"Filosofia e cultura", de Hélio Rôla (clique para ampliar)

Muitos gramáticos já escreveram que Dilma Roussef (PT), eleita para exercer a Presidência do Brasil, pode ser chamada de “presidente” ou de “presidenta”, dependendo do gosto do falante do vernáculo.

Conforme se pode atestar em qualquer bom dicionário, “presidente” é substantivo de dois gêneros: portanto “o presidente” para homens e “a presidente” para mulheres.

Os mesmos bons dicionários contêm o verbete “presidenta”, cujas acepções são as seguintes: “mulher que se elege para a presidência de um país”, “mulher que exerce o cargo de presidente de uma instituição”, “mulher que preside (algo)” [e até o pouco usado] “esposa do presidente” (do Houaiss eletrônico).

O sempre veemente Alberto Dines (ver texto abaixo) se insurgiu contra o uso de “presidenta” pela própria – e atacou a imprensa “por não querer parecer impertinente logo no primeiro dia de mandato”, isto é, por não ter “corrigido” o suposto uso errado da palavra no tratamento que alguns dão a Dilma Rousseff.

Ao mesmo tempo, Dines louvou o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), pois ele “não piscou” ao empossar Dilma no cargo de  Presidente da República.

Sarney acertou como também acertam aqueles que chamam Dilma de presidenta. O cargo que ela ocupa, por óbvio,  é o de 43º* presidente do Brasil – e não de 43ª presidenta, pois ela é a primeira.

Do mesmo modo, Dilma ao fim de seu mandato – ou antes – , poderá ser considerada o melhor ou pior presidente do país; ou ficar entre os melhores ou os piores presidentes, etc., pois a comparação se dará com todos os presidente e não apenas entre os presidentes mulheres, se houvesse outras.

Em Fortaleza, por exemplo, o prefeito é uma mulher, Luizianne Lins (PT). Então, temos de dizer: “Luizianne está entre os melhores (ou piores) prefeitos que já administraram a cidade”, pois a comparação se dará entre todos os prefeitos – e não apenas entre as mulheres que ocuparam o cargo.

Certamente, o sempre atento Dines, encontrará muitas outras coisas para criticar a imprensa, sem precisar apelar para uma polêmica que, como ele mesmo diz, “pode até ter sido criada para distrair as atenções e fomentar debates irrelevantes” – mas no qual ele tropeçou.

[*Às 19h22min corrigi para “43º presidente”, antes anotara 35º, espero ter feito as contas corretamente agora.]

(Veja o texto de Alberto Dines)

DILMA PRESIDENTE

Incrível. Sarney na oposição

Por Alberto Dines em 3/1/2011

Do Observatório da Imprensa

A questão tem aparência secundária, pode até ter sido criada para distrair as atenções e fomentar debates irrelevantes. Mas não pode ser ignorada.

Ao escolher a denominação presidenta, Dilma Rousseff ignorou o ideário, o receituário e o vocabulário feminista E contrariou frontalmente a norma culta do vernáculo. A primeira presidente da República, não contente com o seu feito histórico, preferiu exibir a sua capacidade de contrariar as elites e adotar uma formulação gramatical simplória. Com nítido viés populista.

Não foi opção apressada. Ao contrário, foi discutida e maturada, atravessou diversas esferas e escalões. A designação presidenta apareceu nos convites para as diferentes cerimônias no dia da posse, está na placa de bronze do Rolls-Royce presidencial e foi mencionada pela própria algumas vezes no seu discurso de posse perante o Congresso Nacional.

A contestação foi imediata, na bucha, proferida pelo chefe do Poder Legislativo, o senador José Sarney (PMDB-AP), cuja performance política e pessoal pode ser controversa, mas na condição de escritor e imortal tem atributos que não deveriam ser desprezados, levando-se em conta o apreço que gozou e goza no governo anterior e no atual.

Segunda vez

Sarney empossou Dilma Rousseff no cargo de presidente da República, assim designado na Carta Magna. O cargo de presidenta, não foi previsto pelos constituintes de 1988. Não existe. Como não existem os postos de generala, coronela, majora, tenenta, sargenta. É o artigo que define o gênero. O eleitor votou em Dilma para presidente do Brasil e não para presidenta.

Quando o PT defendia a descriminalização do aborto e era o queridinho das feministas, as poetisas foram aposentadas e automaticamente transformadas em poetas. Agora, esquecidas as lutas das sufragistas e feministas, finalmente alcançada a igualdade dos gêneros, a presidenta da República deixa de ter um sucessor – Michel Temer jamais poderá ser designado como vice-presidenta.

O mais surpreendente é que esta questão foi rigorosamente ignorada nos telejornais da noite de sábado (1/1). Só foi aparecer nos jornalões de domingo, en passant, quando a Folha de S.Paulo decretou que seguirá designando Dilma Rousseff como presidente do Brasil. O Globo, Estado de S.Paulo e Valor têm adotado o mesmo critério.

Compreensível – a grande mídia não queria parecer impertinente logo no primeiro dia do mandato. Mas o velho udenista José Sarney não piscou: pela segunda vez na vida foi oposição.