Minha coluna “Menu Político” para o caderno “People” do O POVO (9/2/2014)

Foto: Drawlio Joca

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O que é bom para o “mercado” é bom para você?
Plínio Bortolotti

Juro para vocês, ao ouvir “analistas” e jornalistas “econômicos” afirmando que o “Mercado” está “nervoso”, “volátil” ou que “não aceita” tal ou qual medida do governo, visualizo esses senhores como aqueles pastores que, brandindo a Bíblia, arvoram-se em intérpretes da palavra de Deus. Como o Mercado não é seletivo, quando se trata de alcançar seus objetivos, ele também se traveste de “guia”, utilizando “cavalos” para transmitir suas mensagens, como aqueles caras que perambulam por programas de TV, com o auxílio luxuoso de alguns apresentadores “de grife”.

Mas, caro leitor, você já parou para pensar o que é o Mercado?

Uma explicação que poderia estar em qualquer dicionário de Economia: “Mercado é a teia de relações formada por compradores e vendedores de mercadorias, serviços, elementos básicos de produção (terra, capital e força de trabalho), moeda, títulos, ações”. Ou seja, em sua versão, digamos, inocente, “mercado” – que é anterior ao capitalismo – é o que fazemos todo dia, quando compramos um produto ou quando fazemos uma operação bancária – e as relações necessárias chegar até a esse ponto.

Ocorre que esse produto imaterial, porém de suma importância no capitalismo, o dinheiro, foi expandido-se de tal modo, que acabou por ganhar vida própria, passando a autorreproduzir-se. Assim, na fase do capitalismo financeiro, o dinheiro passou a gerar dinheiro. Criou-se um imenso capital fictício, sem correspondência com a economia real.

O mundo está, portanto, sentado em cima de uma montanha de papel (moedas, títulos, ações) e qualquer abalo em um nó desse intrincado sistema pode produzir consequências avassaladoras, como foi o caso da “bolha imobiliária” nos Estados Unidos, que abalou a economia de muitos países. (E deu razão ao ditado: “O melhor negócio do mundo é um banco bem administrado; e o segundo melhor negócio é um banco mal administrado. Ou seria o inverso?)

O Mercado, da forma como os opinionistas de TV o invocam, é formado por uma pequena quantidade de empresas, sobretudo bancos, com enorme poder sobre a economia mundial. Representa, portanto, o interesse de meia dúzia de rentistas que lucram bilhões sem produzir um mísero alfinete.
Mas, da forma como a economia é estruturada, os governos podem simplesmente dar uma banana para o Mercado? Não. Mas o Estado tem o dever de, no mínimo, estabelecer balizas e regular o negócio – especialmente o financeiro – para conter a sua selvageria irracional do Mercado em busca do lucro a qualquer preço.

A partir de agora, quando ouvir “mercado”, lembre que não é uma entidade com poderes sobrenaturais e sem interesses mundanos. Ele tem nome, sobrenome e endereço: no Brasil, na avenida Paulista; nos Estados Unidos, em Wall Street.

Agora, deixo por sua conta – que depende de seu trabalho para viver – a resposta do título: os seus interesses são os mesmos do Mercado?

NOTAS

Delfim
Antes que alguém me xingue de “comunista” chamo em meu socorro alguns economistas acima de qualquer suspeita, começando por Antônio Delfim Neto: “A história mostra que um Estado constitucionalmente controlado, suficientemente forte para impor regulação aos mercados (particularmente ao financeiro), parece ser uma combinação razoável (…)” (Valor Econômico, 31/7/2012)

Greenspan
De Alan Greenspan, o lendário presidente do Federal Reserve, o banco central americano (1987/2006): “Acredito que em certas áreas precisamos de mais, não de menos intervenção oficial, como no caso da punição de fraudes (…) não necessitamos de novos regulamentos, mas, sim, de maior rigor na fiscalização e na aplicação das leis vigentes. (No seu livro “A era da turbulência”)

Ferreira
Para finalizar, o economista Cláudio Ferreira Lima, articulista deste jornal: “O embate é, de um lado, o governo, que luta para baixar os juros, a fim de reduzir o serviço da dívida (…) e, do outro, o rentista, que prefere viver de juros a ter de suar no lado real da economia. Em março último, o estoque de aplicações financeiras, concentradas em poucas e poderosas mãos, era, segundo o Banco Central, de R$ 3,2 trilhões, 73% do PIB brasileiro de 2012, calculado pelo IBGE! Está aí um dos grandes obstáculos ao desenvolvimento do país.”(O POVO, 5/5/2013)

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