Reprodução do artigo publicado na editoria de Opinião, edição de 8/12/2016 do O POVO.

Quanto tudo é permitido
Plínio Bortolotti

Tardiamente, está se cumprindo o vaticínio contido em uma das frases de efeito que o ex-presidente Fernando Collor legou ao país: “Vou deixar a esquerda perplexa e a direita indignada”, ou vice-versa, quem sabe?

A direita e sua extrema foram às ruas no domingo e pediram cabeça do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), por ele ter alterado as “dez medidas contra a corrupção” dos intocáveis de Curitiba.

Portanto, devem ter-se sentido contemplados pela decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), que afastou Renan da Presidência do Senado. Só que não. Um setor da direita acusou o ministro de favorecer o PT, pois quem assumiria o lugar de Renan seria o senador petista Jorge Viana (AC).

A esquerda, por sua vez, viu no afastamento de Renan uma medida corporativa da Justiça, pelo fato de o senador ter criado uma comissão para pesquisar quantos funcionários públicos recebem salário acima do teto constitucional. Mas quem pediu a dispensa de Renan o STF foi um partido de esquerda, a Rede Sustentabilidade.

O fato é que a situação degringolou a tal ponto que um ministro STF sentiu-se confortável para, em decisão monocrática, afastar o presidente de outro poder; por sua vez, o defenestrado resolveu descumprir a ordem da mais alta Corte do país. Tudo isso em só dia: terça-feira.

O Plenário do STF reuniu-se ontem para borrifar um pouco de água no incêndio. Depois de passar um carão em Renan Calheiros por sua rebeldia, decidiu que ele continuaria como chefe do Senado, porém excluído da linha da sucessão presidencial.

(Agora só falta às suas excelências explicarem porque alguém sem condições morais de assumir a Presidência da República pode continuar presidindo o Senado.)

O caso é que, se uma presidente, eleita democraticamente, pôde ser apeada do cargo, sob a frágil desculpa das “pedaladas”, todo o resto passou a ser permitido, por consequência do pecado original.

Enquanto isso, o cidadão atônito, assiste a tudo sem entender nada.

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