Reprodução do artigo publicado na edição de 25/9/2014 do O POVO.

Hélio Rôla

Religião e política
Plínio Bortolotti

O caso mais antigo, pelo menos até aonde vai a minha memória, aconteceu em 1985 d.D. (depois da ditadura). Fernando Henrique Cardoso era candidato a prefeito de São Paulo, enfrentando o histriônico Jânio Quadros. O não menos Boris Casoy, em uma entrevista na TV, pergunta se ele acredita em Deus. FHC (que ainda não era conhecido pelo acrônimo) titubeia, reclama com o jornalista dizendo que a pergunta estava fora do combinado – e dá uma resposta confusa. Jânio se aproveita à náusea da evasiva, acusa Fernando Henrique de ser ateu – e derrota-o nas urnas.

FHC, mais ligeiro do que Pedro, que negou três vezes, aprende de primeira a lição – e passa a crer em Deus, pelo menos para fins eleitorais.

A partir daí, o negócio só tem piorado: agora, todo candidato é obrigado a debulhar o terço, fazer-se beato, pedir a bênção a certos padres e pastores – e fazer-lhes vontades: dizer-se contra a descriminalização do aborto, defender a “família” (isto é, papai-e-mamãe) e pisar em ovos ao comentar os direitos dos homossexuais. O mínimo que os fariseus aceitam é ver o pescador de votos evadir-se do assunto.

Parêntese: sou a favor da atuação livre dos religiosos (dos ateus também) de todos os matizes, que eles “vivam” a sua fé, fazendo o proselitismo que quiserem. Eles têm, também, o direito de saber o que pensam seus representantes, sobre qualquer assunto. O horror é a satanização dos que não rezam pela cartilha cheirando a naftalina, como quem se declarasse ateu (ou homossexual) fosse uma aberração, que o impedisse de ser caridoso ou bom administrador.

Não se trata de ser contra ou a favor de uma coisa ou outra. O que quero dizer é que se elege uma autoridade civil, e não um papa ou bispo. E, para um cidadão adulto, o que deveria definir o voto não é se o político é pio ou ateu; se é homossexual ou heterossexual; homem ou mulher, porém o que ele pode fazer pelo bem da comunidade. Amem?

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