo mundo é culpado até prova em contrário. O civil é visto como um inimigo a ser combatido, principalmente – talvez somente – se for pobre; pior se tiver o azar de ter a cor da maioria do povo brasileiro: pardo ou preto.
(Quando a Ronda foi criada confesso que vi brilhar uma chama do fim do túnel, mas cuidam de apagá-la bem rapidamente.)
No blog de Vasco Furtado, do Conselho de Leitores deste jornal, ele atribui o acontecido ao fato de policiais serem postos nas ruas sem a devida qualificação e afirma, com propriedade, que “polícia despreparada potencializa a violência”. Impossível discordar quanto à falta de treinamento.
Mas, pergunto: quanta “qualificação” seria necessária para se saber dos riscos de atirar em via pública? O que é preferível: deixar um suspeito fugir ou pôr em risco a vida de inocentes? Penso que qualquer pessoa normal sabe a resposta, mesmo sem nenhum tipo de treinamento.
A falta de treinamento é grave. Mas parece que o problema vai para além disso.
A freqüência assustadora com que casos assim – e outros tão graves – se repetem no Ceará e outros lugares, leva à conclusão de que não há “reforma” possível na corporação. É preciso começar tudo de novo. A unificação das polícias seria um bom começo.
O problema, me parece, é que parte da polícia se acha no poder de julgar sobre a vida das pessoas. Efetuar um disparo “para matar” não deve ser regra, mas uma excessão para casos de extrema necessidade, quando a vida do policial ou de outro cidadão está em perigo. Mesmo que aquela vítima fosse um ladrão, não se poderia penalizá-lo com a morte daqquela forma. teria que se esforçar por tentar uma maneira de prendê-lo para que “ele” pagasse na justiça pelos seus atos. Como se viu, não faltou preparo técnico ao policial (a pontaria, infelizmente, neste caso, estava perfeita), faltou preparo em termos de uma formação mais humana. Justamente aquilo que apregoava o Ronda do Quarteirão no princípio.
Caro Plínio.
Já presenciei esse “despreparo” em uma menos desastrada operação do mesmo grupo. Dirigia pela rua paralela à Santos Dumont, atrás do Hospital São Mateus, quando vi um policial correndo em direção contrária a mim, com arma em punho apontada para sujeito que corria também. Para mim foi um susto, pois caso a arma disparasse, poderia eu ter sido a vítima. Por sorte não aconteceu, mas história semelhante foi relatada por amigos, que estavam na Praia do Futuro. O que esperar da polícia quando põe a vida dos cidadãos em risco? Senti reflexo disso tudo hoje à noite, quando avistei, ao voltar para casa, um carro do Ronda com as luzes piscando…tomei um susto e fiquei alarmada, como quando alguém se depara com o perigo. Somente depois racionalizei a situação, pois foi puro instinto.
Cordialmente,
Syomara.
Caro Plínio Bortolotti, acho que você já começou bem, ao intitular a ação policial como ação criminosa e, não, ação desastrada, como a imprensa constuma qaulificar esses assassinatos. Nada justifica o tiro dado pelo policial. Mas o pior é que, de concreto, nada acontecerá a ele. No máximo, será expulso da corporação.
O que não se pode fazer é generalizar. Ter a Polícia Militar como algo que devemos desacreditar ou temer que a qualquer hora seremos uma vitima de seus membros, é simplesmente paranóico. Eu particularmente continuarei acreditando nessa Corporação brilhante, pois se eu desacreditar e criticar maleficamente como muitos, só estarei piorando a situação, visto que a baixa estima tomará conta de todos os profissionais. Temos que lembrar que todos estamos passíveis de errar, mesmo sendo capacitados para o nosso mister. Errar é humano, lembremos disso.
P.S: Não vamos criticar o soldado pois um dia poderemos fazer algo pior. Ninguém sabe o dia de amanhã.