Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno People, edição de 31/12/2017 do O POVO.

Brasil, o país das desigualdades

Sei que tenho insistido no tema “desigualdade” para falar da sociedade brasileira. Esse foi o assunto sobre o qual escrevi mais vezes neste “Menu Político”, devem ter observado meus eventuais leitores. E, para encerrar o ano, volto ao assunto.

Faço isso pois creio que esse é um problema que, por óbvio, atinge principalmente os pobres e desvalidos, as crianças, as mulheres e os mais frágeis, aqueles que não dispõem do mínimo necessário para chamar de digna a sua existência. Mas também põe em risco toda a sociedade, inclusive os super-ricos – e uma certa classe média -, que pensam estar a salvo atrás de cercas elétricas, guardas armados e carros blindados.

A pobreza, por si só, não leva ao crime, me dizem – e é verdade -, mas a desigualdade é um poderoso combustível da violência. Não fosse assim, os crimes de morte estariam distribuídos em todos os bairros de uma cidade, proporcionalmente à sua população. No entanto, os assassinatos concentram-se em alguns bairros, justamente aqueles mais pobres. Alguma razão deverá haver para isso: e os motivos estão expressos nos índices de IDH (qualidade de vida), na diferença de renda, na ausência de serviços básicos do Estado, entre outras discriminações que essas populações sofrem ao longo da vida.

Nos artigos que escrevi sobre o assunto citei estudos de diversas entidades governamentais ou da sociedade civil. Mesmo com abordagens diferentes, os números sempre chegam à mesma conclusão: a desigualdade no Brasil é obscena.

Segundo estudo mais recente da equipe de Thomas Piketty (autor de “O capital no século XXI”), 27% da renda brasileira fica nas mãos do 1% mais rico da população. É a maior diferença de renda do planeta. O Brasil aparece à frente da Rússia (20%), EUA (20%), China (14%) e Índia (21%). Os dados analisados são de 2015. Os super-ricos brasileiros podem, inclusive, fazer inveja aos bilionários do Oriente Médio, que aparecem na lista entesourando 26% da renda da região.

O problema se agrava ao se observar que a tendência à concentração é mundial mundial, apesar de a renda crescer para todos, inclusive para os mais pobres. No entanto, os ricos ficam com a maior fatia dos resultados. Os economistas responsáveis pelo estudo avaliam que a situação tende a se agravar ainda mais até o ano de 2050.

Quando o recorte analisa a concentração da renda entre os 10% mais ricos da população, o Brasil também se destaca no “pódio da desigualdade no mundo”. Na África subsaariana os 10% mais ricos ficam com 54% da renda, logo depois vem o Brasil e Índia (55%) e o Oriente Médio (61%). Segundo o estudo, essas regiões são as “fronteiras da desigualdade”.

Os pesquisadores apontam o continente europeu como exemplo a ser seguido: os 10% mais ricos da região ficam com 37% da renda, sendo essa disparidade a menor desde 1980. A “receita” a ser seguida está a tributação progressiva de impostos e taxas altas sobre herança e controle rigoroso da evasão fiscal, entre outras medidas, que levam à maior equidade.

O fato é que – usando um clichê, porém muito pertinente – estamos todos sentados em cima de um imenso barril de pólvora e ninguém parece se importar com o pavio, que fica cada vez mais curto.

NOTAS

VIDA
Estudo do IBGE divulgado recentemente, com o título “Tipologia Intraurbana – Espaços de diferenciação socioeconômica nas concentrações urbanas do Brasil”, mostra que Fortaleza tem 63,1% de seus habitantes nas piores condições de vida. Em contrapartida, apenas 12,1% dos habitantes estão em condições consideradas boas.

POBREZA
Outro estudo do IBGE revela que 43,5% da população nordestina e 42,1% dos moradores do Norte do país vivem em situação de pobreza, famílias com renda domiciliar inferior a R$ 387/mês por pessoa.

EXTREMA POBREZA
O Nordeste (7,2%) e o Norte (6,9%) também têm os maiores índices de pessoas vivendo em extrema pobreza, domicílios com renda inferior a R$ 85/mês por pessoa.

CRÉDITO
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

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