Sempre na segunda-feira temos procurado tratar neste blog de algumas características e comportamentos que talvez pudéssemos elencar como próprios do povo brasileiro. Há motivos de sobra para nos orgulharmos de ser brasileiros. Mas é preciso, também, lembrar alguns comportamentos que em nada nos enaltecem, muito pelo contrário.

Uma das coisas que mais me deixam indignado é o descaso dos nossos patrícios pelo espaço público. Observando a forma como uma boa parcela da população se comporta em relação a essa questão só pode causar mesmo indignação. Parece-me que as pessoas estabelecem uma delimitação entre o seu espaço particular e o público. O que é identificado como particular deve ser bem cuidado e merecedor de todo desvelo. Quanto àquele que é identificado como público recebe o estatuto do “sem dono”.

O resultado dessa forma de raciocínio é o mais deplorável que se possa imaginar. Observe-se a quantidade de lixo que é jogado na rua. Alguém chupa um picolé e, esteja onde estiver, não sente o menor constrangimento em jogar o papel e o palito fora sem o cuidado de procurar uma lixeira. Pior ainda são aqueles que jogam de janelas de ônibus ou mesmo de veículos particulares latinhas de cerveja ou refrigerante, papel de picolé, de balas etc.

A propósito, observe-se o que acontece nos sinais de trânsito ou nas esquinas das ruas do centro da cidade. Basta parar num sinal ou trafegar pelas ruas do centro para sermos logo assediados por pessoas ávidas por entregarem panfletos oferecendo os mais diversos serviços e produtos. Pois bem. Ocorre que tenho observado que a maioria das pessoas que os recebe, logo a seguir os amassa e joga na rua. E lá vai mais lixo a enfear a já não tão bela Fortaleza.

O problema, parece-me, não pode ser tachado de congênito, embora a prática seja tão generalizada que, não raro, somos tentados a considerá-lo sob essa perspectiva. Quer me parecer, no entanto, que seja mais uma questão de educação. O que falta ao nosso povo, creio, é uma educação que evidencie especificamente a interação que deve haver entre o público e o privado, fazendo ver ao cidadão que o supostamente de ninguém é, na verdade, também seu. A calçada é uma extensão da minha casa, todos assim o consideram. Mas não basta cuidar da calçada. O que vem depois da calçada, embora seja um espaço dividido por todos, é também meu, eu também faço uso dele, e, por isso, merece que eu lhe tribute algum cuidado.

Uma boa parcela da população não hesita em criticar o poder público pelo descaso com a cidade. Está certo, é essa uma das funções dos governantes, e se ela está sendo cumprida a contento, deve ser cobrada. Mas é igualmente dever do cidadão preservar o espaço do qual ele também usufrui. Fala-se muito em cidadania em nossos dias; essa palavra virou moeda corrente. Todos requerem para si o estatuto de cidadãos. Esquecem, no entanto, não poucas vezes, que o exercício da cidadania inclui direitos e deveres. Reclamar os direitos é sempre muito fácil, quanto a dar a contrapartida, essa é outra história. Todos queremos uma Fortaleza bela. Sem escusar de cobrar do poder público o que lhe compete, façamos também a nossa parte. Isso, inclusive, nos conferirá uma autonomia maior para cobrarmos o que nos é devido pelos governantes.

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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