Por Carlos Mazza

É comum que candidatos a qualquer cargo público evitem – sobretudo em ano de eleição – entrar em polêmicas ou grandes embaraços com a opinião pública. Na estrutura das campanhas, fileiras de assessores e marqueteiros são recrutados com a única missão de preparar o concorrente para evitar controvérsia e criar uma imagem “paz e amor” com o eleitor.

Jair Bolsonaro (PSL), no entanto, segue lógica inversa. Em entrevista ontem ao programa Roda Viva, da TV Cultura, o capitão reformado deixou claro que não só surfa no choque direto com o bom senso, como com certeza precisará disso para se manter relevante na disputa. Na uma hora e meia de entrevista, só uma coisa ficou clara: Bolsonaro precisa da controvérsia.

(Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

Questionado sobre questões polêmicas, Jair Messias culpou africanos pela escravidão, colocou sob suspeitas a – internacionalmente incontroversa – morte sob tortura do jornalista Vladimir Herzog e voltou a atacar miseráveis comunidades quilombolas. Nada disso importa para seus seguidores, que já conhecem de cor as respostas do “mito” sobre essas questões.

Ao contrário dos demais candidatos, é aí que reside a zona de conforto de Bolsonaro. Partindo para o choque, o candidato tem oportunidade para soltar frases de efeito que serão editadas e compartilhadas aos milhões nas redes sociais. O que pouco assusta quem já conhece o perfil do candidato, mas pode ajudar o “recém-liberalizado” a conquistar votos de indecisos.

Outra parte do programa, no entanto, revelou quadro constrangedor. Questionado sobre mortalidade infantil, Bolsonaro falou sobre saúde bucal. Ao ser cobrado sobre o desemprego no campo, o candidato culpou fiscalizações do Ibama pela falta de oportunidades no meio rural. Logo ele, com histórico de polêmicas com o órgão (procure no Google). E por aí vai.

Feitas a qualquer outro candidato, este tipo de pergunta geraria respostas montadas em laboratórios de marketing e que pouco provocariam no espectador além de bocejos e uma ocasional mudança de canais. Feitas a Bolsonaro, no entanto, questões básicas sobre gestão evidenciam um total despreparo e falta de tato mínimo com a coisa pública.

Assim como Donald Trump nos EUA, Bolsonaro certamente já sabe que é no enfoque da polêmica que vive sua real força. Fora disso, ele pouco teria a oferecer. Na ânsia por surfar na polarização do País, adversários do capitão têm centrado esforços em pintar o candidato como racista, homofóbico e defensor de regimes autoritários. Talvez fosse mais eficaz perguntar sobre o preço do feijão.

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Érico Firmo

Colunista de Política e editor do O POVO

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