Gal Costa realiza live para celebrar os 75 anos

Falar da importância de Gal Costa para a música – e mais ainda para a cultura – brasileira é como chover no molhado. A baiana construiu uma história mais do que vitoriosa desde que dividiu com Caetano Veloso o disco que apresentou ambos para o mercado da música nacional.

Dessa estreia, em 1967, até os dias atuais, Gal passou por muitas transformações, ritmos, tendências. Mudou o jeito de cantar e se vestir. Foi de João Gilberto a Janis Joplin, sem perder a coerência. Gravou pérolas arrojadas e desafiadoras, bobagens comerciais, e lados Bs sedutores ainda a serem descobertos. Se aventurou, mostrou os seios no palco e não abriu espaço pra muita polêmica.

Neste sábado, 27, a menina nascida em Salvador como Maria da Graça Costa Penna Burgos completou 75 anos e a festa foi com uma live, assim como fez seu amigo e guru Caetano Veloso em 7 de agosto, quando completou 78 anos.

Primeira live que Gal Costa realiza durante o período de quarentena, a apresentação nem de perto teve aquele clima informal que marcou alguns shows virtuais. Pelo contrário, teve ares de superprodução com direito a marcações, projeções e depoimentos de amigos.

A transmissão aconteceu na Casa de Francisca, point paulista reconhecido, entre outras coisas, pela boa música. E o cenário era lindo, meio retrô e bastante elegante. No entanto, o excesso de cuidado pareceu mais aprisionar a atração principal do que deixá-la à vontade para fazer o que sabe de melhor. Pra complicar bem mais, o início do show de cerca de 2 horas foi com muitos problemas técnicos que atrapalharam Gal. Ela perdeu tom, ritmo, afinação, concentração, mas nunca o charme.

Foram muitos pedidos de ajustes até que tudo pareceu entrar nos eixos e a aniversariante pode “dividir o bolo de aniversário” sem mais contratempos. Acompanhada de Pedro Sá (violão e guitarra), Chicão (piano) e Fábio Sá (baixo), Gal Costa seguiu sua apresentação sem muitas surpresas. Ou melhor, a todo momento ela mesma ficava surpresa sem acreditar que aquilo tudo estava sendo filmado e transmitido ao vivo. Ok, era engraçado, mas ela não foi avisada antes de como seria? E precisava mesmo daquele entra e sai de cada espaço da casa? E por que tanta fumaça e tão pouca luz?

Mais econômica na interpretação, no figurino e no gestual, Gal Costa dedicou sua live a enfileirar um muitos – muitos mesmo – sucessos que gravou ao longo de mais de 50 anos de carreira. Teve Força estranha, Luz do sol, Baby, Dom de Iludir e Sua estupidez. Surpresas mesmo foram três: 1. A inclusão de Creio, uma balada de Lulu Santos, lançada em 1987, que ela mesmo disse nunca ter cantado ao vivo; 2. Palavras no corpo, linda canção de Silva e Omar Salomão, a única do repertório mais recente; 3. um depoimento de Maria Bethânia relembrando anos de amizade e o belo dueto que fizeram em Sol Negro, no disco de estreia de Bethânia. Um ponto hilário deste último tópico foi Gal respondendo Bethânia, aparentemente sem perceber que o depoimento era gravado.

No encerramento do show, Gal Costa se despediu, mas a apresentadora avisou que teria espaço pra um bis. Claramente incomodada, Gal disse que não havia ensaiado nada, perguntou se era isso mesmo e ficou um constrangimento ali. Pedro Sá, num papel de maestro, avisou que se não tivesse letra no Teleprompter, não teria música. Gal resolveu com Festa do Interior e ficou bonito, no fim das contas.

Transmitido ao vivo pelo Youtube e pelo canal por assinatura TNT, a live de 75 anos de Gal Costa deixou algumas impressões. Segundo informado na hora, foi a maior audiência em lives nesse período. Se assim o for, Gal superou Caetano, dono do record anterior, o que mostra que há de espaço de sobra para boa música. A live mostrou também que Gal não precisa de tanta produção para seduzir seu público. Bastava o palco, o microfone e os músicos ao redor. O resto ficássemos tranquilos que ela daria conta. Também ficou claro o quanto aquele repertório é valioso e necessário. E ele não seria assim se não fosse a voz que lhe deu vida.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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