Existem três maneiras fáceis de ganhar dinheiro no Brasil: abrir um banco, fundar um partido político e criar uma igreja. Reconheço que a primeira alternativa pode ser mais difícil, pois exige capital, porém, depois de fazê-lo é só ficar ouvindo o tilintar das moedas.
Para as outras duas iniciativas basta apenas desfaçatez. No caso do partido, fazendo crer que você é um patriota, pronto para defender os interesses do país e do “povo”. Para fundar uma igreja, é necessário somente fingir-se de pio, informando aos fiéis que Deus o escolheu, diretamente, em conversa privada, para que você espalhasse a sua (Dele) palavra. Nos três casos é necessária de uma boa dose de falta de escrúpulos, pois o sucesso depende de conquistar a boa-fé do público.
Vamos nos concentrar nos bancos. Já anotei por aqui, em textos anteriores, algumas máximas a respeito dessas casas de agiotagem, tipo: “A maneira como os bancos ganham dinheiro é tão simples que é repugnante” (John Kenneth Galbraith, economista americano) ou “O melhor negócio do mundo é um banco bem administrado, o segundo melhor negócio do mundo é um banco mal administrado” (anônimo); e o disparo mais conhecido, de Bertolt Brecht: “O que é o crime de assaltar um banco comparado ao crime de fundar um banco?”
Mas eu sou leigo no assunto, apenas um curioso desconfiado: se a esmola é demais, existe caroço por debaixo do angu.
Então, passo a palavra a um especialista, António Bernardo, presidente da consultoria alemã Roland Berger, um “crítico contumaz” dos bancos, conforme classificação que lhe deu a repórter Alexa Salomão, em entrevista publicada pelo jornal Folha de S. Paulo (22/4/2018).
Primeiro, Bernardo considera “falácia” a lenda da eficiência dos bancos brasileiros, comparando-os com bancos europeus. Depois, desce a ripa nas altas taxas de juros e também no spread (diferença entre as taxas de juros que os pagam e que cobram dos clientes).
Para ele, os bancos não reduzem os juros, mesmo com a queda da taxa básica, por “várias razões”, uma delas é a “grande concentração bancária existente no Brasil”. Para o consultor, isso leva ao que ele chama de “concorrência soft”.
Em linguagem corrente, eu diria que o nome disso é cartel, mas Bernardo prefere eufemismo: “Não estou dizendo que os bancos fazem algo ilegal, que organizam reuniões a portas fechadas para combinar juros. Estou dizendo que a concentração leva à redução na concorrência”.
Isso me fez pensar o seguinte: por que existe indignação contra os postos de combustíveis – que mantém preços parecidos, ouvindo-se gritos de “cartelização”, quando há qualquer reajuste no preço na bomba; e, ao mesmo tempo, há silêncio estrondoso em relação aos bancos, que fazer algo muito parecido, com consequências mais graves?
Mas António Bernardo diz que o Banco Central já está agindo para dar um corretivo nas casas do dinheiro, “ajustando a regulação dos bancos médios e das fintechs [bancos digitais] para elevar a concorrência”. Para ele, essas novas instituições podem fazer diferença. E elogia as cooperativas crédito como bom exemplo: “Têm taxas de juros mais baixas do que as de grandes bancos e estão ampliando o crédito”.
Pois é, parece que no Brasil todo empresário gosta do “liberalismo”, desde que o negócio dele fique preservado da concorrência.
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Entrevista completa: É uma falácia dizer que bancos brasileiros são muito eficientes, diz presidente de consultoria.
Para saber mais: Fintechs, os novos bancos.
Plínio, 99,9999999% da população não protesta por não conseguir alcançar o problema. O preço da gasolina por sua vez é algo palpável, que se sente no bolso diariamente. Lhe pergunto: quanto você paga por mês de taxas bancárias, incluindo fixa e variáveis? Talvez tendo sido bancário (na verdade economiário) você saiba responder. A massa em geral não faz ideia de quanto paga, quanto mais de saber dizer efetivamente quais os juros e spreads aplicados.
Não se trata apenas de taxas. O sujeito, quando vai pedir um empréstimo, não percebe que paga juros de agiota?
E a imprensa tem um papel fundamental nisso. Um exemplo claro é uma reportagem de hoje (23/04/2018) do próprio jornal O Povo que trata do endividamento dos fortalezenses, onde se constata que mais de 70% deles estão endividados e se aponta, através de “especialistas” as mais diversas causas para tal endividamento, desemprego, diminuição de renda, etc, mas não cita que o principal motivo do endividamento cada vez maior dos brasileiros é justamente os juros extorsivos praticados pelas instituições financeira, uma vez que se não fosse isso, uma conta que deixou de ser paga em um mês em virtude de alguma dificuldade financeira poderia facilmente ser paga no mês seguinte com um pouco de organização financeira, mas no sistema atual basta o atraso de qualquer conta, por menor que seja, para sermos sugados pelo buraco negro (quando você entra no raio de atração deles, não consegue sair nunca mais, a não ser através do calote) dos juros que está empobrecendo cada vez mais a população e enriquecendo cada vez mais os agiotas oficiais.
Olá, Pedro, estou tomando a liberdade de enviar esse seu comentário para a ombudsman do jornal, Daniela Nogueira.
E por falar em bancos e agiotagem, essa parceria inseparável, seria importante prezado Plínio, se possível, explorar na sua coluna, sobre os juros pagos da dívida pública!
Juros que consome quase a metade do que tudo o que o país arrecada através dos nossos impostos!
Tema que a imprensa brasileira escrita e falada praticamente não se refere!
Essa informação não é verdadeira Luciano. Trata-se de um factóide, uma fake news.
Esse tema de juros altos muito normalmente é altamente distorcido quando comentado por jornalistas e cidadãos leigos em economia. O texto do Plínio pelo menos foi escrito após uma conversa com um especialista, o que ajuda manter o debate em um bom nível. Não sei bem se pode-se chamar de cartel o que acontece com os bancos, uma vez que, diferentemente dos postos, que são muitos, os bancos são poucos, o que cria um oligopólio – quatro bancos concentram 80% do crédito no país. Esse estímulo às fintechs parece interessante.
Mas o que é contraditório é algumas pessoas serem contra o liberalismo e quererem que o estado regule o máximo possível o setor, dificultando, no entanto, a entrada de novos players. O país também tem instituições bancárias públicas exatamente para pode regular esse mercado – o governo petista utilizou-se desse artifício, que funcionou por um lado, mas gerou inflação por outro.
Juro é o preço do dinheiro, e reage como todo preço: com muita oferta, fica barato; com pouca oferta, fica caro; quando tenta-se controlar ou “congelar”, ele some. Com relação a isso, outro erro que as pessoas que não entendem a economia como um todo comete é não relacionar o gasto público descontrolado do governo com as altas taxas de juros. Quando o governo gasta demais, pega mais dinheiro do mercado, por meio de títulos da dívida pública, investimento de baixo risco para o investidor, e torna assim os recursos escassos.
Enfim, o texto foi interessante, mas existem vários outros motivos para os altos juros no país.
Pergunto. E dos CARTÓRIOS?
Você esqueceu de colocar no artigo os seguimentos da indústria farmacêutica e automotivos. Pesquise os preços destes dois seguimentos e você ficará surpreso. Por que todo e qualquer veículo começa a partir de 30.000,00? Veja a diferença entre os preços de uma grande rede farmacêutica e uma farmácia pequena?
Existe também, o cartel das farmácias, esse na minha opinião o mais grave!
Se o negócio é simples assim, porque as taxas de juros dos bancos públicos não são bem inferiores as dos bancos privados? Porque com essas taxas de juros tão elevadas o governo do PT quase quebrou a CEF e o BB?
João, não sei o que uma coisa tem a ver com outra, a não ser o fato de que alguém tem sempre de meter o PT no meio. Bancos lucraram em todos os governos, inclusive (muito) no período petista.
Plinio, você entendeu o meu comentário?